Em artigo assinado para a edição do último dia 17 do jornal golpista Folha de S. Paulo, Ana Fontes, membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável da Presidência da República, questiona “em que momento da nossa história combater preconceitos passou a ser secundário?. Intitulado A nova onda de falta de controle nas redes sociais, o artigo de Fontes trata a defesa de um avanço da liberdade de expressão nas plataformas digitais de comunicação um “retrocesso”, além de “perigoso de infinitas formas”. Diz a autora:
“Onde foi que nos perdemos? Quando pautas de direitos humanos se tornaram pautas político-partidárias? Em que momento da nossa história combater preconceitos, defender o clima, promover inclusão e diversidade passaram a ser secundários?
(…)
O criador da Meta declarou que irá seguir os passos de Elon Musk, dono da plataforma X (antigo Twitter), em uma política que privilegia a ‘liberdade de expressão’ —um alinhamento direto com o discurso do governo Trump, que reassume a presidência dos Estados Unidos neste mês. Este movimento que eu defino como meninos mimados liderando o mundo, é perigoso de infinitas formas.”
Em primeiro lugar, “defender o clima, promover inclusão e diversidade” sempre foram e continuam sendo próprias do identitarismo, um movimento ideológico atualmente em franca decadência. A verdadeira novidade, porém, é o uso de reivindicações sem nenhuma importância ou nenhuma relação com a luta dos trabalhadores para justificar a censura, como faz Fontes.
A primeira pergunta, porém, só faz sentido se formulada por um direitista, incluindo aí desde o campo mais tradicional da direita, quanto a extrema direita, ela própria ferozmente opositora da liberdade de expressão, a despeito do uso demagógico que fazem do direito democrático, como evidenciado pela perseguição judicial empreendida pelos bolsonaristas contra diversos apoiadores da Palestina, durante os 15 meses de conflito genocida. A situação enfrentada pela esquerda durante a luta contra os crimes de “Israel”, por sinal, foi a mais eloquente demonstração do a posição de Fontes e dos identitários em geral é reacionária, ardorosos defensores da censura “do bem”.
Sem nenhuma preocupação além das mesquinharias identitárias, porém, Fontes continua:
“Essas questões deveriam ser universais, abraçadas por todos que acreditam em um mundo melhor, onde cada pessoa tem acesso a direitos básicos como água potável, saúde, educação e alimentação. Em suma, o direito a uma vida digna.”
Aqui, a loucura se completa e, novamente, o exemplo da defesa da Palestina, do Hamas, da Jiade Islâmica e de todos os partidos que compõem a Resistência se torna fundamental para desmascarar o argumento farsesco. Finalmente, quem defendeu de maneira consequente “acesso a direitos básicos como água potável, saúde, educação e alimentação” para o povo palestino, sofre nesse momento uma enxurrada de processos e toda sorte de perseguição política, com base nos mesmos critérios defendidos pela identitária.
A denúncia dos crimes cometidos pelo governo tucano do Mato Grosso do Sul contra os índios da região de Dourados, feita por um militante do Partido da Causa Operária (PCO), ocasionou uma condenação da agremiação. O motivo? A denúncia foi considerada um “conteúdo prejudicial” ao secretário denunciado e eis que sob esse pretexto, a “dignidade humana” dos guarani-caiouá e terenas do estado foi atirada na lata do lixo, enquanto a do comandante da máquina de guerra dos latifundiários contra os camponeses do estado foi defendida.
Isso é o que Fontes defende, concretamente.
“O que precisamos é de um esforço coletivo para resistir a esse retrocesso e reafirmar a importância dos direitos básicos e da dignidade humana como pilares fundamentais da sociedade.”
O que a espera autora “esquece” é que, apesar do desprezo que a nutre pelo tema da liberdade de expressão, esse direito democrático não só é consagrado pela Constituição Federal brasileira, que não reconhece nenhuma limitação ao seu exercício além do anonimato, mas também no artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que diz taxativamente:
“Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão.”
Fosse uma defensora consequente do que chama de “direitos humanos”, Fontes defenderia com unhas e dentes o direito de uma pessoa exprimir seu ponto de vista, independentemente de considerações diversas sobre o valor subjetivo das opiniões do sujeito em questão. Ao defender o que todo regime fascista faz e pedir a supressão da liberdade de expressão, o que a autora demonstra que ela própria não dá ao tema um valor maior do que o meramente demagógico, muito parecido com o que faz a extrema direita.