Polêmica

Não adianta criticar a justiça militar e poupar o STF

Jornalita critica justiça militar, aponta seu autoritarismo e caráter golpista. No entanto, olhando de conjunto, o Judiciário brasileiro é golpista, especialmente o STF

STM

No artigo intitulado Tenente-brigadeiro do Tribunal Militar representa pensamento reinante nas Forças Armadas, publicado no Brasil 247 neste 6 de novembro, Jefferson Miola afirma que  “a reação desrespeitosa e agressiva do tenente-brigadeiro Carlos Augusto Amaral Oliveira ao discurso proferido pela presidente do Superior Tribunal Militar [STM] Maria Elisabeth Rocha no ato de rememoração dos 50 anos do assassinato de Vladimir Herzog pela ditadura representa o pensamento autoritário, conspirador e ingerencista reinante nas Forças Armadas”.

Quem é de esquerda deve mesmo criticar o modelo das forças armadas nos moldes brasileiros. Em vez de dar treinamento para toda a população defender o País, existe um contingente especializado, mantido pela burguesia, que está de prontidão para dar um golpe de Estado, ou mesmo servir de suporte para golpes com cara de civis, como o último, que retirou do poder Dilma Rousseff.

Outro ponto questionável é a existência de uma corte suprema para os militares. Na verdade, não deveria existir sequer o STF (Supremo Tribunal Federal), outra peça que a burguesia controla para oprimir a classe trabalhadora.

O STF deveria ser extinto e no seu lugar deveriam ser criadas outras instâncias recursivas. Os juízes deveriam ser eleitos, não indicados e, para piorar, com cargos vitalícios. As cortes supremas têm servido, como se viu na América Latina e no restante do mundo, para dar golpes de Estado e para destituir políticos eleitos.

A culpa é de Bolsonaro?

Segundo Miola, “este oficial da ativa da Força Aérea [FAB], indicado ministro do STM por Bolsonaro em 2020, propugna uma justiça militar justificadora do terror de Estado durante a ditadura e revisionista da verdade histórica daquele período obscuro e sanguinário”, mas isso nunca foi diferente. Antes de Bolsonaro os militares chamavam o golpe de 1964 de “revolução”. A mesma opinião da grande imprensa, que hoje apenas se traveste de democrática.

O texto diz que “O brigadeiro atacou a presidente do STM porque ela pediu ‘perdão à sociedade brasileira e à história do país pelos equívocos judiciários cometidos pela Justiça Militar Federal em detrimento da democracia e favoráveis ao regime autoritário’”. Na verdade, não foram “equívocos”, foram crimes que os militares cometeram contra o povo brasileiro sob ordens do imperialismo.

Torturas, as mortes, os desaparecimentos forçados e o exílio”, isso não pode ser chamado simplesmente de “erros e as omissões judiciais cometidas durante a ditadura”. Dito isto, o jornalista deveria ter criticado Maria Elisabeth Rocha, que se apresenta levemente moderada.

Miola afirma, e é certo, que “está amplamente documentada a atuação vergonhosa da justiça militar na engrenagem do regime de terror implantado em 1964, quando realizava julgamentos farsescos, com provas falsas e forjadas para condenar ilegalmente opositores da ditadura e proteger trogloditas fardados e os cúmplices civis do regime que praticaram atrocidades inomináveis”.

Como o identitarismo, apesar de enfraquecer, ainda atua na esquerda, o articulista aproveitou para dizer que a “agressão desrespeitosa [do brigadeiro] não atinge apenas esta magistrada, [mas] atinge a magistratura feminina como um todo”.

Faltou a Miola dizer que o STF também agiu de maneira a dar um ar de legalidade ao Golpe de 64. O ministro Álvaro Ribeiro da Costa (ou Álvaro Moutinho Ribeiro da Costa), à época presidente do Supremo, deu apoio explícito ao golpe.

