O artigo de Oliveiros Marques, publicado no Brasil247, que celebra o “pleno emprego” no Brasil como resultado de uma política consistente e soberana, demonstra um otimismo desmedido que ignora a complexidade da realidade socioeconômica do país. Embora o texto reconheça a existência de “ataques externos e internos”, ele se baseia em uma leitura superficial e parcial dos dados, falhando em conectar os números apresentados com a verdadeira situação do trabalhador brasileiro.
Marques celebra a criação de 150 mil novas vagas em agosto e mais de 1,5 milhão entre janeiro e julho, afirmando que “os números são animadores” e que “a economia brasileira segue em processo de fortalecimento”. No entanto, uma análise mais profunda revela que o nível de rendimento do trabalhador segue estagnado, sem superar os patamares de anos anteriores. Essa falta de crescimento salarial é a principal razão pela qual os brasileiros estão mais endividados do que nunca.
O aumento do endividamento familiar é um fato alarmante que não pode ser ignorado. Em julho de 2025, os brasileiros comprometiam quase metade de seus rendimentos (48,6%) com o pagamento de dívidas, e o percentual de famílias endividadas atingiu 78,4%. A inadimplência também cresceu, chegando a 30,2% em agosto, o maior índice desde maio do ano passado. Essa situação é particularmente grave para as famílias de baixa renda, com até 3 salários mínimos, onde 81% têm dívidas e 36,9% estão inadimplentes. A razão para essa realidade não é outra senão a combinação de baixos salários e juros exorbitantes, com o Banco Central fixando-os em 15% e os juros do cartão de crédito superando 450% ao ano, enriquecendo os bancos enquanto empobrecem a população.
Marques comemora que “somente entre janeiro e julho, foram gerados mais de 1,5 milhão de novos postos de trabalho” e que “vivemos hoje o cenário de pleno emprego, com taxa de desocupação de apenas 5,6% – o menor índice desde o início da série histórica do IBGE, em 2012”. Contudo, a qualidade desses empregos precisa ser questionada. Muitos deles são vagas temporárias, sem os direitos trabalhistas essenciais, como licença-maternidade, auxílio-alimentação e 13º salário. Um levantamento aponta que metade dos professores nas redes estaduais são temporários, e o número de temporários aumentou 37,7% entre 2014 e 2024, em grande parte pela ausência de direitos que diminui o custo de contratação para o empregador.
Além disso, o alto número de desalentados, pessoas que desistiram de procurar emprego, não pode ser ignorado. No segundo trimestre deste ano, 2,8 milhões de trabalhadores estavam nessa situação. Portanto, a euforia com o “pleno emprego” e a baixa taxa de desocupação se mostra insustentável quando se consideram a precariedade dos novos postos de trabalho e o grande contingente de pessoas que sequer procura mais por uma vaga.
A defesa da soberania brasileira, mencionada por Marques, parece mais uma peça de propaganda do que uma ação efetiva. A atitude do governo brasileiro diante da agressão americana contra a Venezuela, um país vizinho e amazônico, é um exemplo claro da falta de firmeza e de ação efetiva na defesa da soberania. O presidente, em seu discurso na ONU, foi incapaz de denunciar essa agressão, demonstrando uma postura de negociação e subserviência em vez de altivez.
O autor do artigo chega a celebrar que “a palhaçada patrocinada por uns e outros, desde as terras do Pateta, não produziu o efeito desejado de sabotar a economia brasileira”, atacando opositores. No entanto, sua visão se apega a uma narrativa de que “a aliança do atraso contra o Brasil” fracassou, mas ignora as fragilidades internas da nossa economia. A afirmação de que “o crescimento do Brasil é controlado, nunca ultrapassa determinados índices”, e de que ONGs, ministros e órgãos como o IBAMA são controlados do exterior para criar “empecilhos” para o desenvolvimento é uma forma de desviar a atenção dos reais problemas, como a falta de crescimento do rendimento e a precariedade do mercado de trabalho.
A realidade da vida do trabalhador brasileiro não está melhorando, e a celebração de números isolados não resolve os problemas enfrentados diariamente pelas famílias. A política de juros altos, a estagnação dos salários e o aumento da informalidade são obstáculos reais ao desenvolvimento, e a euforia retórica não será suficiente para garantir o apoio popular para uma eventual reeleição. É preciso ir além da propaganda e construir uma base sólida para a economia que realmente beneficie o povo brasileiro.




