Faixa de Gaza

Netaniahu é genocida sozinho?

Agora, O Globo tenta tirar o corpo fora

No dia 29 de julho, o jornalista Pedro Doria publicou uma coluna no jornal O Globo com o título de “Denunciar Netanyahu é parte da luta contra antissemitismo”. Engana-se, no entanto, quem acreditar que pelo título da matéria, se trata de opinião parecida com a dos judeus que denunciaram o genocídio contra os palestinos desde o começo e que argumentam que a existência de “Israel” é prejudicial para os próprios judeus. Não, a matéria é uma tentativa de colocar a culpa do genocídio somente no governo de Netaniahu para tentar salvar o regime atroz do sionismo.

A matéria começa com o trecho “Quando enfim a guerra terminar, e ela terminará um dia, as fronteiras de Gaza se reabrirão. Uma onda de jornalistas e ativistas entrará na Faixa. No mesmo dia, o número de imagens à nossa disposição será imenso. Que imagens veremos?”.

O início do texto é realmente interessante, pois, qualquer pessoa normal com acesso à internet viu nos últimos dois anos as piores imagens de suas vidas, com bebês sem cabeça, crianças queimadas vivas, soldados israelenses destruindo casas e usando as roupas dos antigos moradores, crianças fuziladas, o bombardeio de cidades inteiras e muitas outras atrocidades que chocaram o planeta.

Porém, Pedro Doria não é uma pessoa qualquer. Trata-se de um jornalista conhecido. Como é possível, então, que um jornalista tão conceituado tenha menos conhecimento do principal conflito no mundo em décadas que a maioria das pessoas que acompanham as notícias pela Internet?

A realidade é que os crimes são de conhecimento dos jornalistas das principais redes de notícias do mundo. Muitos deles, inclusive, como muitos que trabalham na BBC da Inglaterra, acusam as empresas de esconder o genocídio, pois são favoráveis à política de extermínio de “Israel”.

Pedro Doria também ignora que o bloqueio à Gaza não é de hoje. Israel mantém uma política de fome contra os palestinos da região desde pelo menos 2006. Gaza é cercada por grades e suas entradas são completamente vigiadas pelos sionistas, com soldados ou com metralhadoras automáticas que atiram ao perceberem movimentações perto das cercas, sendo a região considerada o maior campo de concentração que já existiu.

Ainda assim, mesmo com a política contínua de apartheid e o extermínio sistemático de palestinos, Pedro Doria afirma o seguinte, após dar uma lista de outras épocas em que um grupo ou um Estado promoveram a fome como arma de guerra:

Uma distinção, porém, não pode ser ignorada. É que Israel é uma democracia. A única outra vez que uma democracia provocou uma fome em grande escala foi em 1943, durante a Segunda Guerra. Os britânicos são responsáveis diretos pela morte de 3 milhões em Bengala, hoje entre Índia e Bangladesh. E, ainda assim, aquilo foi num contexto de incompetência e desatenção perante a guerra.

Se Israel é uma democracia, então a África do Sul do apartheid também era uma democracia, pois, qual a distinção do apartheid israelense para o sul-africano, fora o fato de que os sul-africanos não exterminaram os negros na mesma proporção que os israelenses exterminam os palestinos?

Com esse pensamento, poderemos chegar à conclusão de que o regime nazista na Alemanha, o fascista na Itália e as ditaduras da América Latina todas, sem exceção, foram democracias, pois, o que difere o regime israelense do regime nazista, fora que os nazistas promoviam seus crimes de forma escondida?

Após falar que “Israel” é uma democracia, Pedro ainda trata o genocídio na Índia pelos ingleses como uma casualidade, um erro sem maiores consequências. Isso porque até mesmo as críticas a Netaniahu são transformadas em meros erros de avaliação, como o que acontece no parágrafo a seguir, em que o jornalista tenta mostrar, apesar de dizer não concordar, que haveria uma justificativa para a fome em Gaza:

O governo de Benjamin Netanyahu argumenta que, da maneira como a ONU estava fazendo a entrega de alimentos, boa parte terminava confiscada pelo Hamas. Ia parar no mercado paralelo, usada como instrumento de força política. Talvez. Mas, como diz o jornalista britânico Jonathan Freedland, dane-se. Se a alternativa é a fome de pessoas, não há escolha real. Além do que seria simples resolver o problema. Basta botar dentro de Gaza muito mais comida do que é necessário. Oferta e demanda. Se há oferta demais, não há demanda. Sem demanda, o Hamas não transforma comida em instrumento de poder.

É uma desculpa idiota e que vem sendo dita há dois anos, embora Pedro Doria só expresse seu desagrado agora.

Na sequência, Pedro Doria reproduz o mito de que não havia população na Palestina, se referindo ao lugar como sendo um deserto em que os israelenses teriam construído um país, o que é mentira, pois a região sempre foi populosa e até mesmo alguns israelenses admitem isso:

Tenho em uma de minhas estantes dois bonequinhos, um de David Ben-Gurion e outro de Yitzhak Rabin. No mundo da política, estão entre meus heróis pessoais. Um construiu no deserto um país para um povo oprimido. Outro teve a coragem de negociar uma paz muito difícil. São, ambos, exemplos de dedicação ao bem público e convicções democráticas. Muitos na comunidade judaica na diáspora não têm tido coragem de denunciar o horror causado pelo governo Netanyahu. Há razões, mas Netanyahu cruzou a última linha da ética.