Na madrugada de 2 de abril de 1964, com João Goulart ainda no Brasil (portanto a Presidência não estava vaga), Ribeiro da Costa foi ao Congresso Nacional e legitimou a posse de Ranieri Mazzilli como presidente interino, declarando que o ato era “constitucional” e necessário para “restaurar a legalidade”.

Dos 11 ministros da corte, nenhum se manifestou ou se posicionou publicamente contra o golpe.

O Ato Institucional nº 1 (AI-1), editado em 9 de abril de 1964, que cassou mandatos, suspendeu direitos políticos e impediu o controle judicial sobre essas medidas, foi recebido praticamente sem resistência pelo Supremo, que também se absteve de questionar a constitucionalidade do Ato.

Quanto a julgamentos farsescos, o próprio Jair Bolsonaro acaba de ter sido contemplado com um. E ainda podemos mencionar o Mensalão e a Lava-jato. As prisões completamente ilegais de Lula e outros dirigentes do PT. Chegando ao absurdo de Rosa Weber admitir que não tinha provas, mas mesmo assim mandaria José Dirceu para a cadeia.

“Justiça”

Jeferson Miola sustenta, apropriadamente, que “a justiça militar sequer deveria existir, deveria ser extinta. Na maioria dos países não existe justiça militar em tempos de paz. Os crimes cometidos por militares são julgados em tribunais civis da Justiça Comum e as faltas disciplinares por regimentos e estatutos próprios”. E, como foi dito acima, não deveria haver cortes supremas no Brasil.

Mais adiante, o jornalista diz que “no Brasil, essa justiça militar justificadora da barbárie ditatorial se caracteriza, ainda, como uma sinecura, onde ministros recebem salários muito acima do teto constitucional”. Isso acontece em todo o Judiciário. Ganhos acima do teto já foram tema até mesmo da imprensa burguesa.

Não faz muito tempo, a Revista Veja fez uma matéria sobre o relógio de pulso caríssimo de Alexandre de Moraes, que deve estar valendo algo entre R$ 500 mil e R$ 1 milhão. Claro que a revista tratou de minimizar o fato, alegando que quando o glorioso ministro comprou, nem era tão caro, daria para comprar, no máximo, um apartamento com dois quartos na Zona Leste de São Paulo.

Segundo Jeferson Miola, “na sessão do Tribunal de 15 de dezembro de 2022, ao relatar determinado processo, ele aproveitou para atacar a Suprema Corte em termos genuinamente bolsonaristas: ‘o STF está processando meio mundo no país só porque falou mal do STF. É o que está acontecendo no Brasil hoje. As pessoas que falam mal do STF numa conversa de bar ali vão sendo processadas com a Polícia Federal dentro das suas casas aí e sendo presas sem nem saber e seus advogados não têm acesso a absolutamente nada’”.

Não é preciso ser bolsonarista para fazer essa crítica ao STF. A maioria da esquerda se cala diante da realidade porque o governo Lula busca apoio no Supremo.

Dizer que “como relator do caso dos militares que fuzilaram o carro do músico Evaldo Rosa com 62 tiros de fuzil em abril de 2019, o tenente-brigadeiro Carlos Augusto absolveu os colegas de farda de crimes graves, imputando-lhes uma condenação mínima, em regime aberto”, não invalida o que foi dito. Tanto a crítica a Oliveira quanto ao Supremo são pertinentes.

Em seu último parágrafo, Jeferson Miola escreve que é lamentável a omissão do ministro da Defesa Múcio Monteiro a essa realidade”, mas a maioria da esquerda também se omite. Não faz a crítica ao STF. Fala de golpe de 64, mas tivemos o golpe de 2016, com Supremo, com tudo. Os militares estavam lá, dando suporte. Foram eles que exigiram a prisão de Lula, e o Supremo obedeceu.

Que isso sirva de alerta para essa esquerda que acredita que o STF está caçando fascistas. A história, inclusive a recente, desmente isso categoricamente.

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