No domingo (30), no ato em homenagem a Natália Pimenta, durante a intervenção de Izadora Dias, coordenadora do Coletivo de Mulheres Rosa Luxemburgo, foi lido o testamento escrito pelo revolucionário russo Leon Trótski alguns meses antes de sua morte. Segundo Izadora, o texto foi escolhido pela Direção do Partido da Causa Operária (PCO) “porque acreditamos que representa muito bem a Natália e, com certeza, se ela tivesse escrito algo nesse sentido, escreveria algo parecido”.
Abaixo, disponibilizamos o texto abaixo como forma de homenagear Natália Pimenta, que faleceu no dia 22 de novembro após lutar bravamente por três anos contra um câncer e, mais recentemente, uma leucemia.
Testamento
Leon Trótski
27 de fevereiro de 1940
Minha pressão sanguínea elevada (e que continua a elevar-se) engana àqueles que me são próximos sobre minhas reais condições físicas. Estou ativo e capaz de trabalhar, mas o fim está evidentemente próximo. Estas linhas serão tornadas públicas após minha morte.
Não preciso mais uma vez refutar aqui a calúnia vil de Stálin e seus agentes: não há uma só mancha sobre minha honra revolucionária. Não entrei, nem direta nem indiretamente, em nenhum acordo, ou mesmo em nenhuma negociação de bastidores, com os inimigos da classe operária. Milhares de adversários de Stálin tombaram, vítimas de falsas acusações. As novas gerações revolucionárias reabilitarão sua honra política e tratarão seus carrascos do Kremlin como eles merecem.
Agradeço ardentemente aos amigos que se mantiveram leais através das horas mais difíceis de minha vida. Não cito nenhum em particular, porque não os posso citar todos.
Apesar disso, considero-me no direito de fazer exceção para o caso de minha companheira, Natália Ivanovna Sedova. Além da felicidade de ser um combatente da causa do socialismo, quis a sorte me reservar a felicidade de ser seu esposo. Durante quarenta anos de vida comum, ela permaneceu uma fonte inesgotável de amor, magnanimidade e ternura. Sofreu grandes dores, principalmente no último período de nossas vidas. Encontro algum conforto no fato de que ela conheceu também dias de felicidade.
Nos quarenta e três anos de minha vida consciente, permaneci um revolucionário; durante quarenta e dois destes, combati sob a bandeira do marxismo. Se tivesse que recomeçar, procuraria evidentemente evitar este ou aquele erro, mas o curso principal de minha vida permaneceria imutável. Morro revolucionário proletário, marxista, partidário do materialismo dialético e, por consequência, ateu irredutível. Minha fé no futuro comunista da humanidade não é menos ardente; em verdade, ela é hoje mais firme do que o foi nos dias de minha juventude.
Natascha acabou de chegar pelo pátio até a janela e abriu-a completamente para que o ar possa entrar mais livremente em meu quarto. Posso ver a larga faixa de verde sob o muro, sobre ele o claro céu azul, e por todos os lados, a luz solar. A vida é bela, que as gerações futuras a limpem de todo o mal, de toda opressão, de toda violência e possam gozá-la plenamente.
Leon Trótski
Coyoacán, 27 de fevereiro de 1940.




