O jornalista César Fonseca, editor do sítio Independência Sul Americana, publicou no Brasil 247 um artigo intitulado Golpe bonapartista da impunidade parlamentar, no qual repete o tom geral da propaganda imperialista contra a PEC das Prerrogativas, rebatizada por ele de “Golpe da Impunidade”. Embora o texto apresente sinais de que o autor não se encontrava em órbita, é claríssimo a franca defesa do Supremo Tribunal Federal (STF) em passagens como as que Fonseca avalia:
“A direita e a ultradireita congressista, coordenadas pelo Centrão, que entregaram de bandeja o país para ao capital externo e acumularam altos passivos, passíveis de serem condenados pelos tribunais, estão com medo de serem julgadas pelo STF; esse é o sentido maior da PEC da Blindagem, aprovada, a toque de caixa, por elas, na Câmara, para garantir a impunidade frente a julgamento político.”
Ora, acaso o que restou do PSDB, MDB e União Brasil “estão com medo do STF”? Ainda, se direita e extrema direita estão unidos contra a instância máxima do Judiciário, teria um dos mais destacados órgãos do golpe de Estado de 2016 e 2018 repentinamente se convertido de partido do imperialismo a partido bolchevique?
Não é toda a direita que está “com medo do STF”, mas um setor específico: a extrema direita. Essa distinção precisa ser feita para que os trabalhadores e estudantes tenham clareza sobre um fenômeno que está se processando na política brasileira e, em grande medida, em todo o planeta: na atual etapa da crise imperialista, a extrema direita representa um problema maior para o imperialismo do que a esquerda.
Nos EUA, na Europa e também no Brasil, o campo tradicional dos trabalhadores encontra-se dirigido por uma pequena burguesia domesticada – quando não completamente dominada – pelo imperialismo. É o caso do governo trabalhista britânico, da social-democracia alemã e seu governo mal-fadado, dos Partidos Socialistas chileno e francês e, também, de inúmeros esquerdistas brasileiros. Pelo artigo, fica claro que Fonseca é um deles.
Já a extrema direita, que até o momento não tem se chocado com os trabalhadores, têm arregimentado um número cada vez maior da base natural da esquerda para seus próprios interesses. A esquerda, por sua vez, se torna cada vez mais fiadora de um regime odiado por cada vez mais pessoas.
Com isso, termina se colocando voluntariamente como um alvo da ira dos setores mais atrasados e numerosos da classe trabalhadora, facilitando os ataques da extrema direita e, por fim, sendo um fator de confusão decisivo no interior da classe trabalhadora. Indiferente a isso, Fonseca prossegue:
“O legislativo declara guerra ao STF: não aceita ser investigado por outro poder republicano que não seja ele, com seus próprios critérios de julgamento; aprovado por ampla maioria, da qual participou minoria de esquerda, a PEC da Blindagem é o grito de guerra contra a justiça.”
Porque, no entanto, o Legislativo deveria aceitar ser investigado por outro poder? A própria Constituição estabelece o contrário: nem o Judiciário e nem o Executivo podem fazer nada contra os parlamentares sem a anuência do Congresso.
A imunidade parlamentar, finalmente, é um direito herdado da Revolução Francesa e reafirmado no Brasil durante a vitória da classe trabalhadora contra a Ditadura Militar (1964-1985). Trata-se, finalmente, de uma conquista democrática vergonhosamente desprezada pela esquerda pequeno-burguesa, que se expressa por Fonseca e se mostra incapaz de medir as consequências do que defende.
Há, também, outro erro crasso do jornalista e da esquerda pequeno-burguesa: não avaliar corretamente a desmoralização da burocracia judicial junto à população. Termina, com isso, não apenas se tornando um apoio decisivo para o cada vez mais ditatorial regime imperialista, mas para um órgão decisivo para o exercício dessa ditadura, no Brasil e no mundo.
Foi por meio da justiça que o imperialismo expulsou Correa do Equador, tirou Morales da presidência boliviana e Cristina Kirchner da presidência argentina. Também no Brasil, o STF foi o grande protagonista do golpe que derrubou Dilma Rousseff em 2016 e dois anos depois, impediu o presidente Lula de disputar as eleições, que seriam ganhas pelo líder petista, mesmo impossibilitado de fazer campanha por se encontrar preso.
Se realmente estivesse com a cabeça no lugar, Fonseca jamais defenderia os principais responsáveis pela eleição de Jair Bolsonaro, seus criadores que hoje o perseguem, mas nem por acaso se tornaram democráticos ou algo que o valha. Assim como a Noite das Facas Longas não tornou a ditadura nazista mais humana por se livrar do seu setor mais problemático, a perseguição aberta ao bolsonarismo não atende a propósitos democráticos do Supremo, mas a um empecilho encontrado pelo imperialismo para conseguir arrancar o couro da população com a dureza requerida pela crise mundial.
Fonseca e os esquerdistas que apoiam tal loucura não estão se livrando de um problema, mas criando um monstro. Os trabalhadores e estudantes devem rejeitar orientações suicidas como a de que o STF é a democracia que deve ser defendida, mas ter a clareza de que a instituição é, na realidade, um partido político do imperialismo, dedicado a preservar os interesses da ditadura mundial no País, que podem ser observados na devastação econômica total da Argentina, o terror de El Salvador e a carnificina em Gaza. Isso é o que Fonseca e a esquerda defensora da “democracia” está verdadeiramente defendendo.




