O artigo A batalha invisível de 2026: PF, Congresso e o dinheiro que move a guerra híbrida, de Reynaldo José Aragon Gonçalves, publicado no portal Brasil 247 nesta quarta-feira (3), demonstra que esquerda pequeno-burguesa, definitivamente, se afastou da realidade. Ninguém poderia supor que, um dia, no Brasil, a Polícia Federal e o Judiciário seriam tietados justamente por seus perseguidos.
Já no primeiro parágrafo o leitor se depara com o seguinte: “enquanto o Congresso encena uma rebelião e tenta transformar tensões institucionais em espetáculo político, a verdadeira guerra ocorre fora do alcance das câmeras. A PF atingiu, pela primeira vez, os fluxos bilionários que conectam facções, operadores de mercado, intermediários do poder e interesses estrangeiros. É essa ruptura — e não a disputa visível — que move a batalha híbrida que decidirá quem controla o Brasil em 2026”.
O brasileiro terá que acreditar que Polícia Federal está não apenas combatendo o crime, como teria atingido os “fluxos bilionários”. É possível, mas não conectam as principais facções, que retiram R$ 7 bilhões todos os dias do orçamento público para o pagamento de juros de uma dívida que está para lá de paga, mas que nunca permitem que seja auditada.
Aragon comemora que, enquanto concluía seu artigo, “a Polícia Federal prendeu Rodrigo Bacellar, presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. O fato não é um detalhe lateral, mas a confirmação em tempo real do movimento que descrevo nas próximas páginas. A PF está avançando sobre figuras centrais do tabuleiro político, rompendo a fronteira que historicamente separou o crime econômico das estruturas de poder institucional”.
É fato, a PF está avançando sobre figuras que foram eleitas. Já não bastava o STF, agora temos uma polícia interferindo diretamente sobre quem vai, ou não, participar das próximas eleições. Sem entrarmos no mérito do que teria ocorrido, fica claro que a burguesia iniciou uma verdadeira guerra para as próximas presidenciais.
O jornalista se equivoca quando diz que o sistema político “está, pela primeira vez, sendo obrigado a enfrentar seu próprio subterrâneo financeiro e político”. Aragon se esquece que a ação da PF também é política.
Para Reynaldo Aragon, inexplicavelmente, “a crise que tomou Brasília em novembro e dezembro de 2025 não nasceu da indicação de Jorge Messias ao STF, nem da disputa entre Senado e Planalto, nem da sucessão de pautas-bomba que paralisou o Congresso. Esses elementos existem, produzem ruído e mobilizam manchetes, mas funcionam como narrativa de superfície”. – grifo nosso.
O governo não consegue indicar um ministro para o Supremo, há uma paralisação no Congresso, e isso é superficial? Como se não bastasse, o jornalista alega que o fundo da crise seria o fato de que, “pela primeira vez na história recente, o governo federal decidiu enfrentar o coração financeiro do crime organizado, e o Congresso reagiu como se sua própria sobrevivência estivesse em jogo”.
Reynaldo Aragon está sustentando que o governo Lula encabeçaria uma guerra contra o crime. E, pior, estaria ele, e não a CIA e o Mossad dando ordens para a PF.
A polícia que investigou Dilma Rousseff ainda no cargo; que fez o que fez no Mensalão, na Lava-jato; que ameaçou Lula… essa polícia resolveu ser leal. Qual é exatamente o fato novo, o ponto de virada? De onde vem a tal “mudança de paradigma”?
Investigações contra determinados “estruturas bilionárias” servem exatamente a quê? Essas “estruturas” podem, por exemplo, estar atrapalhando estruturas e interesses muito maiores. A burguesia talvez esteja fechando o cerco para as próximas eleições controlando os caminhos por onde flui o dinheiro para as campanhas. É uma hipótese. Quem sabe exatamente o que está acontecendo?
O fantasioso combate ao crime organizado é, ao mesmo tempo, parte de um esforço do imperialismo para impor uma repressão cada vez maior em todo o continente, visto que precisa manter a casa em ordem para poder partir para cima da China e da Rússia.
Em um determinado momento, Aragon escreve que “A crise é, na verdade, a primeira etapa de uma disputa muito maior que se estenderá até 2026 e que definirá se o Estado brasileiro continuará vulnerável a interesses paralelos ou se recuperará o controle sobre o dinheiro que molda seu destino”.
Do que esse jornalista está falando? Por acaso o governo está retomando o controle do Banco Central? Estará prestes a colocar Galípolo na cadeia para então, finalmente, baixar as taxas de juros e retomar os investimentos? Não. Portanto, o governo está mais vulnerável do que nunca, não consegue sequer ditar sua política econômica e fiscal.
Segundo o jornalista, “o governo Lula sabia que 2026 seria o ano em que a guerra híbrida atingiria seu grau máximo no Brasil. As eleições ocorrerão sob a convergência inédita de desinformação avançada”. Sim, e a desinformação virá principalmente, como de praxe, da grande imprensa, e não das redes sociais, como pretende o jornalista.
Seguindo em seu texto, Aragon diz que “diante desse cenário, o Planalto tomou a decisão que moldaria toda a crise atual: abandonar a postura defensiva e acionar o Estado em modo ofensivo”. Nada mais longe da realidade. O governo está na mais completa defensiva, está sendo engolido pela crise e ainda falta um ano para as eleições.
É muita imaginação
Como se estivesse escrevendo um desses romances ou roteiro de filme, Reynaldo Aragon escreve que “a virada não ocorreu por impulso, mas por cálculo. Após dois anos medindo o comportamento das elites políticas, observando a reorganização da extrema direita global e analisando a evolução das operações do crime organizado, Lula e sua equipe concluíram que não haveria estabilidade possível sem atingir diretamente a fonte do poder paralelo que influencia o país há décadas”.
Como se não bastasse, o articulista diz ainda que “foi nesse ponto que o Ministério da Justiça e a Polícia Federal receberam sinal verde para operar com profundidade inédita”.
O texto é recheado de “estratégia clara”, “guerra híbrida”, “tabuleiro político” etc. Quem lê pode ficar com a impressão de que o governo Lula, não imperialismo, que está dando as cartas.
Páginas policiais
Reynaldo Aragon produz um texto policial, mais um da imprensa de esquerda, com a diferença de que é mais criativo. No entanto, o resumo da ópera é o seguinte: política se resolve com polícia. Um erro grave que norteia a maioria da esquerda.
Como Bolsonaro foi preso, os “esquerdistas” estão atrás de um novo inimigo. Desta vez são o crime organizado e esquemas obscuros de lavagem de dinheiro. O que essa gente não enxerga são as mãos que estão manipulando os fios que movimentam as marionetes do STF e da PF.
Está sendo dado um novo golpe. Ou melhor, estamos vivendo uma nova fase do golpe iniciado em 2016. As mesmas forças que tiraram Lula do caminho e elegeram Bolsonaro se movem para tirar ambos do caminho. O intuito é colocar Tarcísio, ou algo pior, no Palácio do Planalto. E o plano está a todo vapor.
A única chance de Lula é se voltar para a classe trabalhadora. Se ficar dependendo da PF e do Judiciário, sua reeleição corre sério risco de fazer água.




