Brasil

Não, a economia não vai bem

Ex-deputado federal tenta explicar a nova queda de popularidade do governo, mas continua vivendo em um mundo de fantasias

Ex-deputado federal Constituinte pelo estado de Goiás, Aldo Arantes publicou um artigo no portal de esquerda Brasil 247, intitulado Quais as reais causas da queda da aprovação de Lula nas pesquisas?, tratando das notícias mais recentes sobre a nova queda de popularidade do governo, escamoteando os problemas econômicos do País, destacando “a questão mais importante para explicar a queda na aprovação do governo Lula”, em sua avaliação, “a Guerra Cultural”. Diz Arantes:

“Um dado que não pode ser menosprezado é a influência, na pesquisa, da força da ideológica da extrema direita junto a milhões de brasileiros. Tanto assim que, entre os pesquisados, 43% manifestaram a opinião de que o governo Bolsonaro foi melhor do que o governo Lula e 39% acharam que o governo Lula é melhor.”

Ora, fosse verdade o que diz o autor e “a força da ideológica da extrema direita” tivesse um papel determinante, a ponto de ofuscar a razão, Lula sequer teria sido eleito em 2022, ainda mais nas condições em que a vitória se deu, em meio a um golpe de Estado. O que está em questão não é a ideologia, mas a percepção da realidade, que tampouco vem das ideias, mas do que a pessoa vive, algo medido especialmente pelo padrão de vida. Estrategista da vitoriosa campanha presidencial de Bill Clinton à Casa Branca em 1992, James Carville ficaria famoso por colocar isso de maneira mais eloquente: “é a economia, estúpido”.

Repetindo um mantra da direita petista, Arantes diz:

“Se é verdade que tem havido um aumento no custo de vida, é verdade, também, que o PIB cresceu duas vezes mais que a média registrada entre 2019 e 2022, indo para 3,2% em 2023 e 3,4% em 2024.

E em 2024 o Brasil registrou a menor taxa de desemprego nos últimos 12 anos, 6,6%. Desde 2023, mais de 3,2 milhões de empregos formais foram gerados.”

É o famoso “mentir falando verdades”. Em primeiro lugar, dizer que o PIB cresceu mais do que a média do período de 2019 a 2022 é um golpe, uma frase de efeito que esconde a crise econômica ocasionada pela pandemia, a mais severa que a economia mundial já viveu desde o fim da Segunda Grande Guerra.

Qualquer crescimento pífio seria duas vezes mais do que a média de um período de recessão acentuada, com o agravante de que se o PIB brasileiro cresceu duas vezes mais, essa informação precisaria conter um “apenas” para a verdadeira dimensão da nulidade que representa. Outra falácia é a questão do emprego.

Apenas um terço da força de trabalho brasileira está, efetivamente, empregada, em um trabalho produtivo, com direitos trabalhistas e carteira assinada. Os outros dois terços, ou seja, a ampla maioria dos trabalhadores, foi atirada à selva de uma economia em acentuado processo de desindustrialização, lutando para sobreviver sem saber se, ao fim do dia, terá os recursos necessários para poder ter um teto e alimentar sua família.

Ao contrário do que a propaganda direitista tenta defender, esse pessoal não está empregado. O fato de setores do PT insistirem em dizer o contrário, que o País está se aproximando do pleno emprego, quando os trabalhadores constatam que isso não é verdade – por sua experiência e a de seus pares, amigos, familiares, vizinhos, etc. -, a única coisa que esses propagandistas desorientados produzem é uma desmoralização do governo.

É verdade que o PIB cresceu, porém, isso não significou um aumento minimamente impactante da atividade econômica, que continua estagnada. É verdade também que, nas planilhas do IBGE, o desemprego caiu. Isso tudo, no entanto, não muda o fato de a economia nacional estar destruída, tornando os números inúteis para os trabalhadores, que, longe de se darem por satisfeitos com tais índices, sentem-se enganados e demonstram a crescente impaciência com o governo explorada pela direita.

De tudo o que Arantes coloca ao tratar da conjuntura econômica, a única coisa em que acerta, para a desgraça de sua posição geral, é quando trata do “aumento no custo de vida”, que o autor reconhece: “tem havido”. A escalada dos preços é tratada como uma coisa secundária pelo colunista, um problema menor e em vias de ser resolvido, porém, trata-se de uma consideração totalmente fora da realidade.

Enquanto o colunista celebra o crescimento do PIB “indo para 3,2% em 2023 e 3,4% em 2024”, os alimentos sofrem uma alta muito maior, segundo o DIEESE, ultrapassando 6,45% na cidade de São Paulo e batendo nos dois dígitos nas mais importantes capitais nordestinas, sem surpresa, região onde a desaprovação ao governo Lula cresceu de maneira muito acentuada. A carestia, finalmente, é um dos principais fenômenos econômicos desestabilizadores da sociedade, sendo um histórico impulsionador de revoluções.

Isso dito, a combinação da estagnação econômica com escalada descontrolada dos preços já seria, por si só, um motivo muito mais plausível para a desaprovação constante e acentuada enfrentada pelo governo Lula, mas isso ainda não é tudo. Mesmo na questão cultural, a política de frente ampla, unindo a esquerda pequeno-burguesa aos piores inimigos da classe trabalhadora – o imperialismo – leva o governo a defender as extravagâncias identitárias, abrindo um flanco para ataques que os bolsonaristas, claro, não perdoam.

Embora o problema cultural seja secundário, a raiz do fenômeno não é, sendo útil para explicar outra colocação desencontrada, reproduzida no parágrafo abaixo:

“Outra questão importante, que envolve os partidos políticos e os movimentos sociais, é a necessidade da retomada do trabalho de base, nas periferias, nas fábricas e nas escolas. Há uma série de razões que explicam esse distanciamento. Não cabe aqui analisar essas causas, mas constatar o problema e adotar providencias.”

O autor pode desconsiderar, mas aqui também o problema da frente ampla aflora. Finalmente, isso seria um choque frontal à política do imperialismo, que está inserido na frente ampla e não quer agitações do tipo que Arantes está defendendo de maneira abstrata, sem consequência.

Como ir às escolas e fábricas defender “todes”? Ou o plano Haddad? Seria preciso uma guinada à esquerda muito profunda e não é isso o que o ex-deputado está defendendo. Sua posição é de defesa da política direitista implementada pelo governo e atribuição das consequências do desastre a uma abstrata “ideologia de extrema direita”, o que equivale a dizer que a culpa seria do povo.

A crise continua sendo a economia e, em um nível mais profundo, a política direitista da frente ampla.

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