O ano de 2024 trouxe à tona uma realidade que muitos analistas tentam esconder: o imperialismo, em sua crise mais profunda desde a Segunda Grande Guerra (1939-1945), segue se deslocando para a extrema direita. Enquanto a imprensa tradicional celebra supostas “guinadas à esquerda” em alguns países, os fatos demonstram que, na maioria das nações, há um movimento acelerado de fortalecimento das forças reacionárias, mascarado por coalizões ou lideranças de fachada.
No cenário europeu, a França e o Reino Unido são exemplos emblemáticos de como a esquerda tem sido usada como trampolim para a reação se manter em pé. Na França, a Nova Frente Popular (NFP) – coalizão de esquerda liderada pelo partido França Insubmissa (FI) e defuntos políticos como o Partido Socialista (PS) -, conseguiu, de fato, impedir que a extrema direita de Marine Le Pen (líder do Reagrupamento Nacional) assumisse o governo nas eleições parlamentares antecipadas, realizadas em julho. A vitória, porém, foi efêmera.
Emmanuel Macron, representando o bloco centrista, manipulou acordos e após afastar o RN do poder, escanteou o FI, que, mesmo sendo o partido líder do bloco vencedor, foi tratado como lixo na formação do governo. O resultado foi a continuidade do domínio da direita, com a extrema direita apostando na desmoralização do governo macronista e com isso, a oportunidade de assumir a dianteira, o que acabou ocorrendo com a queda do primeiro-ministro Michel Barnier, após meros três meses de governo.
No Reino Unido, a vitória do Partido Trabalhista sob a liderança de Keir Starmer também foi celebrada como uma “volta da esquerda” ao poder. No entanto, Starmer representa a completa transição do partido para uma versão britânica do Partido Democrata dos Estados Unidos: uma ferramenta do imperialismo travestida de esquerda. Desde a expulsão de Jeremy Corbyn, o Partido Trabalhista perdeu qualquer ligação com as reivindicações operárias ou mesmo de esquerda, limitando-se a adotar uma retórica demagógica e identitária enquanto defende os interesses do imperialismo.
Nos Estados Unidos, a reeleição triunfal de Donald Trump marca o retorno da extrema direita ao poder, com o líder republicano conquistando maioria dos delegados e dos votos absolutos, além da maioria parlamentar, na Casa dos Representantes (câmara baixa) e no Senado). Na Áustria, o Partido da Liberdade, de extrema direita, obteve sua primeira vitória parlamentar. Em Portugal, o crescimento do Chega! reflete o mesmo fenômeno.
Os governos dos Estados Unidos, Reino Unido e França desempenham um papel central na ascensão da extrema direita global, dado a importância desses países. São, finalmente, os principais centros de poder do regime imperialista mundial, sendo fundamentais para o deslocamento do regime global à extrema direita.
A América Latina também não escapou dessa tendência. Apesar das vitórias de candidatos apontados como de “esquerda” no Uruguai e no México, o caráter dessas lideranças não deixa dúvidas quanto ao fato de que são governos pró-imperialistas, incapazes de desafiar a ordem global. Yamandú Orsi, no Uruguai, é o exemplo mais claro. Apresentado como herdeiro político de Pepe Mujica, Orsi não é diferente de seu “mestre”, um homem tão dócil que conseguiu sobreviver ao vendaval golpista dos EUA contra a América Latina na década passada, responsável por derrubar regimes a torto e direito.
Atualmente no subcontinente, apenas dois governos podem ser considerados genuinamente de esquerda: o de Nicolás Maduro na Venezuela e o de Luiz Inácio Lula da Silva no Brasil, que enfrentam ataques constantes do imperialismo. Enquanto na Venezuela, Maduro conseguiu derrotar a mais radicalizada ofensiva golpista contra a Revolução Bolivariana desde o golpe de Estado fracassado ocorrido em 2002, no Brasil, Lula segue severamente pressionado pelo imperialismo e enfrentando uma crise que na última semana, levou um parlamentar opositor a alcançar a maior audiência já registrada na história do Instagram de um conteúdo, com críticas à política do governo petista.
A derrota do imperialismo em Gaza, por sua vez, acelera esse movimento. O fracasso militar de “Israel” e a resistência do Hesbolá e de outras forças regionais expuseram a fragilidade do aparato bélico imperialista. Incapazes de impor sua agenda por meio da força, os regimes imperialistas recorrem a governos de extrema direita e lideranças populistas autoritárias para conter as revoltas internas e a perda de influência global.
Diante desse cenário, é evidente que o regime político mundial se desloca cada vez mais à extrema direita. Essa guinada reflete não apenas a crise estrutural do imperialismo, mas também a incapacidade da esquerda institucional de apresentar uma alternativa viável. Ao se renderem às armadilhas do identitarismo e aos acordos de bastidores com a direita, as lideranças ditas progressistas acabam servindo como trampolim para os reacionários.
O avanço da extrema direita não é um reflexo de outra coisa, mas da crise sem precedentes do sistema imperialista. A única saída para os trabalhadores do mundo é organizar uma luta internacional independente, preparada para o período de grandes conflitos que se descortina, contra esse regime de exploração e opressão decadente, rejeitando as ilusões conciliatórias, que nada serão além de truques para esmagar com a máxima violência o proletariado mundial.