O que acontece hoje nos estádios marroquinos, em meio à atual competição esportiva ligada ao contexto da Copa Africana de Nações de 2025, não é uma simples “medida de segurança” nem um fato isolado. Trata-se de mais um capítulo do declínio político pós-normalização. Impedir a entrada de uma kufiya palestina — como relatou um influenciador marroquino, barrado pela polícia na entrada do estádio — não é um detalhe menor, mas sim uma decisão política escancarada, que tem como alvo um símbolo mundial de resistência e dignidade.
Ainda mais grave é que esse episódio vem acompanhado de uma cena chocante: o desaparecimento quase total das bandeiras palestinas e da kufiya nas arquibancadas. Isso não ocorre apenas nos jogos do Marrocos, mas também em partidas das seleções da Argélia, Tunísia e Egito realizadas em solo marroquino. Esse sumiço não pode ser explicado por acaso nem por uma suposta mudança de consciência das torcidas, pois são as mesmas que, durante décadas, lotaram os estádios com as cores da Palestina, expressando de forma clara e corajosa o pulso popular árabe.
O que se vê hoje é uma repressão sistemática à solidariedade popular, uma tentativa vergonhosa de “higienizar” as arquibancadas de qualquer símbolo que incomode Israel ou lembre seus crimes. Desde que o regime marroquino escolheu o caminho da normalização, deixou de se limitar a relações diplomáticas e passou a algo mais grave: atuar, na prática, como guardião de agendas sionistas, impostas pela força e em detrimento da vontade do povo marroquino e de sua memória histórica de apoio à Palestina.
O discurso do “estádio neutro” já não convence ninguém. Essa suposta neutralidade só é aplicada quando o assunto é a Palestina. Quando símbolos e slogans servem à linha oficial do Estado, não há censura, nem apreensão, nem proibição. Isso não é neutralidade — é hipocrisia política e alinhamento descarado, cujo objetivo é silenciar as ruas e transformar as torcidas em figurantes mudos de eventos esportivos esvaziados de alma.
Proibir a kufiya é proibir a identidade, é tentar apagar a Palestina do imaginário coletivo. É uma mensagem repressiva clara: “calem-se, até mesmo nas arquibancadas”. Mas a história mostra que a Palestina não é bloqueada por catracas, não é apagada por ordens policiais, nem eliminada por confisco. A kufiya não é um pedaço de pano — é memória, e memória não se confisca.
O que ocorre hoje nos estádios do Marrocos é uma vergonha política e mais uma prova de que a normalização jamais foi uma escolha popular, mas sim uma decisão de poder, imposta à força, ainda que isso exija sufocar a voz das torcidas e trair a história de um país que um dia fez da Palestina sua causa central.





