No sábado (26), Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal, proferiu decisão proibindo que haja qualquer acampamento no raio de 1 km da Praça dos Três Poderes, da Esplanada dos Ministérios e de quartéis das Forças Armadas, em Brasília.
A decisão foi proferida um dia depois de Moraes ter determinado que o deputado bolsonarista Hélio Lopes (PL-RJ) saísse da Praça dos Três Poderes: ele estava acampado lá em protesto contra o julgamento farsa do suposto golpe de Estado, que tem como réu o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros.
Como é regra por parte de Alexandre de Moraes, a decisão viola a Constituição Federal e as leis brasileiras, já que acampamentos em frente a órgãos públicos não são proibidos. Moraes disse que o objetivo da proibição é “garantir a segurança pública e evitar novos eventos criminosos semelhantes aos atos golpistas ocorridos em 8/1/2023”.
Ou seja, é uma decisão proibindo manifestações públicas em frente a prédios públicos. Se a manifestação assume a forma de pessoas que decidem acampar em frente a prédios públicos, continua sendo uma manifestação. Mesmo porque, as leis brasileiras não determinam nenhum prazo de duração para as manifestações: elas não tem prazo para acabar.
E se estão proibidas manifestações em frente a prédios públicos, o próprio direito de manifestação está proibido, afinal, ele existe para protesta contra o poder público, conforme apontado por Rui Costa Pimenta, presidente do Partido da Causa Operária (PCO), na última edição do programa Análise de Terça:
“Manifestação em frente à sede dos poderes é a típica manifestação protestando contra o poder público; o direito de manifestação é protestar contra o poder público”, disse Rui Pimenta.
O presidente do PCO também denunciou que essa nova decisão de Alexandre de Moraes mostra que não há lei no Brasil, inclusive questionando se havia essa proibição na época da ditadura militar. “É um absurdo”, frisou o dirigente, acrescentando que “a pessoa tem todo o direito de se manifestar pacificamente. Inclusive a Constituição Federal não exige autorização para se manifestar. É um direito que não tem exceções na Constituição Federal”. O direito de reunião (manifestação) está no inciso XVI do art. 5º da CF:
XVI – todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;
“Você vive em um país onde você não pode se manifestar. O que a gente poderia dizer dessa situação? É uma ditadura”, destacou Rui Pimenta.
Durante o programa, também foi destacado outro aspecto da arbitrariedade das decisões do Supremo Tribunal Federal: além de violar a CF e as leis brasileiras, o tribunal sequer respeita as próprias decisões.
Em 2007, o STF proferiu decisão no âmbito da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.969-4, defendendo o direito de manifestações na Praça dos Três Poderes. Essa ADI foi movida contra o Decreto nº 20.098/1999 do governo do Distrito Federal, decreto este que proibia manifestações com carros ou aparelhos de som no local. Curiosamente, a ADI foi movida à época pelo Partido dos Trabalhadores.
O relator da ação era Ricardo Lewandowski, ex-ministro do STF. Em seu voto, ele afirmou que “Proibir a utilização ‘de carros, aparelhos e objetos sonoros’ […] inviabilizaria por completo a livre expressão do pensamento nas reuniões levadas a efeito nesses locais, porque as tornaria emudecidas, sem qualquer eficácia para os propósitos pretendidos”. Ele também afirmou que a Praça dos Três Poderes é um “verdadeiro símbolo de liberdade e cidadania do povo brasileiro”.
Além disto, em documento destinado às Comissão de Veneza, um órgão consultivo do Conselho da Europa que trata de questões relacionadas à democracia, ao Estado de direito e aos direitos humanos, do qual o STF é membro de 2008, a Suprema Corte se posicionou da seguinte maneira: “partindo-se do texto constitucional, poderíamos concluir que há uma proibição geral à limitação infraconstitucional dos espaços em que se poderiam realizar manifestações públicas. A própria Carta foi incisiva ao conformar os limites espaciais expressamente, exercendo eficácia regulamentar imediata, qual seja, que o local da manifestação deve ser aberto ao público”.
No documento, o STF trata do “limite espacial para manifestações públicas a prédios oficiais”. A Suprema Corte afirma que “no quesito da limitação espacial, porém, é certo que no Brasil não há de se estabelecer proibição a manifestações em frente a órgãos político-administrativos. Afinal, é em frente a esses órgãos, quando em operação, que as manifestações públicas podem efetivamente atingir maior repercussão”.
O documento finaliza apontando que “a jurisprudência constitucional brasileira não possibilita limitações a manifestações públicas em frente a órgãos políticos dos poderes Judiciário, Executivo e Legislativo. Tais limitações são inconstitucionais, vistas as manifestações públicas como meio de realização democrática e como meio de concretização do direito de expressão”.
Em resumo, o próprio STF já reconheceu que proibir manifestações em frente a órgãos públicos é inconstitucional. Mas como o Supremo é um tribunal político, sua decisões sendo modificadas conforme a situação política, ou melhor, conforme as determinações do imperialismo, agora o tribunal, na pessoa de Moraes, proíbe manifestações de bolsonaristas na Praça dos Três Poderes. Logo mais, a proibição se estenderá para as organizações dos trabalhadores.





