O Ministério Público Federal (MPF), atualmente sob comando do lava-jatista Paulo Gonet, apresentou uma denúncia contra o presidente nacional do Partido da Causa Operária (PCO), Rui Costa Pimenta. A acusação foi oferecida à 9ª Vara Criminal da Seção Judiciária de São Paulo.
Em um documento de 19 páginas, assinado por Melina Tostes Haber, o MPF alega que o dirigente trotskista teria infringido o segundo parágrafo do Artigo 20 da Lei do Racismo, que proíbe “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”.
Haber acusa Rui Pimenta de ter proferido, em fevereiro de 2022, outubro e novembro de 2023, e junho e julho de 2024, em dias diversos, “discursos discriminatórios contra a comunidade judaica”. Estes “discursos”, por sua vez, teriam sido transmitidos originalmente em redes associadas ao PCO.
Desde 2023, o “crime” pelo qual Pimenta está sendo acusado é considerado mais grave se for cometido por meio “dos meios de comunicação social, de publicação em redes sociais, da rede mundial de computadores ou de publicação de qualquer natureza”. Caso condenado, Pimenta poderá enfrentar uma pena de dois a cinco anos de prisão, além de multa.
Segundo a procuradora, Pimenta “afirmou ser contra a existência de um ‘Estado judeu’, defendeu e incentivou sua destruição, além de manifestar apoio irrestrito a um grupo terrorista com o objetivo explícito de matar judeus”. Ela conclui que “essas ações [sic] demonstram sua inequívoca vontade de propagar a discriminação, bem como de incitar a violência e a intolerância religiosa contra judeus”.
Embora fale em “ações”, tudo o que a Haber aponta são, na verdade, “discursos”, como ela mesmo apontou. Discursar não é agir.
A denúncia é uma fraude. O presidente do PCO está sendo acusado por um conjunto de colocações políticas, apresentadas, como o próprio MPF deixa claro, em plataformas dedicadas à propaganda partidária. Rui Costa Pimenta está sendo denunciado por defender publicamente o programa de seu próprio partido.
A alegação de que o dirigente é contra um “Estado judeu” é simplesmente uma falsificação. Conforme explicado em palestras, programas, entrevistas e artigos, tanto Pimenta quanto o PCO são contra a existência do Estado de “Israel”. O Estado não é uma religião, é uma entidade política, e não uma entidade sagrada.
A acusação é maliciosa e busca confundir a crítica política contra as práticas genocidas, reconhecidas como tais pela Corte Internacional de Justiça (CIJ), com uma inexistente crítica à comunidade judaica. A confusão parte da seguinte fala de Pimenta em um programa veiculado na Internet: “nós somos contra a existência de um Estado que seja um Estado judeu e que tenha caráter confessional, quer dizer, religioso”. Como é possível inferir do próprio trecho, o presidente do PCO não estava protestando contra o direito dos judeus de formarem um Estado, mas sim contra o fato de que, na Palestina Ocupada, onde pelo menos um terço da população é árabe, há um Estado oficialmente religioso que, em nome do judaísmo, promove um apartheid social.
A acusação maliciosa busca apresentar o PCO e Rui Pimenta como inimigos dos judeus, o que é algo totalmente sem fundamento. Ambos são trotskistas — isto é, seguidores da doutrina levada adiante pelos judeus Karl Marx e Leon Trótski. No mês de julho, Pimenta participou de um ato, promovido pelo PCO, em apoio ao rabino Yisroel Dovid Weiss, em sua viagem ao Brasil. Weiss, assim como Pimenta, compartilha da opinião de que “Israel” deve ser destruído.
O “grupo terrorista” citado pelo MPF, por sua vez, é o Movimento de Resistência Islâmica (Hamas, na sigla em árabe), grupo este que nem a Organização das Nações Unidas (ONU), nem o governo brasileiro reconhecem como “terroristas”.
De acordo com a peça assinada por Melina Tostes Haber, a denúncia foi produzida após uma notícia-crime apresentada pela Confederação Israelita do Brasil (CONIB) em 25 de outubro de 2023, notificando “a propagação de discurso de caráter discriminatório e antissemita em redes sociais do Partido da Causa Operária (PCO)”.
Haber também informa que sua acusação foi alimentada por uma investigação da Polícia Civil. Esta investigação teria citado um exemplar do jornal Causa Operária, do qual Pimenta é o editor-chefe, que traz como manchete os dizeres: Todo apoio ao Hamas e à resistência palestina pelo fim do Estado de “Israel”. O mesmo relatório teria ainda informado que Rui Pimenta fez o seguinte discurso:
“Eu queria aqui, nessa reunião, pedir agora que todo mundo se levantasse, desse uma salva de palmas para o Hamas e outras organizações. Viva a resistência armada palestina contra os nazistas que estão matando gente em defesa na Faixa de Gaza.”
