O artigo O desvio do poder de legislar para proteger golpistas, de Jorge Folena, publicado nesta terça-feira(12) no Brasil247, é uma verdadeira obra de distorção da realidade. O articulista acusa o Legislativo de desvio para proteger o Supremo Tribunal Federal, justamente a instituição que está desviando de suas funções e tem usurpado funções do Congresso, instaurando no Brasil uma ditadura judiciária.
Folena inicia seu texto citando trecho de Alexis Tocqueville de A democracia na América: “Quando, pois, vejo concedido o direito e a faculdade de tudo fazer a um poder qualquer, seja ele o povo ou o rei, a democracia ou a aristocracia, exercido numa monarquia ou numa república, eu afirmo: está ali o germe da tirania e procuro viver sob outras leis”.
Com a citação, Folena tenta nos convencer que mesmo uma maioria pode ser tirana, não apenas uma minoria. No caso, o Congresso tem muito mais integrantes que o STF. São 513 deputados federais, eleitos com voto popular proporcional, com mandato de quatro anos. Enquanto o Supremo é integrado por 11 ministros votados por ninguém e que têm cargo vitalício, é praticamente um papado.
Em seu segundo parágrafo, Folena escreve que “o que se está intensificando no Brasil, desde o golpe de 2016, que afastou a presidente Dilma Rousseff da chefia do governo, é o desvirtuamento, pela maioria do parlamento, dos objetivos traçados pelos constituintes de 1987/1988. Estamos assistindo à deformação da Constituição promulgada em 05/10/1988, num processo que se iniciou a partir dos governos Itamar Franco e FHC e se ampliou sob os desgovernos de Temer e Bolsonaro”.
O que Folena se esquivou de dizer, é que o Supremo foi peça fundamental no golpe de 2016. Foi o STF que impediu que Lula integrasse o governo. Foi essa corte que, sapateando sobre a Constituição, prendeu o petista e ajudou a eleger Bolsonaro. E, ainda antes, foi protagonista na farsa do Mensalão, que confessadamente prendeu petistas mesmo não havendo provas.
Mais do mesmo
Adiante, Folena escreve que “a atual ‘maioria’ parlamentar, formada pelo ‘centrão’ e a bancada bolsonarista, tem trabalhado diretamente contra os interesses da população, promovendo reformas constitucionais e legislativas que constituem verdadeiros retrocessos: eliminaram direitos sociais e trabalhistas, entregaram o controle das empresas estatais e do Banco Central”.
Não se sabe o porquê de Folena ter escrito maioria entre aspas, pois se trata de um fato, gostemos ou não. Fora isso, o Congresso pouco ou nada trabalhou em favor dos interesses da população. O Supremo também tem “reformado” a Constituição, basta ver o que fazem com o cerceamento à liberdade expressão.
Por obra do Supremo, uma pessoa que tenha sido condenada por um júri popular, pode ser presa, mesmo tendo direito a recursos. Isso é avanço ou retrocesso? Ric Jones, um médico obstetra perseguido pela indústria das cesarianas, está preso devido a essa manobra inconstitucional do STF.
O Marco Civil da Internet, que foi debatido há mais de 10 anos pelo Congresso, “do nada”, teve seu artigo 19 julgado parcialmente inconstitucional pelo STF. Outro retrocesso que claramente tem o dedo do imperialismo.
Quanto à eliminação de direitos trabalhistas, assim como o Congresso, o Supremo tem sido carrasco dos trabalhadores, basta ver o que foi feito com a categoria de enfermagem. Além disso, o STF está para votar a pejotização do trabalho, que poderá ser o maior assalto contra a classe trabalhadora na história do País, pois será como decretar o fim da CLT.
Jorge Folena escreve que “Vive-se uma ‘tirania da maioria’, que detém a capacidade formal para reformar a Constituição e até limitar os poderes do Executivo e do Judiciário. Porém, essa ‘maioria’ é falsa e sem legitimidade efetiva, pois as decisões acima mencionadas e tomadas no parlamento, pela sua importância e desconfiguração do pacto político firmado em 1988, deveriam ser respaldadas por plebiscitos ou referendos”. Por que seria falsa a maioria, uma vez que os deputados foram eleitos? E quais plebiscitos ou referendos o STF tem realizado? Para piorar, muitas decisões do Supremo são tomadas não pela turma, mas monocraticamente. Ou seja, um ministro decide, simples assim. Isso seria mais democrático do que o Congresso?
Como o próprio Folena lembrou, “todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos da Constituição”. Os ministros do STF não foram eleitos pelo povo, portanto nem deveriam ser um Poder. O poder dessa corte é conferido diretamente pela burguesia, ou mesmo pelo imperialismo, de quem a burguesia nacional é sócia menor.
O articulista sustenta “que essa ‘maioria’ parlamentar tem promovido frequentes desvios do poder de legislar, ao elaborar medidas legislativas contrárias ao interesse público, pois seu objetivo deveria ser legislar conforme os interesses dos que os elegeram”. Alguém deveria lembrar Folena que a sociedade está dividida em classes e elas lutam entre si. Diz ainda que o que fazem no Congresso é “usurpar o voto conferido a eles pelos cidadãos brasileiros”. Sim, é verdade, o fazem em favor dos interesses da burguesia. O Supremo, por sua vez, atua usurpando as atribuições dos usurpadores, pois representam interesses ainda mais poderosos da burguesia.
Quais golpistas?
O restante do texto de Jorge Folena é uma tentativa de provar que o Congresso não é legítimo, mas o Supremo, sim. Há um trecho interessante, no entanto, que diz que “é preciso realizar, o mais rápido possível, o julgamento dos réus que tentaram dar um golpe de Estado e abolir o Estado democrático de direito no Brasil, crimes gravíssimos, de acordo com a Constituição de 1988, para reafirmarmos a nossa soberania e a independência do Poder Judiciário”.
De qual golpe Folena está falando, do de 2016, que ele próprio havia citado? Não, pois aí teria que colocar o STF no banco dos réus.
Essa tal “independência do Poder Judiciário” é mito, para não dizer piada de gosto duvidoso. Vimos isso, por exemplo, na prisão de Lula, nas inúmeras viagens de Sérgio Moro aos EUA etc.
Fechando sua peça com chave de ouro, Folena afirma que, neste momento, é importante “a sociedade brasileira se ombrear e se solidarizar com os ministros do STF, que estão sendo atacados pelos bolsonaristas e pelo governo dos Estados Unidos da América do Norte. Porque defender nossas instituições e apoiar o desempenho do presidente Lula é defender os verdadeiros interesses do povo brasileiro”.
O povo, Folena não sabe, é contra o STF, a popularidade dessa corte cai a cada dia. Qualquer trabalhador sabe que o Judiciário é inimigo do povo. Quem vai se solidarizar com um Alexandre de Moraes, que mostrou o dedo do meio para uma torcida de futebol? Esse senhor é visto como um ditador.
Esse tipo de artigo mostra o porquê de muitos trabalhadores terem sido fisgados pelo bolsonarismo, pois testemunham a esquerda militando em favor de seus inimigos de classe; pedindo o apoio a golpistas e instituição das mais reacionárias.





