O artigo O declínio da hegemonia norte-americana e a ascensão de novos blocos econômicos e tecnológicos, de Emir Sader, publicado nesta quarta-feira (27) no Brasil247, traz em seu texto um erro de avaliação sobre o imperialismo. Isso de “bloco tecnológico”, ou “tecnofeudalismo”, são invenções sem lastro teórico.
As redes sociais, confundidas com empresas de tecnologia, ainda que sejam importantes, não conformam os principais ramos do imperialismo. Estão longe de superar o setor do petróleo, por exemplo. Para se ter uma ideia, o consumo mundial de petróleo/dia é de 104 milhões de barris. Se multiplicarmos essa quantia por um valor médio de US$ 80 por barril, teremos a assombrosa soma de US$ 3 trilhões/ano. A indústria farmacêutica movimenta, US$ 1,7 trilhão. E existem ainda outros setores poderosos.
O setor tecnológico é, por sua vez, muito importante dentro do imperialismo, pois engloba empresas que produzem chips, computadores; controlam a telefonia, tecnologia da informação etc., movimentam mais de US$ 5 trilhões/ano.
Quanto ao conceito de “blocos econômicos” é preciso tomar cuidado, pois se espalhou pela esquerda a falsa ideia de que se está criando um mundo “multipolar”, como se o imperialismo fosse permitir.
Sendo assim, é errado dizer que “quando se deu o fim da URSS, os Estados Unidos tiveram a ilusão de que voltariam à situação da Inglaterra no século XIX, de ser a única superpotência. Mas tiveram que conviver, de novo, com um mundo bipolar, frente ao surgimento dos BRICS”.
Países atrasados, ante o declínio do imperialismo, estão formando grupos de interesse, por exemplo, o BRICS, que é uma medida de proteção econômica contra os avanços e rapinagem do grande capital. Mas não se tem ainda uma força capaz de confrontar o imperialismo. Para se constatar essa verdade, basta ver a ação dos Estados Unidos, que sancionou um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), e pode punir e até levar à falência instituições financeiras que descumprirem essa determinação. Nem China, nem Rússia, membros do BRICS, têm esse poder. Aliás, esses países também sofrem grande número de sanções.
Parasitismo
Emir Sader diz que “uma das características marcantes do século XXI, ao contrário, é o declínio ou a decadência da hegemonia norte-americana no mundo. Da sua economia, que, ainda que siga sendo a maior economia do mundo, não continua a ter a predominância que tinha anteriormente, frente ao crescimento exponencial da economia chinesa. No plano militar, certamente os Estados Unidos mantêm sua predominância no mundo. Já no plano tecnológico, a China assumiu a liderança, superando os Estados Unidos”.
Os Estados Unidos são o principal país imperialista, mas não o imperialismo em si, que conta com a participação do Japão, Alemanha, França e Inglaterra como seus principais membros. E outros menores, como Espanha e Itália.
O problema dos EUA não é apenas o crescimento da China, mas como isso se deu. Pois com a financeirização cada vez maior do capitalismo, os Estados Unidos foram desindustrializados. O neoliberalismo corroeu em benefício próprio a economia americana, que tem atualmente uma dívida soberana de US$ 37 trilhões. E há economistas que sustentam que a cifra é ainda maior, dado que muitas dívidas não estão sendo consideradas.
Segundo Sader, “os Estados Unidos mantêm não apenas sua superioridade no plano militar, como se mantêm como a maior potência imperialista da história da humanidade”. No entanto, isso também está em franco declínio, pois a financeirização elevou os preços à estratosfera, penalizando o contribuinte, mas entregando pouco.
Dito de outra maneira, a indústria bélica americana, que cobra mais de US$ 4 milhões por um único míssil Patriot do contribuinte, torna inviável sua produção em massa e acaba provocando desabastecimento, como se viu na guerra da Ucrânia e também na guerra de 12 dias entre Irã e “Israel”. Os sionistas, apesar de gastos bilionários, ficaram logo com suas defesas antiaéreas próximas do colapso.
Sader acerta ao dizer que “o imperialismo do século XXI segue sendo o imperialismo da exploração e da dominação sobre os outros países. Segue sendo o imperialismo das guerras e das agressões militares. Mas é também o imperialismo da hegemonia do capital especulativo. O imperialismo da decadência da hegemonia norte-americana no mundo”. Mas teria que a causa dessa decadência é um fator do próprio capital.
Essa decadência, no entanto, não será vivida sem que o imperialismo reaja. Dito isso, é um equívoco a afirmação no segundo parágrafo, que sustenta que o acesso à bomba atômica pela Rússia torna inviável a “possibilidade de nova guerra mundial”. A realidade mostra exatamente o oposto. O imperialismo prepara uma nova guerra.
Alguns analistas sustentam que o mundo já se encontra na Terceira Guerra Mundial. Temos o conflito na Ucrânia, no Oriente Médio, na África, na Ásia com tensões regionais e o cerco à China. Tem-se ainda o aumento dos gastos em armas e a censura se espalhando rapidamente pelo globo.
Emir Sader conclui que o “o imperialismo do século XXI já não se apoia na hegemonia norte-americana no mundo”, porém, o que se tem nos EUA é o conflito entre setores do grande capital com o capital financeiro. Embora Trump, que representa o setor prejudicado da burguesia, não dê o apoio que o imperialismo necessita, não significa que o imperialismo tenha desistido de retomar seu controle sobre os EUA. E se pode esperar para o próximo período muita turbulência a despeito da crise terminal do imperialismo.




