Um dos maiores erros da esquerda mundial é aderir à política da “democracia vs. fascismo”. Esta coloca Trump como a pior figura política do planeta e o principal bloco do imperialismo, liderado por Biden e Macron, como um possível “aliado democrático”. Ao mesmo tempo, a tese do mundo multipolar também ganha popularidade. Nenhuma das duas está correta, apesar de a primeira ser um suicídio político para a esquerda. Mas é preciso deixar claro que há uma oposição total entre as duas.
O que seria o mundo multipolar? Um mundo em que o imperialismo se enfraquece a tal ponto que deixa de ser uma ditadura mundial, permitindo o surgimento de novas potências. As que mais se destacam hoje são a Rússia e a China, enquanto Brasil e Índia têm grande potencial, assim como países menores que resistem ao imperialismo, como Irã e Venezuela.
O problema dessa política é que ela considera que o imperialismo aceitará ser derrotado sem ser derrubado, algo impossível. O imperialismo, responsável por duas grandes guerras mundiais, genocídios no mundo inteiro, como o da Faixa de Gaza, e milhares de golpes de Estado e guerras, não aceitará esse novo mundo multipolar. Mas há um motivo pelo qual essa tese é tão forte. Para compreendê-lo, é preciso analisar a luta de classes.
O que acontece hoje é que o imperialismo está tão enfraquecido que várias burguesias nacionais são capazes de enfrentar seu poder. Os dois principais exemplos são a China e a Rússia, mas esse é um fenômeno internacional. Na África, os países do Sahel conseguem derrotar os franceses. Na América Latina, Venezuela e Nicarágua enfrentam os EUA. Com esse embate entre as burguesias nacionais, é fácil chegar à conclusão de que um novo mundo está surgindo.
É preciso compreender que essa luta existe dentro dos próprios países imperialistas, e os EUA são o melhor exemplo disso. Nos EUA, a burguesia imperialista é a mais poderosa do mundo. Os maiores bancos, as maiores petroleiras e as maiores indústrias de armamento têm um controle gigantesco sobre o planeta. No entanto, a crise do imperialismo permitiu que um candidato da burguesia interna, ligado a setores como empreiteiras, minas de carvão, indústria interna dos EUA e, agora, com relações com grandes redes sociais como o X e o Meta, conseguisse vencer as eleições.
Ou seja, Trump é um fator de enfraquecimento do imperialismo mundial, pois prioriza que os EUA foquem mais em sua própria economia, em oposição à dominação global. Dessa forma, seu governo tende ao que deveria ser o papel dos EUA na tese do mundo multipolar. Mesmo que isso esteja longe da ideologia de Trump, o que importa é o caráter econômico. Assim, os defensores do mundo multipolar devem compreender que o governo Trump, em comparação a Biden, facilita a ascensão das nações oprimidas e, portanto, se alinha ao chamado multipolarismo.
Mas, assim como a burguesia imperialista está em guerra com Putin, Xi Jinping e Maduro, ela também tende a entrar em guerra com Trump, mesmo que em menor intensidade. Afinal, o que rege o mundo é a luta de classes. Uma classe social domina o mundo: a burguesia imperialista. E apenas outra classe tem o poder de derrotá-la: a classe operária.