A 6ª Turma Recursal Cível do Colégio Recursal dos Juizados Especiais de São Paulo negou, por unanimidade, o recurso do ex-soldado israelense André Lajst, que buscava uma indenização por danos morais contra o Partido da Causa Operária (PCO) e dois de seus dirigentes. O acórdão, assinado digitalmente pelo juiz relator Marcio Bonetti em 30 de julho de 2025, manteve a decisão de primeira instância, que já havia julgado improcedente o pedido de Lajst.
O caso girou em torno de um programa veiculado no YouTube em abril de 2022, no qual os apresentadores Uriel Schramm Roitman e Francisco Weiss Muniz, proferiram críticas contundentes aos posicionamentos políticos de André Lajst, chamando-o de “defensor do Estado fascista de Israel” e de “apoiador de massacres contra palestinos e nazistas na Ucrânia”. Lajst, que preside o lobby sionista Stand With Us, alegou que as falas eram caluniosas e difamatórias, pleiteando uma indenização de R$18.000,00 por danos morais. Curiosamente, Roitman e Muniz têm ascendência judaica.
A decisão do tribunal focou em um ponto central: a ponderação entre a liberdade de expressão, um direito fundamental garantido pelo artigo 5º, incisos IV e IX da Constituição Federal, e a chamada “defesa da honra”, pleiteada por Lajst. O relator, Marcio Bonetti, ressaltou em seu voto que “tal garantia fundamental assume especial relevância no contexto do debate político-ideológico, constituindo pilar essencial do regime democrático”. Para o juiz, um regime democrático pressupõe o “livre confronto de ideias, ainda que divergentes ou mesmo antagônicas”.
A Corte considerou que as manifestações se deram em um programa de “cunho político-partidário” e se inseriam no campo da “crítica política e ideológica”. As expressões utilizadas, apesar de “contundentes”, foram entendidas como “juízos de valor sobre as posições políticas adotadas pelo autor, e não afirmações de fato sobre sua pessoa ou conduta privada”. A decisão destacou que “a veemência da crítica política não a transforma automaticamente em ato ilícito”.
Um dos pontos destacados do acórdão foi a condição de figura pública de André Lajst. O tribunal, em sintonia com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), defendeu que pessoas que se expõem voluntariamente no debate público “devem suportar maior grau de crítica, ainda que severa”. O voto do relator citou uma decisão do STF (Rcl 31117 AgR), na qual o Ministro Celso de Mello afirmou que a crítica “se mantém no campo da divergência ideológica sobre questões de interesse público”.
O juiz Marcio Bonetti lembrou que o próprio autor reconheceu sua condição de figura pública em sua petição inicial, afirmando estar “sistematicamente exposto em blogs, noticiários, sempre sendo convidado para entrevistas e palestras”. A decisão aponta que, ao se colocar no debate sobre temas controversos, Lajst se expôs à crítica, que é uma parte inerente desse processo.
A Corte também rejeitou a alegação de dano moral in re ipsa, que significa que o dano é presumido e não precisa ser comprovado. Segundo a tese de julgamento, essa teoria “não se aplica ao contexto de crítica ideológica no exercício da liberdade de expressão em debate público”.
Para o relator, o dano moral exige a “demonstração de efetiva lesão à esfera pessoal da vítima”, o que não foi comprovado no caso. A decisão de primeira instância, que foi mantida, afirmou que Lajst “não comprova que o episódio tenha lhe trazido dor, vexame ou humilhação capaz de ferir direito da personalidade”. Não houve “prova de que sua honra e credibilidade tenham sido abaladas perante terceiros”. A ausência de provas documentais ou orais que atestassem um abalo à imagem ou reputação do autor foi decisiva para o resultado. O acórdão citou o jurista Yussef Said Cahali e o STJ, reforçando que o dano moral não pode ser confundido com “meras contrariedades” ou “desconfortos comuns”.





