Há exatos 46 anos, um dos mais impactantes eventos do último quarto do século XX acontecia: caía a monarquia do xá Mohammad Reza Pahlavi, abrindo toda uma temporada de crise para a ditadura imperialista no Oriente Médio, que jamais se recuperaria. Um dos desdobramentos dessa crise foi que “Israel” perdeu um de seus principais apoiadores na região, que era a ditadura do xá Pahlavi, iniciada após o golpe de Estado de 1953. Em artigo intitulado Analysis: Why are Iranian monarchists backing Israel over its Gaza war? e publicado para a edição de 9 de março de 1979 do sítio catarense Al Jazeera, Sina Toossi do think tank norte-americano Center for International Policy destaca a colaboração de Pahlavi com a ditadura sionista:
“O Xá Mohammad Reza Pahlavi, que governou até 1979, manteve uma relação cordial mas complexa com Israel, tentando equilibrá-la com os laços com o mundo árabe. Cooperou com Israel nos domínios da energia, da segurança e da estabilidade regional, manifestando por vezes o seu apoio à causa palestiniana e aos movimentos islâmicos e não alinhados – embora nunca os tenha abraçado totalmente e tenha estado decisivamente do lado dos EUA na Guerra Fria.”
A colaboração entre a ditadura do xá e a entidade sionista ia muito além das formalidades diplomáticas. “Israel” foi um dos principais fornecedores de armamentos ao regime iraniano, garantindo que o Irã se tornasse uma força militar dedicada aos planos imperialistas de contenção tanto da União Soviética e principalmente das forças nacionalistas no Oriente Médio. A cumplicidade entre as duas ditaduras era tamanha que o próprio MOSSAD, o sinistro serviço secreto sionista, ajudou a criar o temido SAVAK, o serviço secreto do xá, utilizando as mesmas táticas brutais de repressão contra opositores internos e militantes islâmicos.
Além da cooperação militar, o Irã sob o xá desempenhou um papel fundamental no fornecimento de petróleo a “Israel”. A ditadura iraniana garantia o suprimento de energia à entidade sionista, driblando o embargo imposto por países árabes após a guerra de 1973. Essa aliança energética possibilitou a manutenção da economia e da máquina de guerra sionista, assegurando sua sobrevivência mesmo diante do boicote imposto por nações árabes.
Outro episódio que evidencia a proximidade entre o xá e “Israel” foi a operação conjunta na Curdistão iraquiano nos anos 1970. O Irã e “Israel” forneceram apoio aos rebeldes curdos contra o governo de Bagdá, num esforço coordenado para desestabilizar o regime iraquiano, que à época era um dos maiores oponentes de Telavive. A aliança entre os serviços secretos iraniano e israelense foi fundamental para essa operação, revelando a estreita sintonia entre os dois regimes.
No entanto, a Revolução Islâmica de 1979 alterou radicalmente essa conjuntura. A deposição do xá e a ascensão do regime nacionalista, liderado pelo aiatolá Khomeini, transformaram o Irã de maior aliado a maior adversário de “Israel” no Oriente Médio. A ruptura das relações diplomáticas foi imediata, e a embaixada israelense em Teerã foi substituída pela representação oficial da Organização para a Libertação da Palestina (OLP). O novo governo iraniano rompeu os contratos de fornecimento de petróleo e assumiu uma postura ativa no apoio à resistência palestina e libanesa.
A importância do Irã na luta contra “Israel” se consolidou ao longo das décadas seguintes. Desde o começo, a Revolução Islâmica estabeleceu uma política externa baseada no combate ao imperialismo e à opressão dos povos muçulmanos, tornando o Irã o principal inimigo da ditadura dos monopólios na região. Em entrevista ao Diário Causa Operária publicada no dia 23 de abril de 2024, o Xeique Hussein Khaliloo destacou que “depois da revolução [de 1979], o aiatolá Khomeini deixou bem claro que o primeiro assunto do mundo islâmico é a Palestina”. Khaliloo acrescenta ainda: “por isso que o Irã, desde o início, ficou ao lado da Palestina, apoiando de qualquer maneira possível – politicamente, financeiramente, espiritualmente”, conclui.
A República Islâmica passou a fornecer apoio logístico, militar e financeiro a grupos nacionalistas que foram surgindo, conforme a ameaça de “Israel” aos demais países árabes se traduzia na invasão do Líbano, responsável por fazer surgir o partido revolucionário libanês e a maior força militar do Mundo Árabe: o Hesbolá.
Formado por xiitas na luta contra a ocupação israelense no Líbano, o Hesbolá se tornaria a primeira força a impor uma derrota militar à dominação sionista. O auxílio iraniano foi fundamental para que Resistência Libanesa expulsasse as tropas israelenses do sul do país em 2000, marcando uma derrota que só seria superada 25 anos depois, com a expulsão de “Israel” da Faixa de Gaza. Um grande personagem das derrotas sofridas pela ditadura sionista desde então foi o major-general iraniano Qassem Soleimani.
Em 2006, quando “Israel” fazia sua primeira tentativa de invadir o Líbano desde a derrota em 2000, Soleimani se destacou como um dos principais organizadores da campanha vitoriosa do Hesbolá na guerra de guerrilhas contra o sionismo. Em entrevista ao órgão iraniano Tehran Times, concedida em 2023, o general libanês Sayyid Haidar disse, a respeito de Soleimani:
“Durante os primeiros dias da guerra de julho de 2006, o mártir Qassem Soleimani transmitiu uma mensagem verbal urgente do líder supremo da Revolução Islâmica, Sayyad Ali Khamenei, para Sayyed Hassan Nasseralá, declarando: ‘esta guerra será dura, mas confie em Deus, e você deve permanecer firme. Temos plena confiança na vitória da Resistência. Além disso, temos certeza de que essa resistência vencerá e se transformará em uma força regional.’ Hajj Qassem estava presente ‘na linha de frente’, como disse Sayyed Nasseralá, sob o bombardeio de Israel, depois que ele insistiu em estar presente nos subúrbios ao sul de Beirute, apesar das preocupações de Sayyed Nasseralá. No entanto, HajjQassem insistiu em manter-se a par de todos os detalhes relacionados à agressão e garantir todo o apoio necessário à Resistência em vários níveis. A guerra terminou e ele só saiu depois que o cessar-fogo forçado pela Resistência entrou em vigor, para assumir a missão de abrigar os desabrigados e reconstruir suas casas até que se tornassem ‘mais bonitas do que eram’.”
Martirizado em 2020, após um ataque traiçoeiro do imperialismo, Soleimani se tornaria o “mestre dos mártires pró-Resistência”, além de ser reconhecidamente o “arquiteto do Eixo da Resistência”, congregando uma série de organizações revolucionárias em toda a região do Oriente Médio. Com seu trabalho, o Irã amplia sua influência na Palestina, fornecendo todo tipo de suporte aos partidos da Resistência, como o Hamas e a Jiade Islâmica Palestina, aumentando a capacidade de enfrentamento contra a entidade sionista.
Dessa forma, a Revolução Islâmica não apenas eliminou uma monarquia aliada de “Israel” no Oriente Médio, como também transformou o Irã em um dos maiores pilares da resistência na região. Ao contrário da ditadura do xá, que colaborava com o enclave imperialista e reprimia os movimentos islâmicos, o Irã revolucionário assumiu uma postura de enfrentamento direto contra a ocupação sionista, fortalecendo a luta dos povos árabes e muçulmanos contra “Israel” e o imperialismo.