Após o fiasco da política do governo Lula em relação à fiscalização do Pix, no qual o governo precisou recuar e revogar a medida devido à mobilização gerada por um vídeo do deputado Nicolas Ferreira (PL), abriu-se um debate dentro da esquerda sobre a necessidade de o governo melhorar sua comunicação com a população.
Fato é que parte da polêmica em torno da comunicação busca simplesmente ocultar a crescente impopularidade dentro da própria base governista. Alega-se, por exemplo, que as fake news (mentiras) contra o governo seriam as grandes vilãs, sem considerar que o vídeo feito por Nicolas Ferreira não continha qualquer falsificação sobre a fiscalização do Pix.
No entanto, a rapidez com que o vídeo alcançou cerca de 300 milhões de visualizações é preocupante, já que Nicolas não é um político antigo e experiente, mas, sim, uma figura secundária da política brasileira. Mesmo assim, alguém desconhecido do grande público conseguiu produzir um vídeo demolidor contra uma política específica do governo Lula, uma figura de importância histórica para o Brasil há pelo menos quatro décadas.
Portanto, a questão da comunicação do governo é realmente importante, mas o que está fazendo sua impopularidade crescer não são nem os boatos contra Lula, nem a falta de esclarecimento. É a política adotada que precisa ser revista.
A troca do ministro da Secretaria de Comunicação, ocorrida no dia 14 de janeiro, quando Paulo Pimenta deixou o cargo para que Sidônio Palmeira assumisse, está fadada ao fracasso caso não seja acompanhada por uma mudança real na política lulista, com um afastamento do neoliberalismo e uma maior aproximação da vontade popular.
Voltemos ao caso Pix: está correta a afirmação de que o governo não explicou a medida de fiscalização sobre o Pix? A pergunta pode ser respondida com outra: o que havia para ser explicado?
De fato, inicialmente o governo não taxaria o Pix diretamente, mas fiscalizaria a parcela mais pobre da população, buscando identificar sonegadores de imposto. Ou seja, o cidadão mais pobre, que sonega o imposto de renda para sustentar sua família, seria penalizado pela Receita e obrigado a pagar o imposto. Inclusive, isso é exatamente o que afirma Nicolas Ferreira.
O trabalhador pobre que não paga imposto de renda, portanto, foi transformado em um criminoso, um perigoso sonegador de impostos, enquanto os bancos continuam lucrando com 50% de tudo o que é arrecadado pelo Estado. Não haveria muito a ser explicado nessa situação e, caso o governo tivesse comprado a briga e lutado para manter a medida, a extrema direita, fazendo demagogia com uma população que nunca defendeu de fato, sairia ainda mais vitoriosa.
Mas então, o que o governo poderia fazer de diferente?
Em primeiro lugar, não adianta ter uma ótima equipe de comunicação, com um modelo que conecte o presidente Lula ao trabalhador, se todos os programas transmitirem apenas medidas que agradam à burguesia. É necessário, acima de tudo, se conectar de verdade com o povo.
É preciso que o governo Lula escute suas bases, consiga ouvir o trabalhador mais descontente com a gestão e adote uma política desenvolvimentista, frontalmente oposta ao neoliberalismo, que não aumente ainda mais a pesada carga de tributos e de trabalho sobre os ombros dos trabalhadores, enquanto mantém os salários escassos.
Ainda assim, mesmo com uma mudança de política, uma mudança no estilo de comunicação também seria bem-vinda.
O podcast Conversa com o Presidente, que contava com a participação de Lula e do jornalista Marcos Uchôa e foi apresentado em 2023, apesar de ser uma iniciativa bem intencionada, não atingiu o objetivo esperado e foi descontinuado. Isso ocorreu porque a participação de Lula era muito passiva em relação à direita e o programa não era voltado para os trabalhadores, mas, sim, para a pequena burguesia identitária.
Não havia uma tentativa de educar politicamente o povo; Lula não denunciava a política neoliberal, nem buscava expor os empecilhos impostos pelo imperialismo e pela burguesia brasileira contra qualquer tipo de política nacionalista. Em resumo, tratava-se de um programa chapa-branca.
É preciso ter uma iniciativa agressiva nas redes sociais e nas ruas, que denuncie o programa neoliberal e o bolsonarismo, os acuse de entregar o Brasil e suas riquezas ao imperialismo e, é claro, abandonar a política de apoio ao judiciário e à censura. Também não é possível continuar dependente dos meios de comunicação da burguesia, como a Rede Globo.
Não basta, no entanto, que o governo apenas estabeleça algum tipo de programa pela internet, por melhor que seja. É necessário que Lula leve seus militantes, ativistas e simpatizantes às ruas contra a política da direita, não só em atos públicos, mas também em atividades de panfletagem, colagem de cartazes, etc.
Enquanto esteve no governo, Bolsonaro participava de lives semanais, com um tom muito mais politizado e voltado para sua base. No programa, o ex-presidente denunciava inimigos políticos, entrava em polêmicas e escutava o que seus apoiadores tinham a dizer. Lula poderia adotar algo nesse estilo, claro, com uma política oposta à dos bolsonaristas.
O melhor modelo, no entanto, não se encontra em terras brasileiras. Na Venezuela, o chavismo vem, desde seu primeiro governo, trabalhando para estabelecer uma grande imprensa popular. O canal chavista, inclusive, teve grande importância durante os episódios de golpe de Estado e de revolução na Venezuela, no ano de 2002.
Desde Chávez e continuando com Maduro, os programas de televisão do chavismo são muito populares. Esteticamente, eles se assemelham aos programas de auditório costumeiros no Brasil, em redes como o SBT, com auditórios repletos de apoiadores do chavismo de várias regiões da Venezuela.
Nesses programas, o próprio presidente do país é o apresentador, alternando entre momentos de conversas mais descontraídas, shows de música popular, apresentação de feitos científicos, acadêmicos, produtivos e esportivos venezuelanos e, é claro, muita política. Há também uma ampla participação popular, com a própria população e suas lideranças indo até o palco para expor seus problemas e necessidades.
Em algumas ocasiões, os pedidos feitos pela população são solucionados ali mesmo pelo presidente, que aprova recursos para a construção de obras importantes para a infraestrutura nacional, escolas, hortas comunitárias e outros projetos. O modelo que une a vontade popular a uma estética simples e próxima de toda a população deveria ser seguido pelo governo, pois, após 23 anos da Revolução Bolivariana, é um dos pilares do governo chavista.