Bem Gurion e Isaque Rabin foram tão genocidas quanto Netaniahu e ter um boneco seu seria o mesmo de ter uma imagem de Hitler no quarto.

Mas é a continuação do texto que denuncia de vez a posição de Pedro Doria:

Há um surto de antissemitismo no Ocidente. Mal passou do pogrom do Hamas, naquele 7 de outubro de 2023, e já havia militantes de esquerda nas ruas pedindo o fim de Israel. À crueldade absurda do Hamas, limitaram-se a virar o rosto para fingir que não viam. Para dizer que era mentira. Na semana passada mesmo, o governo do Brasil deixou oficialmente a Aliança Internacional para a Memória do Holocausto, um gesto incompreensível de tão absurdo. O que lutar contra negacionistas do genocídio nazista tem a ver com Israel? Nada. O Planalto confunde judeus com israelenses e vira as costas para os muitos brasileiros que, sendo judeus, nada têm a ver com as decisões tomadas dentro do Knesset. Esse tipo de comportamento tem nome.

Ou seja, a preocupação de Doria seria com as reações que a população mundial tem ao ver o genocídio na Palestina. Não podemos reclamar do assassinato de mulheres e crianças, da destruição de todas as cidades, do uso de armas de destruição em massa e dos bombardeios que, juntos, ultrapassam o número de toneladas de uma bomba atômica como as que os EUA jogaram no Japão em seis vezes. Reclamar do genocídio é antissemitismo, enquanto ter bonecos dos heróis dos genocidas é uma defesa da democracia.

É pura canalhice. Membros do próprio Estado israelense já admitiram que farsas como a de que o Hamas teria colocado bebês no micro-ondas, ou a de que os militantes palestinos teriam realizado estupros e matado indiscriminadamente são mentiras. Caso fossem verdades, pedimos ao grande jornalista Pedro Doria para que apresente as provas que até “Israel” admite que não existem.

Fora isso, dizer que mal havia passado o 7 de outubro para que militantes da esquerda pedissem o fim de “Israel” é uma calúnia, pois, citando somente o caso do PCO, já pedíamos o fim de “Israel” há muito mais tempo.

Doria ainda reclama que o Brasil saiu da Aliança Internacional para a Memória do Holocausto, organização mantida por “Israel” para sujar a memória dos que morreram nas mãos dos nazistas durante a Segunda Guerra, usando suas mortes como justificação para o genocídio contra os palestinos e os demais povos da região.

Como prova da instrumentalização do Holocausto, o próprio Doria termina o texto tentando provar que nunca houve nenhuma atrocidade parecida, pois é necessário dizer isso para impedir que equiparem o que foi feito por Hitler com o que é feito pelos israelenses desde a criação de “Israel”:

Os nazistas mataram 4 milhões de judeus entre 1942 e 1945. Só entre agosto e outubro de 1942 foram 1,5 milhão. Nada na História contemporânea sequer se aproxima daquilo. Mas, se o IPC estiver correto, quando a imprensa entrar com liberdade em Gaza registrará imagens da tragédia produzida pelo governo Netanyahu que serão associadas ao Holocausto. O terror que o governo Netanyahu está construindo liberará incontáveis antissemitas da vergonha de se mostrarem como são, e as vítimas maiores serão judeus na diáspora. Netanyahu não só foi incapaz de garantir a segurança de judeus no 7 de Outubro, como está conduzindo uma guerra bárbara que o Exército e a sociedade israelense rejeitam.

Em parte, é verdade, os judeus serão responsabilizados pelos crimes do sionismo. Mas, é preciso deixar claro que são crimes do sionismo, não especificamente de Netaniahu e, como diz o rabino Israel Weiss, é preciso acabar com o Estado sionista que coloniza a Palestina, pois ele é o centro do antissemitismo em todo o mundo.

Fora isso, ainda, muitos outros genocídios tiveram números parecidos. Ele mesmo citou os 3 milhões em Bengala, os EUA mataram no Japão quase 1 milhão de pessoas em poucos meses, os nazistas mataram muito mais soviéticos do que judeus. Saindo da Segunda Guerra temos o genocídio em Ruanda que matou mais de um milhão de pessoas em dois meses, os genocídios no Camboja, Vietnã e Laos também têm números altíssimos.

Mas nenhum se assemelha ao caso palestino, já que Gaza tinha cerca de 2 milhões de pessoas e os sionistas mataram oficialmente 60 mil, mas, há indícios de que os números chegam a quase 500 mil pessoas, ou um quarto de toda a população local.

Por fim, fica evidente que o jornalista não se preocupa com a fome dos palestinos, pois, por que é que alguém não se importaria com a morte de crianças pelos bombardeios, mas se importaria com sua morte pela fome? Fora que, como dissemos, a fome é usada como arma de guerra por “Israel” contra Gaza há quase vinte anos.

Pedro Doria só começa a se preocupar agora pois percebe que não há futuro para Netaniahu, mas acredita que ainda seja possível salvar “Israel”, mesmo com a derrota na guerra para os militantes do Hamas.

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