Palestina

“Ato épico histórico”: cessar-fogo em Gaza entra em vigor

Celebrações em Gaza, dezenas de prisioneiros soltos, governo israelense em apuros. Veja como foi o primeiro dia do acordo entre a resistência palestina e a ocupação sionista.

“Ato épico histórico”. Essas foram as palavras utilizadas pelo porta-voz para assuntos militares das brigadas al-Qassam, Abu Obeida, para caracterizar o esforço sobre-humano realizado pelos residentes de Gaza ao longo desses 15 meses de devastação sionista. Em comunicado emitido horas após a entrada em vigor do acordo, Obeida declarou que esta etapa será para sempre um marco na história do povo palestino.

Até o fechamento desta edição, três reféns capturadas no dia da Operação Dilúvio de al-Aqsa, 7 de outubro de 2023, foram entregues no centro da Cidade de Gaza aos negociadores sionistas. Em troca, 90 reféns palestinos, dentre os milhares detidos pelo aparato repressivo de “Israel”, serão soltos: 76 deles serão transferidos para a Cisjordânia, enquanto 14 irão para Jerusalém Ocidental, segundo o jornal israelense Haaretz.

A crueldade fascista do sionismo foi mantida até os últimos minutos do início do cessar-fogo. Agendado para ter início às 8:30 de domingo (19), foi adiado para 11:15, período durante o qual as forças de ocupação continuaram atacando Gaza e mataram 19 pessoas, deixando outras 36 feridas. As vítimas se somam às centenas de mortos dos dois dias anteriores, que sofreram com os bombardeios mesmo após a confirmação do acordo de cessar-fogo por ambas as partes. Tanto o atraso como os ataques foram atribuídos à demora do Hamas em entregar a lista de reféns que seriam inicialmente libertas, o que aparenta ser mais uma acusação falsa dos bandidos sionistas.

Ainda segundo declaração de Abu Obeida, dos 94 reféns ainda em custódia da resistência, 35 foram mortos pelos ataques indiscriminados das forças de ocupação. Segundo os termos estipulados para essa primeira fase do acordo de cessar-fogo, 33 reféns serão libertos, 25 dos quais estariam vivos. Do lado palestino, 1.700 prisioneiros serão libertos, 200 dos quais estariam condenados a passar o resto de suas vidas nas câmaras de tortura sionistas.

Celebração da vitória

O clima em Gaza é de festividades. Nem mesmo os ataques na manhã de domingo foram suficientes para coibir a soltura de fogos de artifício em Deir al-Balah, na região central da faixa. Multidões de palestinos receberam com muita euforia os heróis da resistência que celebraram com a população essa vitória tão custosa, mas igualmente necessária. “Não houve mais bombas, nem caças, nem drones. O único som de tiros que ouvimos é das celebrações nas ruas — tiros e fogos de artifício têm sido frequentes”, disse Hani Mahmoud, repórter da Al Jazeera no local. Em requinte de crueldade típico do sionismo, celebrações foram proibidas nos territórios controlados por “Israel”.

O cessar-fogo trouxe esperança para muitos feridos e doentes atendidos da forma que foi possível nos escombros dos hospitais com equipamentos improvisados. Com a reabertura da fronteira entre Palestina e Egito em Rafá, milhares de palestinos poderão ter acesso ao tratamento adequado. “O diagnóstico de Hanaa’ pareceu uma sentença de morte para nossa família”, disse Abeer al-Awady sobre sua filha Hanaa à reportagem de Al Jazeera. “Mas ver sua condição piorar diariamente, sem nada que nós ou qualquer um em Gaza possa oferecer, é outro nível de tormento”, concluiu enquanto aguardava ansiosamente o início do cessar-fogo.

Fotos de crianças em meio aos combatentes da Resistência encheram as redes sociais, assim como celebrações no Iêmen, país que, através do governo revolucionário do Ansar Alá, ofereceu ajuda decisiva aos palestinos com a decisão de fechar o Mar Vermelho para navios com destino a “Israel”. Feito que se soma aos sucessivos ataques diretos realizados contra a ocupação sionista.

