Henrique Áreas de Araujo

Militante do PCO, é membro do Comitê Central do partido. É coordenador do GARI (Grupo por Uma Arte Revolucionária e Independente) e vocalista da banda Revolução Permanente. Formado em Política pela Unicamp, participou do movimento estudantil. É trabalhador demitido político dos Correios e foi diretor da Fentect (Federação Nacional dos Trabalhadores dos Correios)

Descobrimento do Brasil

‘Não foi Cabral’: mais avacalhação da história nacional

Colunista tenta explicar que quem chegou no Brasil antes dos portugueses foi um espanhol, só não se sabe direito onde foi

No último dia 30 de abril, Rodrigo Tavares publicou uma coluna da Folha de S. Paulo chamada É hora de reconhecer: Pedro Álvares Cabral não foi o primeiro. A escolha do ângulo no título do artigo, dá o tom: esqueçam tudo o que te ensinaram sobre o Brasil, porque tudo na nossa história, no fundo, foi uma farsa.

O colunista da Folha não fala isso com esses palavras, mas é disso que se trata. A impressão que se quer passar sobre a história do Brasil e sobre o Brasil como nação é essa: uma grande farsa. Obviamente que há um interesse ideológico nisso e esse interesse não é nada bonito. É tal interesse o que explica porque um jornal da grande burguesia, ligado ao imperialismo, como a Folha, dá espaço a “visões críticas” da história do Brasil, como esse. Em resumo, o interesse é desmoralizar o País, porque um país desmoralizado é muito fácil de se dominar. Por isso o imperialismo, que tem a Folha como um dos seus porta-vozes no Brasil, está tão interessado em desmoralizar tudo o que se relaciona ao País.

Bom, mas vejamos o que o colunista fala sobre a primeira pessoa – que não seria Cabral – a chegar no Brasil. O primeiro europeu a chegar aqui teria sido um espanhol Vicente Yáñez Pinzón:

“Pinzón, veterano da frota de Colombo, zarpou daqui em novembro de 1499 com quatro caravelas, numa missão privada de exploração. Uma tempestade o desviou para a costa sul-americana.

“O local exato do desembarque no Brasil, que Pinzón batizou de Cabo de Santa María de la Consolación, é tema de debate: alguns apontam o Cabo de Santo Agostinho (PE); outros sugerem locais no Ceará, como a Ponta Grossa, Ponta de Itapajé ou Ponta de Mucuripe. Em outro ponto do Nordeste, que chamou de ‘rostro hermoso’, fincou uma cruz com o brasão de Castela.

“Ainda assim, a Espanha não reivindicou oficialmente a posse. Pelo Tratado de Tordesilhas (1494), aquele território pertencia a Portugal na divisão do mundo entre as duas coroas ibéricas.

Portanto, o espanhol teria passado por aqui em janeiro de 1500 graças a um desvio ocasionado por uma tempestade. Se passou mesmo, não registrou onde esteve. Pode ter sido onde hoje é Pernambuco, pode ter sido no Ceará, pode ter sido também na Guiana, “a historiografia portuguesa tentou deslocar o desembarque de Pinzón para cabo Orange, próximo à Guiana Francesa, já fora dos limites estabelecidos por Tordesilhas”, como afirma o colunista.

Enfim, se Pinzón chegou no Ceará, em Pernambuco ou na Guiana, difícil de saber exatamente. Mas da história toda narrada pelo colunista, uma coisa é fato: o navegador espanhol não estava nada interessado nas terras que se chamariam Brasil muitos anos depois. Se a ideia é trocar o nome de Pedro Álvares Cabral como descobridor do Brasil pelo de Vicente Yáñez Pinzón pode esquecer, esse último não descobriu nada, nem mesmo sabia onde estava.

Logicamente que não há problemas em se discutir a presença de outros europeus em solo brasileiro antes de Cabral. Os fatos históricos devem ser estudados. O problema aqui é meramente ideológico, ou seja, querem descaracterizar a história e a formação social do Brasil. Foram os portugueses que aqui chegaram e se estabeleceram, formando, mais à frente uma nação que hoje é independente, mas que fala o português e que tem como base de sua cultura a herança da cultura portuguesa, em junção com os negros que aqui chegaram posteriormente e os índios que aqui estavam. Isso é o Brasil.

“A viagem de Pinzón merece, por isso, reconhecimento oficial por parte do Congresso Nacional brasileiro, além de iniciativas educacionais que resgatem o seu papel histórico.”

Interessante a preocupação em fazer o Congresso Nacional dar tanta importância a esse fato menor da nossa história. Como dissemos, não há problema em conhecê-lo e estudá-lo, isso se realmente acreditarmos que foi assim como diz o colunista. Mas qual seria exatamente o motivo para “reconhecer” que não foi Cabral o que primeiro esteve no Brasil, mas um espanhol? “Negá-lo é reafirmar a história como doutrina ou simbologia nacional, e não como campo de investigação crítica”, conclui o colunista. Os historiadores podem investigar o que quiser, o problema são as conclusões que se tiram dos fatos. E aqui, se ele acusa os que sempre disseram que Cabral descobriu o Brasil de serem “doutrinários”, ele deve ter consciência que está propondo a troca de uma doutrina por outra, de um símbolo por outro e deveria, com isso, mostrar as vantagens para tal. A nós, não parece vantagem nenhuma dizer que o Brasil foi descoberto pela Espanha, até porque, quem formou esse país foram os portugueses a partir da chegada de Cabral, ou anos depois desta, para ser mais preciso.

“Reconhecer Pinzón não apaga Cabral, mas desmonta o mito de um início absoluto. A história brasileira não começa com um europeu — português ou espanhol —, pois já havia povos, culturas e vidas plenamente estabelecidas.”

Claro, não há “início absoluto”, mas a historiografia, como método, deve traçar determinados marcos, que servem como ponto de partida. A chegada de Cabral é certamente um importante ponto de partida.

Como dissemos, há um interesse em avacalhar a história nacional como forma de avacalhar o próprio País. Mostrar a história nacional como um amontoado de farsas e incertezas, sob o pretexto demagógico de ser “crítico”, serve a esse propósito. Ler essas coisas na imprensa pró-imperialista, como a Folha, nos dá a nítida impressão que o único país em que a história foi feita de contradições foi o Brasil. O resto do mundo parece perfeito!

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a deste Diário

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