Um artigo intitulado É preciso barrar a extrema-direita para a paz e a segurança voltarem ao Brasil, publicado pelo Brasil 247, expressa bem o motivo da crise em que a esquerda brasileira se encontra. Segundo a Professora Francisca, que assina o texto, “acontecimentos desta semana reforçam a urgência de uma ampla unidade dos setores progressistas da sociedade para barrar o desrespeito da extrema-direita à Constituição e aos direitos humanos”.
Muito que bem. Segundo a autora faz parecer, haveria uma ofensiva fascista contra o povo brasileiro. Afinal, os aspectos mais importantes da Constituição Federal são os direitos democráticos e sociais da população — uma ofensiva contra eles resultaria em um retrocesso muito grande. Ao mesmo tempo, quando se fala em direitos humanos, se está protestando contra uma chacina policial praticada contra a população pobre — prática também tipicamente fascista.
Mas a proposta da Professora Francisca nada têm a ver com isso. Ela não protesta contra a chacina nos Complexos da Penha e do Alemão, nem denuncia o cerco à liberdade de expressão, nem lança uma campanha pelo calote da dívida pública. A grande preocupação da autora é com “o desmonte do Projeto de Lei Antifacção enviado ao Congresso pelo presidente Lula para combater com inteligência e unidade nacional o crime organizado”.
A autora propõe, portanto, “uma ampla unidade dos setores progressistas da sociedade” para defender um programa de direita. Um programa, leia-se, que representa os interesses do imperialismo, dos maiores criminosos do planeta, e, ao mesmo tempo, possui elementos abertamente fascistas, de extrema direita.
O PL Antifacção representa tudo aquilo que a autora diz querer combater. Mesmo o projeto original, apresentado pelo governo, atenta contra vários direitos elementares. Entre outras coisas, o projeto propunha a infiltração de agentes policiais em organizações supostamente “criminosas”.
Professora Francisca nem se dá ao trabalho de esconder o conteúdo da unidade que propõe:
“Por isso, precisamos continuar a pressão pelas redes sociais e convocar chamadas para as ruas em defesa da Polícia e da Receita Federal para sufocar financeiramente o crime organizado.”
Trata-se de uma unidade com aqueles que estão do lado oposto dos interesses populares. Uma unidade com espiona e reprime a população. Uma unidade com quem foi determinado para o golpe de 2016 e a prisão de Lula em 2018. Tudo isso em nome de que? Fortalecer ainda mais essa máquina monstruosa, que é infinitamente mais destrutiva que qualquer facção do crime organizado.
Não existe crime organizado sem Estado. O crime se organiza a partir do Estado, que o favorece com a criação de leis absurdas, como a da proibição das drogas, e o fomenta por meio da corrupção inerente do Estado capitalista. Nenhum crime será reduzido pelo fortalecimento da Polícia Federal. Por outro lado, com o fortalecimento da PF, a população ficará ainda mais vulnerável perante o Estado.
A capitulação da esquerda pequeno-burguesa neste caso é tão grande que a autora sequer procura explicar por que a mesma Polícia Federal que prendeu Lula agora é aliada da esquerda. Não se trata nem mesmo de uma aliada tática: para a autora, a defesa da Polícia Federal se tornou princípio da esquerda.
Tanto é assim que Professora Francisca, que tanto alarde faz com o “desmonte” do PL Antifacção, se recusa a denunciar os aspectos mais criminosos introduzidos pela direita no projeto. Sequer denuncia que o projeto será utilizado, por exemplo, para perseguir os que lutam pela terra.
É como se, para a esquerda pequeno-burguesa, seu único programa hoje se tornou defender o Estado e seus instrumentos de repressão.





