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Coluna

O corrupto negócio dos testes psicológicos

Editoras vendem testes psicológicos metodologicamente frágeis como se fossem cientificamente válidos, lucram alto e influenciam até Instruções Normativas da Polícia Federal

Quem já precisou passar por algum “psicotécnico”, acabou tendo contato com os famigerados testes psicológicos. Seja na internet, no consultório ou no RH de uma empresa, sempre aparecem os testes de inteligência, de personalidade e outros tantos. Há muita discussão sobre até que ponto os testes psicológicos realmente avaliam alguma característica psicológica importante, mas esse debate será tratado em outro texto. O aspecto sobre o qual vamos nos ater aqui é que existe uma indústria bilionária, altamente corrupta, que vive de vender esses instrumentos. É uma verdadeira máfia das editoras, que controla o mercado com lobby, dinheiro e influência política. Vejamos como o esquema funciona.

Há diretrizes técnicas sobre como testes psicológicos devem ser feitos. No Brasil, elas são fornecidas pelo Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos (SATEPSI) do Conselho Federal de Psicologia, que estabelece uma longa série de critérios que, supostamente, devem ser satisfeitos para que um teste seja considerado científico e aprovado para uso. Na prática, esse processo é muitas vezes um teatro, pois muitos testes aprovados não passam nem no crivo mais básico da ciência e, ainda assim, são amplamente usados.

Um caso emblemático é o do Teste Palográfico, que quase todo mundo já teve de enfrentar para conseguir a Carteira Nacional de Habilitação (CNH). O procedimento é ridículo: você deve desenhar tracinhos na vertical até que o examinador diga a palavra “sinal”, quando então você deve fazer um traço na horizontal, e seguir fazendo traços na vertical. Pois bem: esse teste está aprovado para uso pelo Conselho Federal de Psicologia, sendo vendido como um “teste de personalidade”. Ou seja, o Conselho Federal de Psicologia chancela oficialmente esse teste como um instrumento “científico” que revelaria algo importante sobre você através de desenhos de tracinhos.

Pensar que algo importante sobre você possa ser revelado através de desenhos de tracinhos não só é muito estranho, como também controverso. De acordo com o autor original do teste, Salvador Escala Milá, se você durante a aplicação desenhar pequenos traços que parecem ganchos, isso pode ser um indicativo de agressividade. Ou, pior ainda, se você fizer poucos traços em determinado tempo, isso indicaria que você trabalha lentamente.

Curiosamente, essas tais associações milagrosas nunca foram provadas empiricamente. Os poucos estudos que se apresentam como “base científica” do teste palográfico no Brasil não encontraram nem sombra de relação entre o rabisco repetitivo e qualquer habilidade que realmente importe para dirigir um carro sem bater, por exemplo. A conclusão, portanto, dispensa suspense: trata-se de um estelionato científico.

Aqui citamos apenas um teste, mas há vários outros por aí em situação similar. Como é possível que algo tão falcatrua seja tão disseminado? A resposta é previsível: a farsa movimenta muito dinheiro.

A indústria dos testes psicológicos é uma obra-prima do capitalismo que beneficia toda uma rede de corporações. Funciona assim: para que um psicólogo possa aplicar oficialmente um teste no DETRAN ou em outros órgãos, ele precisa primeiro pagar por um curso que o torna “oficialmente” apto. E, por uma “coincidência”, os mesmos que vendem os testes frequentemente também vendem os cursos. Negócio redondo. Além de faturar com os cursos, toda avaliação realizada significa mais dinheiro entrando no caixa, pois as editoras também cobram um valor por cada aplicação dos testes vendidos. E, claro, se o candidato for reprovado em algum teste, como no psicotécnico do DETRAN, nada de drama — é só pagar outra taxa e repetir o teste. Para completar a engrenagem, as universidades entram como cúmplices. Elas fazem com que alunos apliquem testes em disciplinas obrigatórias de avaliação psicológica e, adivinhe, precisam comprar os testes e pagar por cada aplicação dentro da própria sala de aula. É um espetáculo de tirar o chapéu.

O poder dessas editoras é tanto que elas conseguem inclusive pressionar diferentes instituições para garantir que muitos testes sem qualquer base científica sejam obrigatórios em diversas situações. É o caso, por exemplo, da avaliação psicológica para manuseio de arma de fogo, em que tanto o Conselho Federal de Psicologia quanto a Polícia Federal obrigam que o candidato realize um “teste expressivo”, como o palográfico, para ser considerado apto para manuseio de arma de fogo. Quer manusear uma arma de fogo? Vai ter que desenhar tracinhos. Quer um emprego? Pode ser eliminado porque seus rabiscos não agradaram. É assim que funciona: inventam exigências absurdas, forçam sua aplicação e lucram com isso.

No fundo, toda essa maquinaria pseudocientífica serve para legitimar a manutenção de uma multidão fora do mercado de trabalho. O glorioso teste palográfico, por exemplo, é frequentemente usado em seleções de emprego, eliminando candidatos com base em nada além de rabiscos sem respaldo científico. A lógica é simples: quem é excluído não é visto como vítima de um processo arbitrário, mas como alguém “não apto”, “sem perfil” ou “inadequado”, termos que soam técnicos, mas escondem o caráter excludente da prática. Assim, a recusa de uma vaga deixa de parecer o resultado inevitável do sistema capitalista, e passa a ser apresentada como uma consequência natural, objetiva e até científica. Em outras palavras, os testes são usados como uma espécie de carimbo oficial que justifica por que uns entram e outros ficam de fora, ainda que a base dessa justificativa não seja nada sólida.

É hora de dizer basta. Precisamos romper com o poder dessas grandes editoras, que tratam a psicologia menos como ciência e mais como plano de negócios. Cada real faturado com esses instrumentos pseudocientíficos é obtido à custa da exclusão social e da humilhação das pessoas. Denunciar esse esquema não é apenas necessário, é um dever político. Se ficarmos calados, seremos cúmplices desse estelionato intelectual travestido de ciência.

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião deste Diário

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