Brasil

Identitários saem em defesa da Ditadura Militar

Identitária relativiza a Ditadura Militar contrapondo o horror do passado recente ao evento encerrado há mais de dois séculos

Ditadura militar

A jornalista Etiene Martins publicou um curioso artigo para o jornal burguês Estado de Minas, intitulado Por que 22 anos de ditadura incomodam mais que 388 anos de escravidão?, que, como indicado pelo título, embeleza a Ditadura Militar (1964-1985), o que não deixa dúvidas quanto ao caráter direitista do artigo e, a julgar pelo tema escolhido, da própria autora. Diz Martins:

“Muitas pessoas fingem não ver e não denunciam o fato de que 22 anos da ditadura são tratados como mais dolorosos do que 388 anos de escravidão. Fingem não ver por medo de ficarem desempregados, excluídos do mercado de trabalho, taxados como essencialistas, identitários ou até como radicais.”

Não entraremos aqui no mérito da colocação ser abertamente bolsonarista, apenas a registrarmos para fins de expor a contradição política frontal entre dizer-se defensora dos negros e reproduzir a mesma propaganda feita pela extrema direita na defesa da Ditadura Militar, um campo que, entre outras coisas, defende o genocídio do povo negro nas favelas e nos bairros pobres das grandes cidades brasileiras, e não de maneira diletante. Isso dito, é óbvio que um evento histórico mais recente e diretamente ligado ao presente produzirá mais impactos na vida cotidiana do que outro extinto há séculos.

Pode ter escapado a Martins enquanto a acadêmica elaborava suas ideias, mas se, por um lado, a figura do capitão do mato chegou aos dias de hoje como metáfora, a Polícia Federal (PF) não. Criada em 1965 sob orientação e financiamento da USAID, a PF é responsável por incontáveis crimes, desde a participação ativa na repressão durante a ditadura, até o apoio decisivo ao Golpe de 2016 e as demonstrações públicas de que é um órgão controlado pelo imperialismo, e o sinistro MOSSAD, o criminoso serviço secreto sionista.

Finalmente, foi no período da Ditadura Militar que se desenvolveram os métodos de tortura utilizados ainda hoje pela polícia brasileira para aterrorizar a população, sobretudo o povo negro. Além disso, o furacão neoliberal que devastou a economia brasileira e fez com que mais de 50 milhões de brasileiros, ainda hoje, sobrevivessem da esmola dos programas de assistência social tampouco foram um raio em céu azul. Uma das tarefas fundamentais da Ditadura Militar era derrotar o nacionalismo brasileiro e com isso, esmagar as conquistas da Revolução de 1930, destacadamente a forte indústria brasileira, ainda hoje, a mais desenvolvida dentre as nações atrasadas, sendo somente agora alcançada pela China.

O desemprego crônico que aflige a maior parte da classe trabalhadora brasileira (de maioria negra, embora não majoritariamente, diga-se de passagem), a pobreza, a miséria e a violência policial que açoita os trabalhadores não são fenômenos de séculos atrás, mas parte da experiência cotidiana de dezenas de milhões de operários. E isso tem relação direta com a Ditadura Militar. Nada mais normal, portanto, que “22 anos de ditadura incomodem mais que 388 anos de escravidão”, sendo o questionamento de Martins o que realmente causa espanto.

“Quando eu olho para o rosto do Walter Salles Jr.”, continua a acadêmica, “enxergo a descendência dos que torturaram, estupraram, açoitaram, mantiveram em cárcere os meus ascendentes”, exibindo o vitimismo tipicamente identitário e que felizmente, já tem levado à crise dessa detestável ideologia criada pelo imperialismo, curiosamente, um fenômeno político oriundo de países de população majoritariamente brancas e onde o povo negro é tratado com uma brutalidade faz o racismo brasileiro parecer algo humanitário. Esse sistema, que implica em uma ditadura mundial, continua fazendo hoje, tudo o que a autora denuncia que foi feito até o século XIX, porém em uma escala imensuravelmente maior, com negros, brancos, árabes, asiáticos e praticamente toda a população mundial, perpetrada pelos organizadores da Ditadura Militar que Martins relativiza.

Aparentemente, nada disso importa para a acadêmica pequeno-burguesa, que também não demonstra muita preocupação com o fato de o imperialismo ser o sistema social responsável pelo massacre dos negros de hoje. Se um dos mais memoráveis mártires da Ditadura Militar foi um homem negro chamado Carlos Marighella, não vem ao caso. Se na Ditadura Militar estão as raízes para a conspiração golpista de 2016 responsável, entre outras coisas, por aumentar exponencialmente a letalidade da polícia, também não vem ao caso para a jornalista.

O que “dói” e “traumatiza” Martins são eventos ocorridos há mais de dois séculos, responsáveis pelo que a autora define como “um trauma coletivo que deixa como herança as desigualdades sociais, o genocídio, a necropolítica e o racismo que insistem em nos exterminar”. Tudo muito bem dito, porém ao isentar a ditadura da responsabilidade, Martins demonstra, na prática, que não está verdadeiramente preocupada com a violência que aflige o povo brasileiro, entre eles naturalmente os negros.

Sua preocupação é o cineasta brasileiro e a obra que a direitista acadêmica se orgulha de não ter assistido “porque não é justo com meus ancestrais que foram escravizados pelos ascendentes desse diretor”. E o passado. Nada do presente.

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