O texto intitulado Cultivo da democracia, de Adilson Roberto Gonçalves, publicado no Brasil 247, é mais uma tentativa de encobrir a submissão da esquerda oficial ao imperialismo, apresentando como “vitórias democráticas” aquilo que, na realidade, são avanços do regime golpista contra o povo brasileiro.
Logo de início, o autor opõe “a semana da vergonha com o parlamento” ao “orgulho das marchas democráticas pelas ruas do país”. O que ele chama de marchas democráticas nada mais foram do que mobilizações manipuladas pela rede Globo, ONGs financiadas pelo imperialismo e artistas a serviço da burguesia. Ao celebrá-las, o artigo se coloca como porta-voz da imprensa golpista. Não houve aqui qualquer “resgate de nossa autonomia e democracia”, mas sim uma operação de tipo “revolução colorida”, importada diretamente do manual imperialista para intervir nos países atrasados.
O autor não esconde seu entusiasmo com o enterro da PEC das Prerrogativas e com a “quase certa cassação” de Eduardo Bolsonaro. Para justificar suas posições, escreve:
“O julgamento pela turma já é matéria pacificada no STF, não foi levado ao plenário, e as penas aplicadas foram justas.”
Essa frase expõe toda a falácia do argumento. Se não foi levado ao plenário, não é pacificado coisa alguma. A verdade é que os julgamentos conduzidos por Alexandre de Moraes e pelo STF violaram sistematicamente o devido processo legal, com ministros atuando como acusadores, juízes e vítimas ao mesmo tempo. Aplaudir esse mecanismo é aplaudir um regime de exceção em que o povo não tem qualquer voz.
Segundo Gonçalves, “Bolsonaro recebeu cerca de 2/3 da pena máxima de reclusão” e ainda haveria outros crimes a serem julgados. Ao repetir esse argumento, o autor naturaliza a cassação e prisão de um ex-presidente por um tribunal político, entregando ao Judiciário o papel de árbitro supremo da política nacional. A cassação de direitos políticos é uma medida antidemocrática, pois retira do povo a decisão sobre quem deve ou não governar.
O autor afirma que “a defesa da punição dos golpistas é inegociável”. Trata-se de um raciocínio puramente moralista, que reduz a luta política a uma questão judicial. O que está em jogo não é “punir golpistas”, mas enfrentar o sistema político que produz o golpismo: a dependência do Brasil em relação ao imperialismo, a tutela do Judiciário e das Forças Armadas e a dominação completa da imprensa monopolista. Ao pedir penas máximas, Gonçalves se coloca como eco da política chave-de-cadeia da burguesia que foi utilizado na Lava Jato para incriminar o PT e que agora serve para consolidar o poder do STF.
O texto chega a comparar a democracia ao amor, que “precisa ser cuidada diuturnamente”. A metáfora sentimental serve para mascarar a realidade: o que ele chama de “democracia” é um regime tutelado pelo imperialismo, no qual as instituições não representam a soberania popular, mas apenas aplicam a política exigida pela burguesia internacional. As supostas vitórias — o arquivamento da PEC, a condenação de Bolsonaro, o discurso de Lula na ONU — não são avanços democráticos, mas sim mecanismos de controle que enfraquecem qualquer possibilidade de luta independente da classe trabalhadora.