Não é possível identificar em nenhum dos trechos qualquer incitação à discriminação ou preconceito contra judeus. O que há, na verdade, são declarações em oposição a um genocídio.
O MPF também cita uma representação da Conib segundo a qual Rui Costa Pimenta “proferiu comentários antissemitas em uma entrevista postada no YouTube”. A denúncia não apresenta onde estaria este “antissemitismo”, limitando-se a destacar, uma vez mais, o “grupo terrorista Hamas”. Sequer existe o termo “antissemitismo” na Constituição Federal ou no Código Penal, de tal modo que a expressão não passa da opinião da procuradora que quer proibir o presidente do PCO opinar.
Em determinado momento, o MPF apresenta como “prova” da infração penal de Rui Costa Pimenta um discurso feito por seu filho:
“Nova representação da CONIB […] traz informações de que o filho do Presidente do PCO, João Caproni Pimenta, proferiu discurso de ódio na Av. Paulista, no dia 22/10/2023, nos seguintes termos:
‘Nós temos que exigir o fim do Estado terrorista de Israel. […] Nós temos que saudar, queria chamar uma salva de palmas para todos os grupos armados, para o Hamas, para a Jihad Islâmica e para todos os grupos que lutam pela Palestina, viva o Hamas, viva a Palestina’.”
A procuradora esqueceu, no entanto, que, no Brasil, não se pode estender a responsabilidade penal a terceiros. Nenhuma fala do filho de Rui Costa Pimenta pode ser utilizada em uma denúncia contra ele, a não ser que o objetivo do processo seja puramente político. Isto é, mobilizar a opinião pública e o aparato de repressão estatal contra Pimenta e os integrantes do PCO.
A denúncia cita ainda um documento da Conib “asseverando que o PCO estava vendendo camisetas, broches, adesivos e cartazes com a bandeira do Hamas, em evidente apologia e incitação ao ódio contra os judeus”. Não há como provar que o PCO, que é um partido político, tenha vendido qualquer coisa. Se seus militantes o fizeram, o presidente do Partido não pode ser responsabilizado por isso.
A venda de tais materiais, por sua vez, não é uma incitação de ódio contra os judeus. No ato citado com a presença do rabino Weiss, havia materiais ligados à resistência palestina, o que comprova que estes não são ofensivos à comunidade judaica.
Em nenhum momento, a procuradora explica porque associa a defesa do Hamas à discriminação religiosa. Trata-se tão-somente da manipulação de uma série de preconceitos difundidos pela imprensa capitalista, uma verdadeira fábrica de mentiras contra os homens e mulheres que estão dando o seu sangue para libertar seu povo da dominação colonial sionista.
Em seu Documento de princípios e políticas gerais, o grupo expõe claramente:
“O Hamas afirma que seu conflito é com o projeto sionista, não com os judeus por sua religião. O Hamas não trava uma luta contra os judeus por serem judeus, mas sim uma luta contra os sionistas que ocupam a Palestina. No entanto, são os sionistas que constantemente associam o judaísmo e os judeus ao seu próprio projeto colonial e entidade ilegal.
O Hamas rejeita a perseguição de qualquer ser humano ou a negação de seus direitos, com base em motivos nacionalistas, religiosos ou sectários. O Hamas tem a visão de que o problema judaico, o antissemitismo e a perseguição aos judeus são fenômenos fundamentalmente ligados à história europeia, e não à história dos árabes e dos muçulmanos, ou à sua herança. O movimento sionista, que conseguiu, com a ajuda das potências ocidentais, ocupar a Palestina, é a forma mais perigosa de ocupação por assentamento, a qual já desapareceu de grande parte do mundo e deve desaparecer da Palestina.”
Em nova citação da Conib, o MPF informa que “Rui Pimenta Liderou uma comitiva do partido ao Catar, onde passou 10 dias e se reuniu com o chefe do gabinete político do Hamas, Ismail Haniyeh. Também teve encontros com Moussa Mohammed Abu Marzook, Ministro das Relações Exteriores do Hamas e segundo na hierarquia política, e com Basem Naim, responsável político do grupo terrorista em Gaza”.
Não há mais informações sobre o encontro. Não custa lembrar à procuradora que não existe, no Brasil, o “crime de reunião”.
Não bastasse não apresentar uma única prova que justificasse uma acusação com base na Lei do Racismo, Haber ainda procurou suprir a falta de dispositivos legais para tipificar os “discursos” de Rui Costa Pimenta como criminosos com citações de pessoas e entidades diversas.
