A revogação do direito ao aborto nos Estados Unidos já cobra seu preço: a mortalidade infantil disparou em 14 estados que impuseram restrições severas ao procedimento, resultando em 478 mortes adicionais de bebês. Os dados são de um estudo da Escola de Saúde Pública John Hopkins Bloomberg, que concluiu que essas mortes não ocorreriam sem a interferência estatal na decisão das mulheres.
A pesquisa apontou que o aumento das mortes ocorreu principalmente entre bebês com problemas congênitos e em grupos já historicamente mais vulneráveis: negros, filhos de mães solteiras, jovens sem ensino superior e residentes no sul do país. Desde 2022, quando a Suprema Corte dos EUA revogou a decisão Roe vs. Wade e permitiu que os estados decidissem sobre a legalidade do aborto, 17 estados impuseram proibições quase totais, ainda que algumas permitam exceções para estupro, incesto ou risco à vida da mãe.
Entre os estados que adotaram a proibição total estão Alabama, Arkansas, Idaho, Kentucky, Texas e Virgínia Ocidental. Outros, como Flórida, Geórgia, Iowa e Carolina do Sul, restringem o procedimento a partir da sexta semana de gestação, enquanto Nebraska e Carolina do Norte o proíbem após 12 semanas, e Utah, após 18 semanas. Em contrapartida, cerca de 20 estados aprovaram leis que protegem os prestadores de serviço de aborto, inclusive para atender mulheres vindas de estados onde o procedimento é proibido.
O estudo revelou que, nos estados com proibições, a taxa de mortalidade infantil subiu para 6,26 mortes a cada mil nascidos vivos, em comparação com os 5,93 esperados antes das novas restrições — um aumento de 5,6%. Além disso, mortes causadas por anomalias congênitas aumentaram 10,87%, enquanto outros fatores elevaram a mortalidade em 4,23%. O impacto foi ainda maior entre bebês negros não hispânicos, cuja taxa de mortalidade saltou quase 11%, de 10,66 para 11,81 por mil nascidos vivos.
A correlação entre o aumento da mortalidade infantil e as proibições ao aborto reforça o caráter reacionário dessas políticas, que, sob o pretexto de defender a “vida”, na prática, condenam mulheres a gestações de risco e bebês a condições inviáveis. A imposição dessas restrições, longe de qualquer preocupação humanitária, reafirma o projeto de controle sobre os corpos das mulheres e o aprofundamento da desigualdade social nos Estados Unidos.