Julgamento de Bolsonaro

O que a esquerda ganha atropelando direitos de Augusto Heleno?

Articulista defende que general seja alvo de perseguição judicial

Em artigo publicado pelo jornal O Globo, Bernardo Mello Franco critica a Defesa do general Augusto Heleno, representado pelo advogado Matheus Milanez, no julgamento da denúncia feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR) ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e sete de seus aliados.

O articulista inicia o seu texto dizendo o seguinte:

“No julgamento desta terça, o advogado Matheus Milanez chamou de ‘terraplanismo argumentativo’ a acusação de que Augusto Heleno participou da trama golpista. Faltou afinar a defesa com a retórica negacionista do general.”

Antes de analisar o que Franco chama de “retórica negacionista”, chamamos a atenção para a lógica expressa pelo articulista. Se – segundo ele – Augusto Heleno, em algum momento, já expressou uma opinião “negacionista”, isso o impediria de criticar quando seus adversários fizerem uso de uma tática semelhante.

É ridículo. É, acima de tudo, uma tentativa de cercear os direitos democráticos de Augusto Heleno. Uma tentativa de dizer: se você for vítima de uma arbitrariedade, você não tem o direito de reclamar.

Essa é, afinal, a política levada adiante pela imprensa burguesa, levando a esquerda pequeno-burguesa a reboque. Dizem: Jair Bolsonaro admira os torturadores da ditadura militar, portanto, não deve ter direito à liberdade de expressão; Léo Lins fez piada sobre negros e deficientes, portanto, não deve ter direito a fazer humor. Franco pode não se dar conta, mas ele comunga de uma política bárbara, que, no final das contas, implica na inexistência de qualquer direito.

Façamos agora, no entanto, aquilo que o articulista, maliciosamente, se recusa a fazer: discutir o que seria o “terraplanismo argumentativo”. Diz Franco:

“A defesa de Heleno no STF seguiu uma tática curiosa: em vez de negar a tentativa de golpe, negou a existência de provas de envolvimento do general. O problema é que a denúncia cita sua fala incendiária na reunião ministerial de julho de 2022 como uma das principais evidências de qual Bolsonaro e aliados discutiram medidas de exceção.”

É um argumento canalha. O papel de qualquer Defesa, Franco sabe muito bem, não é provar a inocência do réu, mas desqualificar a Acusação. Se alguém for acusado de ter cometido um homicídio, não adianta falar: “não fui eu, pois sou uma pessoa de bem”. O papel da Defesa seria dizer: “meu cliente não matou ninguém e a acusação contra ele não se sustenta porque ele estava em outro lugar na hora do crime, a perícia demonstrou que a bala foi disparada por uma pessoa de maior porte, etc.”

É nesse sentido que entra a fala da Defesa de Augusto Heleno. Vejamos o que ele disse:

“Aqui, eu me recordo muito, senhoras e senhores, de uma série que está passando em um grande streaming em que cientistas querem chegar a uma conclusão e eles vão construindo provas para se chegar a essa conclusão. Então, o objetivo é: provar que a Terra é plana. Se faz inúmeros experimentos, inúmeros estudos para se provar que a Terra é plana, o que está acontecendo no presente caso. Por isso que falamos em ‘terraplanismo argumentativo’. Se está querendo colocar Augusto Heleno na organização criminosa. O que precisamos produzir de prova? O que nós temos que é possível enquadrar Augusto Heleno aqui?”

O que a Defesa disse nada tem de extravagante: ele está denunciando um típico processo de perseguição política. Ou seja, está alegando que o Estado, determinado em incriminar Augusto Heleno, procurou reunir fragmentos de informação para construir uma peça de ficção que seja utilizada de pretexto para condenar o réu.

Milanez não fica no campo da especulação. Ele apresenta, de forma bastante concreta, um conjunto de ilegalidades cometidas pelo Estado que permitiriam qualquer um acusar um processo de perseguição:

“Vejamos rapidamente pela PET 12.100 que há pelo menos 13 termos de apreensão com inúmeros pen drivers, telefones, documentos, agendas, o que quiserem chamar. Vejamos que, destes documentos, o que nós temos nos autos? O que são trazidos aos autos para apreciação, tanto da ilustre Procuradoria-Geral da República, quanto pelas defesas? Informes de polícia judicial. Com todas as nossas forçosas vênias, mas informes de polícia judiciária são análises subjetivas da autoridade policial sobre a prova. Com as mais formosas vênias, mas a formação do opinio delicti, se baseia na prova. Onde está a prova? Cadê a íntegra da suposta agenda? O que foram colecionadas foram páginas da agenda. Vejamos que elas não estão numeradas. Estão na ordem? Não tenho como dizer.”

A crítica de Franco é, portanto, uma crítica àqueles que procuram contestar a perseguição judicial.

Dito isso, agora vejamos qual é a suposta “retórica negacionista do general”.

“Em 2018, após a eleição de Jair Bolsonaro, Heleno causou espanto ao endossar teorias conspiratórias sobre as mudanças climáticas. ‘É um assunto extremamente polêmico. Há interesses muito grandes por trás dessa história de aquecimento global’, afirmou, em entrevista ao SBT.”

O exemplo fornecido pelo articulista só torna sua argumentação ainda mais reacionária. Ainda que uma posição de “negaciosismo” – isto é, uma confrontação de teses apresentadas como científicas – não justificaria que Augusto Heleno tivesse os seus direitos políticos tratorados, o fato é que sequer é possível acusar o general disso.

Augusto Heleno não criticou uma tese científica – o que teria todo o direito de fazê-lo, repetimos. Ele simplesmente questionou a propaganda pseudocientífica em torno de supostas mudanças climáticas.

Não é à toa que tal artigo venha de um articulista do maior monopólio de imprensa do Brasil. Para a Globo, tudo o que ela fala deve ser considerado como uma verdade infalível e inquestionável. Tudo o que contraria a Globo seria, portanto, “negacionista”.

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