Os ataques israelenses contra a população palestina na Faixa de Gaza seguem deixando um rastro de sangue, sofrimento e destruição.
Um dos crimes de guerra mais bárbaros recentes ocorreu quando a aviação israelense bombardeou uma cozinha solidária em Khan Iunis, no sul da Faixa de Gaza. No momento do ataque, dezenas de palestinos haviam se reunido no local para receber comida. Seis pessoas foram assassinadas e ao menos 10 ficaram feridas. Entre as vítimas estão mulheres e crianças.
Imagens verificadas pela Al Jazeera mostram corpos estendidos ao lado das panelas e caldeirões usados na distribuição de alimentos. Uma menina, com um grave ferimento na cabeça, aparece caída ao lado dos escombros. Samah Abu Jamie, tia de um dos mortos e mãe de uma das crianças feridas, relatou: “eles foram buscar comida. Eu disse à minha filha: ‘filha, não vá’. Eram crianças, e não levavam nada além de uma panela. Uma panela é uma arma?”.
Outro crime recente foi o assassinato do jornalista palestino Ahmad Mansour, vítima de queimaduras graves causadas por um bombardeio israelense a um abrigo de imprensa em Khan Iunis. O local, composto por tendas, foi incendiado pelo ataque. Ahmad sobreviveu por apenas um dia após o ataque e morreu em decorrência dos ferimentos. Sua esposa, Nidaa, relatou que ficou horas tentando contato com ele antes de perder as esperanças: “tive alguma esperança de que ele estivesse vivo. Mas não havia esperança”.
Enquanto a matança continua, o secretário-geral da ONU, António Guterres, denunciou a situação desesperadora da população de Gaza. Em pronunciamento, afirmou que os palestinos estão presos em um “ciclo infinito de morte” e exigiu o fim imediato do bloqueio imposto por “Israel”. A entrada de ajuda humanitária está totalmente bloqueada há mais de um mês, afetando 2,3 milhões de pessoas que vivem sem acesso a alimentos, medicamentos, combustível e água potável.
Apesar da sequência infindável de crimes, “Israel” segue em negociações secretas com o Hamas, de acordo com a imprensa israelense. A emissora Kan relatou que as tratativas intermediadas pelo Egito continuam, com propostas em torno da libertação de 10 prisioneiros israelenses (incluindo o cidadão israelo-americano Edan Alexander) em troca de cinco prisioneiros pelo Hamas. Embora não haja resposta oficial até o momento, “Israel” permanece alinhado à proposta do mediador norte-americano Steve Witkoff, que exige a entrega de 11 prisioneiros vivos e os restos mortais de 16 falecidos. As conversas prosseguem sob forte sigilo, enquanto o cerco genocida à Faixa de Gaza continua a provocar destruição em massa e tragédias diárias.
Em artigo intitulado É isso que se chama de fracasso total: este é o retrato sombrio da situação em Gaza, publicado pelo portal hebraico Maariv, a situação do Estado de “Israel” é apresentada como extremamente delicada. A reportagem, feita a partir de depoimentos de altos funcionários das forças armadas israelenses, mostra a entidade sionista completamente desorientada após a sequência de bombardeios covardes que vem realizando desde 17 de março.
“Apesar dos elogios recebidos pelos altos escalões das forças de segurança no início da operação ‘Força e Espada’, que marcou o retorno do Estado de ‘Israel’ ao combate em Gaza, uma fonte de segurança sênior fez duras críticas ao andamento da operação – e alertou: ‘não há combate ofensivo atualmente em Gaza’.”
A linguagem utilizada pelo jornal não deixa margem para dúvidas de que se trata de uma fonte insuspeita. O portal Maariv apoia o genocídio do povo palestino, o que fica expresso na ideia de que o retorno dos bombardeios teria sido uma “operação” que mereceu “elogios”.
É preciso ser claro. Se houve algum êxito na “operação”, está no fato de que ela contou com o elemento surpresa. Os palestinos e a sua liderança, o Movimento de Resistência Palestina (Hamas), ainda que nunca tenham confiado nas palavras do governo comandado pelo primeiro-ministro fascista Benjamin Netaniahu, estavam desfrutando de um cessar-fogo, acordado pelo próprio Estado de “Israel”. Mediado por governos de países como o Catar e os Estados Unidos, o acordo previa que “Israel” cessasse as suas agressões ao povo de Gaza e que retirasse progressivamente as suas tropas.
“Israel”, unilateralmente, decidiu rasgar o acordo e retomar os bombardeios. É isso o que o portal Maariv chama de “operação” que recebeu “elogios”, sem considerar que, ao rasgar um acordo de cessar-fogo, não é necessário ser nenhum gênio militar para desferir um ataque bastante destrutivo.
