Os governos da Argentina e do Paraguai anunciaram nos últimos dias que pretendem classificar o Comando Vermelho (CV) e o Primeiro Comando da Capital (PCC) como organizações “terroristas”. A medida foi celebrada por parlamentares e setores da extrema direita dos dois países — e também no Brasil — e está sendo utilizada como pretexto para expandir a repressão interna e justificar o fortalecimento de verdadeiras ditaduras impostas pelo imperialismo norte-americano.
Na última sexta-feira (31), o ministro da Defesa do Paraguai, Óscar González, declarou à rádio ABC Color que a nova classificação daria “respaldo jurídico” às Forças Armadas para atuar diretamente contra essas organizações, especialmente na região de fronteira com o Brasil. O presidente paraguaio Santiago Peña confirmou que pretende levar a medida adiante.
A decisão vem na esteira de uma iniciativa semelhante da ministra da Segurança da Argentina, Patricia Bullrich — uma das principais conselheiras do presidente Javier Milei — que afirmou que reforçará a presença militar na fronteira após a megaoperação policial no Rio de Janeiro que deixou ao menos 121 mortos. Bullrich chegou a chamar as organizações brasileiras de “narcoterroristas”, importando diretamente o jargão utilizado pelo governo norte-americano contra a Venezuela.
A classificação de grupos internos como “terroristas” tem sido usada sistematicamente pelo imperialismo norte-americano para justificar sanções, intervenções e até ações militares contra países que resistem à sua dominação. Enquanto o Movimento de Resistência Islâmica (Hamas) é combatido pela propaganda sionista e imperialista sob a acusação de “terrorismo”, governos como o da Venezuela e da Colômbia são acusados de comandar cartéis de drogas.
As acusações são, além de caluniosas, cínicas. É notório que a Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos (CIA, na sigla em inglês) comandava operações de tráfico no Afeganistão durante a ocupação do país. Além disso, enquanto o Hamas luta pela libertação de seu povo, o imperialismo e o sionismo realizam operações de terror contra a população civil, como no caso da detonação de bipes no Líbano.
Entre os partidos que lutam contra o imperialismo, um dos mais caluniados sob a acusação de “narcoterrorismo” é o Hesbolá, partido da maioria da população libanesa. O grupo é constantemente acusado, sem provas, de ter relações com o chamado crime organizado na América Latina.
Javier Milei classificou recentemente como “terrorista” o Cartel de Los Soles, da Venezuela — acusando o presidente Nicolás Maduro de liderá-lo —, e agora aplica o mesmo rótulo às organizações brasileiras.
No Brasil, a extrema direita também tenta avançar com essa política. Um projeto na Câmara propõe que organizações que exerçam “domínio territorial” sejam enquadradas como terroristas — o que inclui o CV e o PCC, mas abre brecha para que qualquer movimento que controle territórios seja alvo da repressão estatal.
O texto tem como relator o deputado licenciado Guilherme Derrite (PP-SP), atual secretário de Segurança Pública de Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo, chefe de um efetivo de policiais militares maior que o Exército da Argentina e pré-candidato à presidência da República. O projeto pretende utilizar a Lei Antiterrorismo de 2016, que prevê penas superiores às da legislação antidrogas — podendo chegar a 30 anos de prisão — e permite a punição até de “atos preparatórios”, mesmo sem crime consumado.
O brasileiro Lucas Passos Lima cumpre 16 anos de prisão após ter sido condenado por tais “atos preparatórios”. Passos foi preso preventivamente e julgado por ter feito pesquisas na Internet e viajado ao Líbano, o que já foi suficiente para que as autoridades o acusassem de estar planejando um “atentado terrorista”.
Enquanto isso, bolsonaristas como Flávio Bolsonaro (PL-RJ) criticam a resistência do governo Lula e pedem alinhamento com Paraguai e Argentina. O advogado norte-americano Martin de Luca, ligado à campanha de Trump e próximo a Bolsonaro, afirmou que os Estados Unidos já propuseram ao Brasil uma “parceria” para classificar o CV e o PCC como grupos terroristas, o que permitiria “liberar as ferramentas de contraterrorismo” do governo norte-americano para atuar na região.
O avanço da proposta de enquadramento das organizações como terroristas é parte de uma política geral de endurecimento do regime político na América Latina, liderada por governos direitistas, como os de Milei (Argentina), Peña (Paraguai), Daniel Noboa (Equador) e Nayib Bukele (El Salvador), com apoio direto dos Estados Unidos.