A procuradora juntou ao processo um relatório do delegado Leopoldo Soares Lacerda, integrante do Departamento de Enfrentamento ao Terrorismo da Polícia Federal, para justificar por que o Hamas deveria, em sua opinião, ser considerado um grupo terrorista, ainda que isso contrarie a Lei.
O relatório alega o seguinte:
“Sobre o fato de o Estado brasileiro não reconhecer o grupo Hamas como organização terrorista, esclarecemos que a legislação pátria não utiliza listas de classificação para definir quais grupos são considerados terroristas. No Brasil, o enfrentamento de organizações terroristas é pautado por um sistema que adota o conceito de lista aberta, um modelo flexível que permite a inclusão de novos grupos mediante evidências e informações de envolvimento com os tipos penais descritos na Lei nº 13.260, de 16 de março de 2016. Dessa forma, a abordagem de lista aberta no Brasil significa que não há uma lista fixa e imutável de organizações terroristas, mas sim um processo contínuo de avaliação e atualização conforme novas informações e mudanças no cenário internacional.”
Esta concepção, no entanto, viola um dos princípios mais básicos do Direito, o princípio da legalidade. Se é a Polícia Federal quem define as tais “organizações terroristas” de acordo com “um modelo flexível”, então o cidadão brasileiro nunca vai saber quando está cometendo um crime ou não.
O relatório citado foi produzido para responder a um mandado de segurança solicitado pelo palestino Muslim Abuumar, de 38 anos. Em junho de 2024, Abuumar havia sido proibido de entrar no Brasil sob a acusação de integrar o Hamas. Ele estava acompanhado da esposa, grávida de sete meses, do filho de seis anos e da sogra.
Apesar de o Hamas ser, a todo momento, chamado de “grupo terrorista”, Rui Pimenta não é, curiosamente, acusado de terrorismo, mas unicamente de “discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”. Fica claro, portanto, por que a direita brasileira decidiu, em votação no Congresso Nacional, equiparar o crime de injúria racial ao racismo.
O “racismo” passou a ser, aos olhos do Judiciário, uma determinada maneira de pensar, um fato subjetivo, e não determinadas ações discriminatórias, como, por exemplo, impedir uma pessoa em virtude de considerações raciais de entrar num restaurante, de usar um banheiro público ou de ocupar um determinado emprego. Graças à equiparação, a lei não mais pune o ato, mas sim o que supostamente há na cabeça das pessoas.
Não se tratava de uma defesa do negro, mas uma preparação para a caça às bruxas sionista. Os setores de esquerda que apoiaram essa política cometeram um grave erro.
Quanto ao “antissemitismo”, utilizado gratuitamente pela procuradora, o MPF esclarece que se baseia na Aliança Internacional para a Memória do Holocausto, que afirma que uma das expressões de antissemitismo é precisamente “negar ao povo judeu seu direito à autodeterminação”. Ocorre que, conforme explicado acima, em nenhum momento o presidente do PCO defendeu que os judeus não tinham direito à autodeterminação, mas sim que a usurpação das terras palestinas pelos sionistas era um crime contra a humanidade.
Mas a principal entidade citada é, como ficou claro ao longo desta reportagem, a Conib. Esta, por sua vez, já se tornou conhecida pela atividade policialesca de produzir relatórios e processos contra aqueles que criticam o Estado de “Israel”. Embora se diga uma “Confederação Israelita”, atua como se fosse um braço dos serviços de inteligência de outro país dentro do Brasil.
Embora já seja conhecida a atuação da Conib, o caso em tela chama a atenção porque parte não de uma entidade formalmente partidária do sionismo, mas de uma instituição do Estado brasileiro. Parte da mesma instituição que, há menos de um mês, produziu uma denúncia sem provas contra um ex-presidente da República que foi integralmente aceita pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Além de seu prestígio com a mais alta Corte do País, o MPF também tem se destacado por sua atuação em defesa do sionismo no Brasil. Em julho, a instituição protocolou um recurso especial para aumentar a pena de Lucas Passos Lima, brasileiro acusado por “terrorismo” por ter viajado ao Líbano.
O documento de Melina Tostes Haber é uma peça política, não é uma peça jurídica. O presidente do PCO, portanto, vai ser obrigado a comparecer à Justiça para justificar as suas posições políticas.
A denúncia contra o PCO mostra que, muito ao contrário do que diz a procuradora ao alardear sobre o inexistente “antissemitismo” de Rui Costa Pimenta, quem está sendo duramente perseguido no Brasil são os críticos de “Israel”. E que, portanto, o sionismo está infiltrado nas instituições brasileiras.