O que chama a atenção, no entanto, não é a canalhice do portal. É que, mesmo sendo um portal favorável aos crimes da ocupação – e, na verdade, justamente por isso –, o Maariv apresenta o depoimento de quem diz que “Israel” não está realizando um combate ofensivo. Isto é, que, apesar do assassinato de civis, não está conseguindo, uma vez mais, avançar sobre o território governado pelo Hamas.
“Os resultados esperados, como a pressão sobre o Hamas que queríamos alcançar, não estão ocorrendo no terreno. Há, de fato, pressão sobre a organização terrorista, mas não é a que estimávamos. Por isso, o Hamas não está avançando nas negociações. E, na verdade, não há atualmente negociação real pela libertação dos reféns. Quando o primeiro-ministro retornar dos EUA, faremos uma avaliação de situação e revisaremos os planos para continuar.”
A citação é de uma “fonte política” mencionada pelo portal hebraico. Traduzindo para o português mais claro possível: mesmo assassinando 1.400 civis, cinco altos dirigentes do Hamas e combatentes importantes das Brigadas Al-Qassam, “Israel” não conseguiu fazer o Hamas recuar.
Quando a “fonte política” fala em “avançar nas negociações”, ela está reconhecendo que o Hamas se recusa a aceitar os termos criminosos propostos por “Israel” para que seja estabelecido um novo cessar-fogo. É preciso lembrar que já há um acordo de cessar-fogo, assinado por ambos os lados. O problema é que o governo israelense – e a citação deixa isso claro – ficou insatisfeito com o acordo, pois ele expôs toda a fraqueza da ocupação sionista, e decidiu retomar seus crimes de guerra na expectativa de que isto pressionasse o Hamas a ceder diante das novas condições.
A ação de “Israel” é desesperada. Se seguisse com o acordo, seria cada vez mais desmoralizado, uma vez que o cessar-fogo expôs com clareza a debilidade de seu exército diante do Hamas, bem como o apoio mundial à Resistência Palestina. Romper o cessar-fogo, por sua vez, apenas seria uma política efetiva se ela levasse a um novo tipo de acordo, que levasse à queda do Hamas na Faixa de Gaza e à recuperação do poder dissuasório de “Israel”. Isto, contudo, não está nem perto de acontecer, segundo o próprio portal hebraico.
A mesma fonte continuou dizendo:
“À medida que o tempo passa, perde-se a capacidade de exercer a pressão desejada. O Hamas está aproveitando o tempo para se recuperar e se reestruturar. Está em uma situação diferente da de três semanas atrás. Devemos ser honestos. Não há realmente combate ofensivo neste momento em Gaza. O Hamas não sente de fato a pressão.”
É uma confissão da incompetência israelense. Aqui, a tal “fonte” atesta que o que há na Palestina é uma poderosa revolução de todo o seu povo. Por isso, os bombardeios, por mais criminosos que sejam, são incapazes de liquidar com a determinação da Resistência. É por isso que o Hamas, mesmo tendo perdido 15 de seus 20 dirigentes que estavam vivos no dia 7 de outubro, “não sente de fato a pressão”.
A declaração, inclusive, atesta também uma provável derrota a curto prazo de “Israel”. Afinal, se o Hamas “não sente de fato a pressão” e está se recuperando, o que será do conflito daqui a dois meses? O que acontecerá se o Hamas entrar de maneira decidida na guerra contra “Israel”, como fez bravamente durante os 15 meses da Operação Dilúvio de Al-Aqsa?
A confissão israelense também explica a política meticulosa do Hamas, que age como se estivesse em um jogo de xadrez. O partido revolucionário palestino, mesmo diante de tantas provocações, que levaram ao assassinato de lideranças, ao martírio de seu povo e a campanhas de calúnia afirmando que os palestinos querem a queda do governo de Gaza, segue denunciando os crimes de “Israel” e exigindo que o acordo de cessar-fogo seja cumprido. O Hamas não declarou guerra oficialmente a “Israel” porque sabe que o seu inimigo está em uma posição muito delicada e que o governo israelense pode entrar em colapso a qualquer momento.
A “fonte política” do Maariv ainda diz que:
“Perdemos toda a vantagem do movimento inicial, perdemos o objetivo da operação ao evitar o combate. Estamos tentando eliminar um ou outro militante em Gaza, mas isso não é guerra. Não estamos nem aqui nem ali. Não há continuidade nas operações. Isso está relacionado também à política do governo. Não podemos agora escolher alvos com pinça e, dessa forma, exercer pressão sobre o Hamas – isso provavelmente não vai funcionar.”
É uma declaração de quem está desesperado, e não de quem está levando adiante uma operação para “exterminar a Resistência”, como prometeu e falhou miseravelmente Benjamin Netaniahu, e como prometeu e falhará novamente o primeiro-ministro na retomada de sua guerra genocida.