Brasil

Não são os ‘críticos’, mas a frente ampla que sabota o governo

Articulista chama de "bolsonarista" a esquerda que aponta os erros do governo Lula

No artigo Não esqueça a esquerda bolsonarista, publicado no dia 2 de abril pelo Brasil 247, o blogueiro Eduardo Guimarães reproduz uma conduta que, infelizmente, tem se repetido entre setores governistas desde o início do novo mandato do governo Lula: a tentativa de reprimir qualquer crítica à presidência da República.

O texto é uma polêmica com um adversário invisível. Covarde, Guimarães não apresenta com quem de fato está debatendo. No entanto, sua postura é clara: a de procurar apresentar como ilegítima qualquer crítica contra o governo.

“São indistinguíveis dos bolsonaristas quando se referem a Lula ou ao seu entorno. Xingamentos, deboches e até o que chamam de ‘críticas’ têm a mesma virulência. Só se percebe que não são radicais de direita e, sim, de esquerda, quando expõem a natureza de suas críticas.”

Xingamento não é crítica. Mas também não dá para dizer que xingar o governo é o mesmo que se igualar aos bolsonaristas. O trabalhador que vai ao supermercado e se depara com o preço pornográfico do ovo não estaria errado em xingar a mãe do ministro da Fazenda, por exemplo? Quem está de fato errado, o trabalhador que xinga o ministro ou o ministro que taxa tudo o que vê pela frente para aumentar os lucros dos banqueiros?

É preciso também destacar que a covardia de Guimarães sequer permite entender qual é o xingamento. Afinal, muita coisa que é de fato uma crítica política é hoje entendida como xingamento, graças às ações arbitrárias do Supremo Tribunal Federal (STF). Acusar o governo Lula de ser capitulador, por exemplo, é um xingamento?

Quanto ao deboche, não há o que falar. Esperar que um governo que acaba de ser avaliado como negativo por 56% da população não seja alvo de deboche é ridículo. Mais ridículo ainda quando o mesmo governo está maltratando a população enquanto se cala diante do aumento da taxa de juros.

Segue Guimarães:

“Outro dia, assisti entrevista de um deles. É bem celebrado nesse microverso de uma esquerda que tem aversão declarada a qualquer tipo de moderação no debate, pois vê no radicalismo uma qualidade extrínseca, oriunda da mentalidade obrigatória a membros da tribo.”

Novamente, não temos como fazer o debate concreto pois não sabemos que é o entrevistado. Mas a questão é: o que seria ser averso à “moderação no debate”? Será que o que Guimarães chama de “moderação” é, na verdade, a política de adaptação da esquerda ao programa da direita? Seria “moderação” o nome da política criminosa de fazer o povo passar fome em nome dos interesses dos bancos?

O mais grotesco, no entanto, é a tal “qualidade extrínseca”. Segundo Guimarães, portanto, o radicalismo não seria uma qualidade intrínseca da esquerda, mas sim de uma “tribo” (?). O que o blogueiro pretende, na verdade, com esse tipo de comentário, é dissolver o que distingue a direita da esquerda. Ou, melhor dizendo, que só existe a direita. Ser de esquerda seria, para o blogueiro, uma anomalia.

Guimarães estranha, portanto, a própria ideia de programa político. A esquerda é a defesa dos trabalhadores, a defesa dos explorados. E, portanto, é aquele setor “radical”, aquele setor que combate a raiz da exploração. Se não é assim, não é uma esquerda. É um apêndice da direita. É o que prega Guimarães, e sua revolta contra o que chama de “esquerda bolsonarista” não passa de uma defesa de que o governo adote como programa o programa da direita.

Ele segue:

“Comentava a queda na popularidade de Lula e se jactava de ser consequência das críticas da SUA esquerda ao atual governo e a seu titular. Perguntado se não ligava para o fato de que estava ajudando o bolsonarismo, deu de ombros.”

Tendo o entrevistador dado de ombros ou não, a questão é muito simples. Como explicamos, a política atual do governo, de adaptação à direita, é uma política de anulação da esquerda. Trata-se, portanto, de uma política que deixa o caminho livre para que a extrema direita avance. Mais ainda: na medida em que a esquerda apresenta como seu o programa da direita, ela se desmoraliza, jogando água no moinho do bolsonarismo.

É a política do governo que ajuda o bolsonarismo, e não a crítica a ele. Pelo contrário, a crítica ao governo por seus erros o fortalece na medida em que o pressiona para lutar contra a direita.

O blogueiro então acusa os críticos do governo de serem “os responsáveis pela baixa popularidade de Lula”. A hipótese em si é absurda, uma vez que não há nenhum setor da esquerda que tenha uma campanha sistemática cujo objetivo seja o de diminuir a popularidade de Lula. As críticas do Partido da Causa Operária (PCO), por exemplo, que têm um alcance considerável, não têm como objetivo diminuir a popularidade do presidente, mas, acima de tudo mobilizar os trabalhadores contra os seus inimigos, que também são inimigos do governo.

A acusação baixa de Guimarães serve, na verdade, apenas para esconder os erros do governo. É uma forma antidemocrática de tentar impor goela abaixo a política de “frente ampla” do governo. É como se dissesse: se a economia vai mal, o problema não é Fernando Haddad e Simone Tebet, mas os “críticos”. Isso, sim, é um deboche com as reais necessidades do povo.

No final do artigo, o blogueiro consegue ser ainda mais explícito:

“O entrevistado disse que esperava que Lula levasse o governo para a esquerda, após assumir. Ou seja: esperava um estelionato eleitoral nos setores de centro que votaram nele para evitar o mal maior.”

Ou seja, para Guimarães, os 60 milhões de brasileiros votaram em Lula não porque queriam a reversão do golpe de 2016, não porque queriam um governo que se contrapusesse aos de Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PL). Os brasileiros queriam um governo que fosse comandado por Simone Tebet! Se assim fosse, então Guimarães teria de admitir que a direita teve 118 milhões de votos em 2022 – os da frente ampla e os de Bolsonaro…

Não é verdade. A direita que se infiltrou na candidatura de Lula – e, posteriormente, em seu governo – não cumpriu nenhum papel positivo. Não trouxe votos para Lula – pelo contrário, fez com que sua candidatura tivesse um caráter mais direitista e, assim, corresse risco de ser derrotada.

A frente ampla é uma frente de sabotagem contra os interesses populares do governo. Defendê-la é defender o fracasso do governo Lula e a continuação dos ataques contra os trabalhadores.

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