Polêmica

E daí que existe liberdade de expressão, diz defensor da censura

Colunista da Folha acredita que a liberdade de expressão deveria ficar em suspenso quando se trata de Bolsonaro

No dia 6de agosto, foi publicada uma coluna de autoria de Thiago Amparo na Folha de São Paulo, intitulada “E daí que Bolsonaro tem liberdade de expressão?”, na qual o autor defende que, apesar de Bolsonaro ter direito à liberdade de expressão, não teria direito a se defender das acusações do STF.

Seu texto começa com:

É fácil defender em abstrato que Jair Bolsonaro tem direito à liberdade de expressão, como qualquer outro possui (ou deveria possuir) no Brasil.

Visto como o Brasil caminha a passos largos para acabar com o direito à liberdade de expressão, não parece tão fácil assim defender que Bolsonaro tenha esse direito.

Além disso, espera-se que a justiça acredite que todos os cidadãos têm direitos “em abstrato”, já que isso significa que os juízes não se guiariam por questões políticas, pessoais ou ideológicas, mas sim, julgariam tudo com base apenas no que diz a lei. Ou seja, um direito “em abstrato” se opõe a um direito que necessita da aprovação ideológica que vai julgar para existir.

Continuando o texto, Thiago explica melhor o que tentou dizer:

Bolsonaro não tem direito à expressão se e na medida em que a expressão em si é uma das ilicitudes pela qual está sendo acusado.

Mas qual seria essa ilicitude do que Bolsonaro disse até agora? Caso o autor esteja se referindo à suposta ordem de golpe de Estado, o crime não estaria na expressão e sim no ato de participar de um golpe de Estado.

No entanto, se a ilicitude estiver no fato de que Bolsonaro desobedeceu as ordens de Alexandre de Moraes e fez uso de seu direito de liberdade de expressão, então não há ilicitude alguma, pois não há crime em falar o que pensa, mesmo quando um juiz, contrariando a Constituição e as leis do país, determina que o réu não tenha esse direito.

Já, se o crime está no fato de Bolsonaro se defender das acusações, o que propõe o colunista da Folha seria o mesmo do que ocorria na época da Inquisição, em que não cabia defesa pois a decisão da igreja era tida como ordem divina.

Na sequência, o autor do texto faz algumas comparações que evidenciam sua incapacidade de diferenciar um ato de uma fala:

Bolsonaro ter a liberdade de expressar, por si ou por terceiros, ordens de coação e obstrução de Justiça é o mesmo que dizer que um estelionatário tem a liberdade de postar um link falso para vender coisa que não seja sua.

Se ele desse a ordem para um crime, teria que ser julgado pelo crime, não pelo ato de falar. Um estelionatário postando um link falso comete crime de estelionato, não de falar e, ainda assim, teria o direito tanto de se defender da acusação, mesmo quando é evidente que cometeu o crime, como teria o direito de dizer que o que fez não deveria ser crime no Brasil.

Um namorado acusado de crime de agressão possui a liberdade de expressar em rede social a vontade de matar sua companheira?

Sim, um namorado acusado de qualquer crime que seja tem o direito de dizer qualquer absurdo que deseja nas redes sociais, mesmo que isso seja sua suposta vontade de matar sua companheira, segundo as leis do Brasil. O que poderia acontecer, como bem explica Rui Costa Pimenta na Análise Política do dia nove de agosto, é que, ao comentar que deseja assassinar a companheira nas redes sociais, caso ela apareça morta, o namorado será considerado o principal suspeito.

Um funcionário acusado de crime de racismo possui a liberdade de expressar pelo WhatsApp que seu colega de trabalho parece um escravo?

Sim, em princípio. Em uma democracia real, na qual se preserva o direito de liberdade de expressão, um funcionário acusado de qualquer crime que fosse, teria o direito de dizer qualquer coisa que quisesse, por mais medonha e abominável que fosse sua opinião.

Uma vizinha acusada de crime de perseguição possui a liberdade de expressar sua obsessão pela moradora ao lado monitorando as redes sociais desta e enviando-lhe mensagens incessantemente?

Mais uma grande confusão do autor. Desde quando monitorar as redes sociais de alguém é um ato de liberdade de expressão? Liberdade de expressão tem a ver com o ato de falar, escrever, gravar um vídeo, fazer uma pintura, mas não de monitorar alguma coisa.

Ainda assim, monitorar redes sociais não é crime, assim como enviar mensagens incessantemente. Casos assim, inclusive, raramente aparecem na justiça, já que basta que a pessoa que se sente perseguida bloqueie quem a monitora.

Ainda assim, a perseguição por parte de uma vizinha ou de qualquer outra pessoa, não tem a ver com o assunto que estava sendo tratado, que é o da liberdade de expressão.

O texto continua:

O namorado abusivo, o funcionário racista e a vizinha obsessiva, todos, possuem liberdade de expressão, mas não possuem a liberdade de, por meio da expressão, perpetuar o ilícito sobre o qual estão sendo acusados, sob pena de frustrar a própria eficácia da persecução penal.

Mas o que seria “perpetuar o ilícito” através da expressão e como Bolsonaro estaria fazendo isso? Repare o leitor que, dos exemplos que Thiago apresentou anteriormente no texto, nenhum deles mostra o que seria essa “perpetuação do ilícito”.

Mesmo que haja um crime, qualquer pessoa tem o direito de comentar sobre o assunto e de se defender das acusações se for de sua vontade. Negar esse direito é negar o próprio direito de defesa, já que segundo a visão de pessoas como o autor da matéria, tentar se defender em público seria “perpetuar o ilícito”.

Continuando o texto de Thiago, ele cita o caso da censura à entrevista de Lula em 2018, dizendo que não se trata de caso semelhante. No entanto, não diz o que seria diferente no caso de Bolsonaro:

Bolsonaro não possui a liberdade de forçar goela abaixo no STF a sua própria absolvição. Comparar o caso de Bolsonaro ao da censura condenável à entrevista de Lula em 2018 é comparar maçãs com laranjas.

Fora isso, o que seria “forçar goela abaixo no STF a sua própria absolvição”? Por acaso Bolsonaro tentou assassinar algum dos ministros do STF, jogou alguma bomba no prédio, atirou contra alguém, sequestrou alguém ou fez uso da força de qualquer maneira que seja para ser absolvido? Não, apenas falou.

A opinião de Thiago, infelizmente, é a mesma de uma parcela grande da esquerda brasileira, que se esqueceu que poucos anos atrás a justiça brasileira havia feito o mesmo com Lula, o que impediu sua candidatura em 2018 e permitiu que justamente Bolsonaro fosse eleito naquele ano.

Sendo assim, essa parcela da esquerda demonstra que não está disposta a lutar pelos direitos da população brasileira, mas sim, de lutar por benefícios próprios, mesmo que por meio do sacrifício desses direitos.

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