No dia 29 de dezembro, Jimmy Carter faleceu aos 100 anos de idade na cidade de Plains, na Geórgia. Após sua morte, como é de praxe na imprensa burguesa, inúmeros textos louvando o ex-presidente dos Estados Unidos foram publicados. Aqui no Brasil, Elio Gaspari foi um dos que escreveram algo na tentativa de revitalizar a imagem de Carter, em coluna publicada na Folha de São Paulo no dia 31 de dezembro.
Em seu texto, intitulado “Carter foi um grande presidente”, Gaspari atribui a derrota de Carter na tentativa de reeleição em 1980 a seu perfil de “homem simples” e à alta inflação resultante das crises do petróleo. Apesar disso, Gaspari destaca Carter como um importante defensor dos direitos humanos e como alguém que teria contribuído para o fim da ditadura no Brasil.
No entanto, Jimmy Carter é frequentemente descrito como uma figura limitada em suas capacidades políticas, tendo assumido a presidência dos Estados Unidos em um período marcado por crises que desafiaram a hegemonia imperialista do país. Sua imagem de líder democrático surgiu em parte como resposta às demandas de reconstrução da credibilidade dos Estados Unidos após a derrota no Vietnã e as crescentes denúncias de crimes de guerra que repercutiam amplamente na sociedade norte-americana.
Ao mesmo tempo, Carter foi o responsável pelos acordos de Camp David, selados em 1978, que normalizaram relações entre “Israel” e Egito, uma grande derrota para o nacionalismo árabe, em especial, para os governos seculares da região e para os palestinos, já que a principal nação árabe agora tinha relações com “Israel”.
A derrota imposta ao nacionalismo árabe no Egito, que favoreceu “Israel”, contrastam muito com a figura de alguém que se queira apresentar como um grande democrata e defensor dos direitos humanos. Porém, o governo de Carter foi além. Foi durante seu período de governo que os EUA armaram os Contras na Nicarágua, grupos fascistas que lutaram contra os revolucionários sandinistas e cometeram muitos crimes contra a população nicaraguense.
Mas, o que marcou mesmo o governo de Carter foi a inflação e as derrotas do imperialismo, como as já citadas derrotas no Vietnã, no Irã e na Nicarágua, mas também com as derrotas no Brasil com as grandes greves e manifestações estudantis do final dos anos 70, o que evidenciou para todo o mundo a incapacidade do imperialismo de controlar a situação.
Ao contrário do que diz Gaspari, não foi o desejo de Carter que iniciou a mudança no Brasil e no resto da América Latina, mas sim, as mobilizações populares que evidenciavam para todo o mundo o regime de exceção vivido na região.
Se, como aponta Gaspari, houve um distanciamento entre o governo dos EUA e o governo militar no Brasil e se a esposa de Carter veio ao Brasil para realizar algumas entrevistas que exporiam alguns aspectos da ditadura, isso se deu muito mais porque o regime não conseguia mais ser encoberto em todo o mundo e a mobilização dentro do Brasil era quem mais contribuía com isso.
Gaspari também cita a interferência de Carter em relação ao acordo nuclear que o Brasil havia assinado na época com a Alemanha e que levaria à construção de algumas usinas nucleares aqui, além do reprocessamento de urânio, algo que até hoje é necessário para o desenvolvimento nacional brasileiro.
Segundo Gaspari, Carter foi decisivo para o fim do acordo. Ou seja, mais uma prova do caráter nada democrático do governo de Jimmy Carter, já que, ainda que se tratando de um governo ditatorial no Brasil, a interferência dos EUA em questões nacionais brasileiras não pode ser vista como algo democrático.
Por fim, nada do que Carter fez em seu governo foi obra de sua própria sabedoria e as ações do governo dos EUA, como sempre, são fruto do chamado “deep state” (Estado profundo). Carter, nesse sentido, era muito parecido com o governo de Barack Obama, em que a figura presidencial sem talento e sem controle do governo é utilizada apenas como uma tentativa de se apresentar o governo dos EUA como democrático e simpático em relação ao público.