No dia 5 de abril, o periódico O Poder Popular, do Partido Comunista do Brasil, publicou o editorial “Sem anistia para golpistas de ontem e de hoje!”. A primeira parte do artigo se destina a denunciar a anistia garantida aos agentes da repressão da ditadura militar, que saíram impunes após cometerem inúmeros crimes contra o povo brasileiro. Aqui, realizaremos uma discussão com base na segunda parte do texto, que se inicia com o chamado “prisão para Bolsonaro e seus cúmplices!”
O PCB denuncia então os crimes do governo de Jair Bolsonaro (PL) contra a população, como a gestão da pandemia, os supostos casos de corrupção e destacadamente a “participação ativa na tentativa de golpe de Estado que teve seu desfecho em 08/01/2023”.
Apesar de a administração da pandemia ter de fato sido criminosa, levando à morte centenas de milhares de pessoas, esta foi uma política gerida pela própria direita nacional. Exemplo disso foi o não pagamento de assistência ou prestação de auxílio à população para que pudesse de fato ficar em casa, a reabertura de escolas em momento inadequado, o bloqueio à vacina russa sem qualquer avaliação real, e a campanha pelo uso da vacina da Pfizer, gigante farmacêutica. Até aí, era a mesma política da direita tradicional, neoliberal.
É importante realizar esse esclarecimento, porque a pandemia é retirada da responsabilidade da política neoliberal, imperialista, e atribuída aos discursos antimáscaras, que não foram a real causa para as mortes na pandemia. Outros crimes extremamente graves do governo Bolsonaro, mas que não são citados pelo PCB, foram a reforma da Previdência e as privatizações de refinarias.
Isso para dizer que o ponto principal levantado pelo PCB não são “os crimes contra o povo”, mas é de fato a manifestação do 8 de janeiro de 2023. O Poder Popular afirma:
“A prisão de Bolsonaro e seus comparsas não porá fim à escalada de ataques da extrema direita e suas intenções golpistas, mas representará uma significativa derrota a esse movimento político, que não pode deixar de ser associado ao neofascismo, fenômeno mundial da crise pela qual passa o capitalismo, com seus desdobramentos nos cenários políticos mundo afora.
“A luta contra a tentativa de anistiar os golpistas e a defesa da prisão de Bolsonaro e seus comparsas fazem parte de uma disputa maior no enfrentamento à extrema direita e seu projeto reacionário, que trará retrocessos de todo tipo ao povo brasileiro, sobretudo à classe trabalhadora.”
Aqui é importante frisar que, apesar de falar em escalada de ataques, não há ataque algum ocorrendo no momento ou nos últimos anos, e nem intenções golpistas por parte da extrema direita, ao menos por ora. O próprio ato do 8 de janeiro foi pequeno, com um punhado de milhares de manifestantes, em especial considerando a escala das manifestações bolsonaristas, cujo último ato teve 45 mil pessoas e o penúltimo, 20 mil. Mais, foi uma manifestação pacífica que, pela anuência das forças repressivas, adentrou de maneira igualmente pacífica as sedes dos três poderes e, posteriormente, na mesma tarde, de maneira igualmente pacífica, se retirou das instalações.
Ao invés de denunciar a política bolsonarista propriamente, de realizar um embate, uma disputa política, setores da esquerda, como o PCB, recorrem à repressão estatal, ao Supremo Tribunal Federal (STF), instrumento imperialista, para reprimir o bolsonarismo, em clara manobra para fraudar as eleições de 2026.
Ou seja, não houve golpe de Estado. Não houve tentativa de golpe de Estado. A qualquer observador minimamente atento aos fatos daquele dia, a alegação de “golpismo” é uma farsa cujo objetivo era e ainda é desatar a perseguição política ao bolsonarismo. E é essa a política apoiada pelo PCB. Enquanto Jair Bolsonaro permanecer como um dos dois políticos mais populares do Brasil, qualquer medida tomada para impedir sua participação no pleito do ano que vem é um golpe de Estado. E a eleição, caso ocorra em tais condições, será uma fraude.
O chamado enfrentamento ao projeto reacionário da extrema direita, afirmado pelo PCB, portanto, é na realidade não um enfrentamento pela oposição a ele de um projeto próprio, mas pelo apoio ao projeto do imperialismo, do STF, que angaria poderes cada vez maiores na imposição progressiva de uma ditadura no Brasil. Ao passo em que denuncia o “projeto” bolsonarista, que “trará retrocessos de todo tipo ao povo brasileiro, sobretudo à classe trabalhadora”, o PCB ignora que a característica fundamental do Judiciário burguês, logo do Judiciário brasileiro e destacadamente de sua mais alta corte, o STF, é a repressão à classe trabalhadora, ao movimento popular.
A paralisia do movimento operário é o que hoje permite que a esquerda seja cooptada com a ilusão do STF democrático, mas vejamos: quem decreta a ilegalidade de todo tipo de greves no Brasil? O Judiciário. Quem confere ordens de despejo a ocupações perfeitamente legais sob a Constituição Federal, no campo e na cidade? O Judiciário.
Retornando à questão política, é flagrante ainda que o suposto autor do enfrentamento seja o juiz Alexandre de Moraes, um homem que, após coordenar a repressão aos estudantes secundaristas de São Paulo como secretário de Segurança, ascendeu ao STF quando o então relator da Lava Jato, Teori Zavascki, foi assassinado em condições até hoje não esclarecidas. E foi conduzido a esse cargo pelas mãos do vampiro golpista Michel Temer.
Pior, o mesmo tribunal foi diretamente envolvido no golpe de Estado de 2016, que depôs Dilma Rousseff. Mais que isso, também foi a esfera superior do Judiciário nacional a responsável por conduzir à presidência do Brasil, em 2018, Jair Bolsonaro, ao prender ilegalmente, e ilegalmente proibir de concorrer naquele pleito, o então candidato favorito, Luiz Inácio Lula da Silva.
Assim, concluindo, vemos que o PCB não possui uma política de enfrentamento à direita, e nem sequer possui uma política própria. O partido está a reboque da política imperialista para controlar o pleito do ano que vem, e para aumentar os poderes do Judiciário, que cada vez mais define quem pode ser eleito, quem pode permanecer no cargo, o que podem dizer os deputados, os jornais, os partidos. O PCB, apesar de denunciar na maior parte de seu texto a ditadura militar de 1964, utiliza a segunda metade para defender a mesma política dos ditadores, a repressão e o fechamento total do regime político no Brasil. Uma farsa que deve ser integralmente combatida.