Nesse último sábado (26), o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), expediu uma decisão que proíbe a instalação de acampamentos num raio de até um quilômetro da Praça dos Três Poderes, da Esplanada dos Ministérios e dos quartéis das Forças Armadas. A ordem foi usada para remover deputados federais que haviam iniciado um protesto silencioso em frente à sede do STF, na capital federal. O episódio escancara o avanço das medidas de exceção no país e coloca em xeque direitos fundamentais garantidos pela Constituição Federal, como o direito à livre manifestação e reunião pacífica.
A decisão foi tomada no âmbito do Inquérito das “Fake News”, atendendo a um pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR). No despacho, Moraes ordena a retirada imediata dos deputados Hélio Lopes (PL-RJ), Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), Cabo Gilberto Silva (PL-PB), Coronel Chrisóstomo (PL-RO) e Rodrigo da Zaeli (PL-MT), além de qualquer outro indivíduo que participasse do protesto.
De acordo com o texto da decisão, os parlamentares estariam participando de “possível prática criminosa”, o que justificaria, segundo o ministro, a remoção forçada e até mesmo a prisão em flagrante. Moraes determinou ainda que o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), fosse pessoalmente intimado a impedir a realização de novos acampamentos no local, sob pena de responsabilização direta. A operação contou com o uso da Força Nacional, da Polícia Militar do Distrito Federal e da Secretaria de Segurança Pública.
Na justificativa da decisão, Moraes retomou os acontecimentos do dia 8 de janeiro de 2023, afirmando que a suposta “tentativa de golpe” naquele dia foi facilitada pela “política de apaziguamento” de autoridades públicas. O ministro chegou a citar o nazismo e a política externa do primeiro-ministro britânico Neville Chamberlain, comparando a omissão das autoridades em 2023 à conivência com Adolf Hitler nas décadas de 1930.
A decisão também invoca precedentes da Suprema Corte dos Estados Unidos, que, embora reconheça o direito à livre reunião, estabelece limites em situações que representem risco à ordem pública. Segundo Moraes, a presença de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro na Praça dos Três Poderes teria como objetivo “coagir ministros do Supremo Tribunal Federal” e “interferir no andamento de julgamentos sensíveis”.
O episódio que motivou a ação ocorreu na sexta-feira (25), quando o deputado Hélio Lopes montou uma barraca em frente ao STF e anunciou uma “greve de silêncio”, cobrindo a boca com esparadrapo e segurando uma Constituição e uma Bíblia. O ato rapidamente atraiu outros parlamentares bolsonaristas e chamou a atenção do tribunal, que acionou a PGR. O ministro então determinou a remoção imediata do grupo e a proibição de qualquer acampamento futuro, mesmo que pacífico.
Após a chegada da polícia e a intervenção do governador Ibaneis Rocha, os deputados deixaram o local pacificamente durante a madrugada. Em vídeo publicado nas redes sociais, o deputado Coronel Chrisóstomo afirmou que o grupo obedeceu à ordem judicial, mas que continuará protestando:
“Nossa luta é pela liberdade. Queremos votar o PL da Anistia, queremos o fim da perseguição ao nosso líder Bolsonaro.”
Diversos juristas se pronunciaram sobre a decisão de Moraes, apontando uma série de irregularidades. Para o advogado André Marsiglia, a medida é “juridicamente errada” e representa mais uma violação direta do direito de reunião, garantido pelo artigo 5º da Constituição. Marsiglia também lembrou que deputados federais só podem ser presos em flagrante por crime inafiançável, o que não se aplica às acusações de resistência ou desobediência.
Na mesma linha, o advogado Ênio Viterbo afirmou que a decisão extrapola os limites legais do STF e interfere na autonomia do governo do Distrito Federal, ao impor ordens administrativas diretamente ao governador Ibaneis. Segundo ele, a ordem “transforma o Judiciário em um poder executivo de fato”.
O direito à manifestação pacífica em locais públicos é garantido expressamente pela Constituição de 1988 e por diversos tratados internacionais assinados pelo Brasil. A repressão a protestos políticos representa um avanço perigoso da autoridade do Judiciário sobre os demais poderes e sobre o povo. O Supremo Tribunal Federal tem acumulado poderes que não lhe competem, agindo por meio de inquéritos secretos, prisões sem julgamento e decisões monocráticas que interferem diretamente na política nacional, estabelecendo uma ditadura no País.
Com o pretexto de combater “ameaças à democracia”, Moraes tem promovido a supressão de liberdades democráticas básicas e a transformação do STF em uma corte punitiva contra adversários políticos.
A decisão de Moraes, além de ilegal em vários aspectos, também expõe a fragilidade da operação da burguesia que visa retirar Bolsonaro das próximas eleições. Diante da perseguição que o ex-presidente está sofrendo e da crise social cada vez maior, um protesto singelo como o dos deputados que resolveram acampar na Praça dos Três Poderes pode rapidamente dar lugar a um protesto generalizado contra as instituições do regime político.