“Uma saudação especial aos nossos irmãos do Iêmen, do Ansar Alá e aos nossos camaradas e irmãos em armas do Hesbolá que pagaram um alto preço em nossa batalha. Saudamos nossos irmãos no Irã por seu apoio e envolvimento constantes e contínuos nesta batalha histórica. Saudamos a resistência iraquiana livre e os combatentes da resistência jordaniana que participaram da batalha”, declarou Obeida em sua declaração sobre o cessar-fogo, nomeando todas as forças que contribuíram diretamente para esse dia vitorioso.

Crise em “Israel”

Do outro lado do conflito, o acordo foi quase que unanimemente considerado uma derrota. A começar pela coalizão governista, formalmente dissolvida. Três ministros, entre eles o ministro do Interior, Itamar Ben Gvir, líder do partido sionista religioso Otzma Yehudit, entregaram suas cartas de resignação ao primeiro-ministro Benjamin Netaniahu. Segundo a imprensa israelense, o partido emitiu uma declaração confirmando que não fazia mais parte da coalizão que compunha o governo com o Likud de Netaniahu.

Em suas considerações, realizadas logo após a entrada em vigor do acordo, Ben Gvir criticou o cessar-fogo como uma “rendição ao terror” que “cruzava todas as linhas vermelhas ideológicas”.

“Não retornaremos à mesa do governo sem uma vitória completa contra o Hamas e a plena realização dos objetivos da guerra”, enfatizou o então ex-ministro, colocando em evidência a derrota de “Israel”, que entra no cessar-fogo sem ter atingido nenhum de seus objetivos de guerra declarados. “O acordo envolve a libertação de centenas de assassinos, o retorno de centenas de milhares de moradores de Gaza ao setor norte, incluindo milhares de terroristas, a retirada da Rota Filadélfia e um cessar-fogo”, concluiu.

Ben Gvir não está isolado em seu posicionamento. O ex-general israelense Giora Eiland, em entrevista à emissora local Channel 7 afirmou que o Hamas foi vitorioso. “O Hamas se recuperará do duro golpe que sofreu, nem todos os reféns retornarão e Israel não eliminará a autoridade do Hamas”, concluiu.

Manifestantes sionistas foram às ruas de Tel Aviv protestar contra o acordo. Segundo um manifestante entrevistado pela imprensa israelense, o cessar-fogo “libertará centenas de detidos palestinos, apagará as conquistas da guerra e abrirá caminho para outro ataque semelhante ao de 7 de outubro”.

O acordo também terminou por acabar com a legitimidade do fantoche sionista Mahmoud Abbas, líder da Autoridade Palestina, que, ao contrário do Hamas, não tem nenhuma autoridade entre os palestinos. Isso é evidenciado pela falta de cobertura da declaração hipócrita da entidade sobre o acordo: “uma rendição desprovida de quaisquer elementos que pudessem servir de base para um processo de paz.”

Até mesmo a aliança do sionismo com o imperialismo parece passar por uma reconfiguração com a viagem de Steven Witkoff, enviado de Trump para o Oriente Médio, para “Israel”. Witkoff é tido como o principal responsável por impor o acordo a Netaniahu demonstrando que Trump quer começar seu mandato, que se inicia hoje (20), ao menos esfriando os conflitos iniciados pela administração anterior. A mesma tendência se mostra na questão ucraniana.

Primeira derrota

A primeira fase do cessar-fogo durará seis semanas. Trata essencialmente da troca de reféns e do envio de ajuda humanitária às dezenas de milhares de feridos e doentes em Gaza, sem contar com o envio das pessoas em situações mais graves para outros países onde passam ter atendimento adequado. O futuro de Netaniahu e seu governo é incerto com a coalizão desfeita e sua recomposição divida entre o apoio de Ben Gvir e de Trump.

Os governos do Catar e do Egito se mostraram dispostos a dificultar a retomada da guerra com projetos com previsão de início imediato para a reconstrução de Gaza. O povo palestino não poderia estar mais satisfeito — e aliviado — com o resultado. “Israel” perdeu sua primeira guerra desde sua fundação, seu governo está em crise e a própria sociedade israelense, que sustenta o projeto sionista, está em decomposição. Netaniahu não agrada os que querem eliminar a resistência, nem os que querem um cessar-fogo com seu governo autoritário e notoriamente corrupto. Ainda é cedo para anunciar o fim do sionismo, mas é cada vez mais evidente que a Operação Dilúvio de al-Aqsa foi um golpe fatal.

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