Já foi dito em outra oportunidade neste Diário que a lambança que a jornalista esportiva Milly Lacombe protagonizou, ao acusar Rogério Ceni, de maneira mentirosa, leviana e ao vivo, de ter falsificado assinaturas no São Paulo, seria apresentado por ela como sendo um caso de “machismo” quando resolveram denunciá-la por calúnia. Dito e feito. Lacombe, em recente entrevista à Agência Brasil, afirmou que ela sofreu um “cancelamento” em razão da mentira que ela contou ao vivo, e relatou os “desafios de ser mulher no universo do futebol”. Atribuindo a todas as mulheres a conduta desonesta dela.
Sobre o “erro”, ela disse que “uma mulher, quando erra, não erra sozinha, mas sim pelo gênero. Então, eu não errei sozinha. Foi como se pudessem, finalmente, justificar a ideia de que não podemos gostar de futebol”. Obviamente ela mentiu sozinha. Não foram todas as mulheres mentirosas, somente ela acusou Rogério Ceni – sem provas – de falsificar assinaturas no São Paulo. A conduta de Lacombe não revelou nada sobre as mulheres, mas sobre a imprensa de que ela faz parte, onde a verdade é um detalhe.
Para sair por cima, falou que “é claro que houve uma reação ao meu erro, mas o erro original é meu. Se eu não me apropriar dele, não vou para lugar nenhum, entendeu?”. Ou seja, tem que se “apropriar” do “erro”. Não faltava mais nada.
Mas, de fato, a maior polêmica dita pela redatora da Folha de S. Paulo, um dos jornais que apoiou o golpe de 2016 (talvez um erro “apropriado” pelo jornal) é que “o futebol será o último espaço onde o machismo deixará de existir. É um meio muito concentrado e poderoso. Um reduto da misoginia”.
Ou seja, o futebol brasileiro é o meio mais “machista” de todo o globo terrestre na visão de Lacombe. Assim, se o “machismo” tem que acabar, ele precisa acabar primeiro no futebol. O que revela qual é o papel do identitarismo neste e em outros esportes.
O objetivo da campanha de Lacombe (muito bem paga, por sinal) é atacar o futebol brasileiro, que é um patrimônio do povo, e símbolo do orgulho nacional. Para os identitários, todos os símbolos de orgulho nacional, ou seja, da classe trabalhadora nacional, devem ser destruídos, e a política identitária cumpre este objetivo.
Curioso o fato de que o futebol e o samba brasileiros andam lado a lado desde sempre, paixões da classe trabalhadora, mas Lacombe não se atreveria a dizer que o samba brasileiro é o meio mais “machista” de todo o planeta terra, até porque não é.
Também não poderia falar que o futebol brasileiro é racista, pois a maioria dos craques e jogadores são negros. O que, por conclusão da ideia de Lacombe, deveria revelar que o negro é machista. Finalmente, a política identitária é a tentativa de jogar uns setores sociais oprimidos contra outros.
Mas o futebol é “machista”? Bom, se a ideia de Lacombe é ter times masculinos com mulheres, isso não vai acontecer, de fato, muito embora estejam tentando. Se a ideia é ter o mesmo investimento financeiro no futebol masculino que no feminino, também não vai acontecer. O esporte, o futebol, é historicamente masculino, tendo as mulheres começado a jogar e se profissionalizar muito recentemente. E isso não é culpa do “futebol” em si, mas de fatores sociais, do desenvolvimento do capitalismo, que relegou mulheres para poucas atividades esportivas e para várias tarefas domésticas.
Como resultado desse processo, a mulher não só não se desenvolveu no futebol, mas também em várias outras áreas da atividade humana. Não haverá uma pessoa em sã consciência para dizer que o futebol feminino é bonito de se ver, o que não se pode dizer, por exemplo, do vôlei, onde aspectos típicos do futebol, como velocidade, habilidade, corrida e explosão muscular, são menos exigidos.
A esquerda identitária deixou de lado as reivindicações tradicionais das mulheres, como creches públicas, salário igual para trabalho igual, direito ao armamento, direito ao aborto sempre que a mulher o desejar, pleno emprego, etc. Essas questões, o identitarismo não se preocupa, pois para a classe média não é mais problema, estes são problemas da classe trabalhadora.
O que Milly Lacombe não quer dizer abertamente é que ela e um punhado de jornalistas contratados da imprensa burguesa, bem como uma esquerda classe média, são contra os hábitos da classe trabalhadora, sua cultura, sua política. Odiar o futebol brasileiro e atacá-lo sempre que possível é um problema de classe, e Lacombe somente exprime a posição da classe dela com relação ao esporte do oprimido, o futebol.





