No artigo O preço da anistia: o Brasil não pode ceder à chantagem contra sua soberania, o jornalista Florestan Fernandes Jr. apresenta uma confusão comum entre os apoiadores do governo Lula. O articulista não sabe distinguir o é defender a soberania nacional e o que é a defender a política criminosa do Supremo Tribunal Federal.
Fernandes Jr. apresenta uma posição correta acerca das pressões feitas pelo presidente norte-americano Donald Trump: o Brasil não deve negociar com gangsteres que tentam interferir na política nacional, sejam eles bandidos do Partido Democrata norte-americano, sejam eles do Partido Republicano.
“Está em curso, nos bastidores do poder e nas páginas da mídia corporativa brasileira — movida pelo mercado financeiro e pelo agronegócio —, uma tentativa de construir uma “anistia negociada” para Jair Bolsonaro. Não se trata de uma suposição. A articulação é visível nas reportagens, editoriais e colunas que buscam desqualificar as decisões do ministro Alexandre de Moraes, especialmente após a decretação da prisão domiciliar do ex-presidente. Ao mesmo tempo, esse setor da elite brasileira pressiona o governo Lula a se render às imposições feitas por Donald Trump, como o tarifaço de 50% contra produtos brasileiros. A barganha implícita está escancarada: aliviar as sanções econômicas impostas pelos EUA em troca do fim do processo contra Bolsonaro no STF. Em outras palavras, querem que Lula negocie aquilo que é inegociável: a soberania nacional e o Estado Democrático de Direito.”
Sob nenhuma hipótese, o Brasil deveria sentar à mesa para negociar qualquer questão com os Estados Unidos diante deste tipo de pressão. Há poucos meses, a República Islâmica do Irã, mesmo bombardeada pelo sionismo e pelo imperialismo, se recusou a negociar qualquer reivindicação do governo norte-americano que atentasse contra a sua soberania. Da mesma forma, o Brasil não deveria se curvar às chantagens de meia-tigela de Donald Trump.
O problema do artigo, no entanto, é que ele confunde a defesa da soberania nacional com a defesa da política levada adiante por Alexandre de Moraes, que motivou as sanções norte-americanas. Diz ele:
“Diante disso, setores da mídia corporativa passaram a tentar enfraquecer Alexandre de Moraes. Alimentam narrativas de que suas decisões seriam autoritárias ou incoerentes. Uma das mais recorrentes é a de que ele estaria promovendo censura ao proibir Bolsonaro de usar redes sociais ou celulares. O editorial da Folha de S.Paulo de 6 de agosto afirma que ‘Moraes erra ao mandar prender o ex-presidente por ter se comunicado com apoiadores em atos organizados pela direita. A liberdade de expressão é direito que não abandona nem sequer quem cumpre pena’. O presidente Lula, no entanto, conhece bem esse tipo de restrição. Em 2018, foi impedido de dar entrevistas, inclusive a mim e à jornalista Mônica Bergamo, por ordem do ministro Luiz Fux, mesmo estando legalmente autorizado a fazê-lo. E o que motivava a censura a Lula? Apenas o fato de que, mesmo preso, liderava as pesquisas presidenciais. Ao contrário de Bolsonaro, Lula nunca tentou dar um golpe de Estado, nem incitou os EUA a intervir nas decisões jurídicas e políticas de seu país.”
Fernandes Jr. poderia dizer que a grande imprensa é incrivelmente cínica. Afinal, ela apoiou as aventuras ditatoriais de Alexandre de Moraes nos únicos anos. Isso, no entanto, não faz com que a crítica de que “as decisões de Moraes seriam autoritárias ou incoerentes” seja mentira. Para entender a incoerência de Moraes, basta ver o tratamento que deu aos pobres coitados condenados por sua participação no 8 de janeiro. Idosos foram obrigados a retornar para o regime fechado por motivos triviais, como violar sucessivamente o perímetro estabelecido pelo ministro — o que apenas comprova que não havia a intenção de fuga, visto que eles sempre voltavam para casa. Com Bolsonaro, Moraes ameaçou prendê-lo, mas se acovardou e apenas pediu explicações.
Quanto a ser autoritário, também não há novidades. Moraes simplesmente inventou a punição de banimento das redes sociais — algo que qualquer pessoa, como Fernandes Jr., que trabalhe com jornalismo deveria simplesmente protestar.
Sua argumentação fica ainda mais toca quando compara Bolsonaro a Lula. E daí que “Lula nunca tentou dar um golpe de Estado”? Fazê-lo não é, aos olhos da Constituição Federal, um critério para que haja liberdade de expressão ou não.
A defesa da soberania brasileira — isto é, de que o próprio povo brasileiro deve decidir acerca do funcionamento de suas instituições — é uma coisa. Ela implica em rejeitar qualquer tipo de ingerência. A defesa do regime, no entanto, é outra. Defender as arbitrariedades de Moraes, na verdade, apenas enfraquece a luta pela soberania, uma vez que a política de Moraes é altamente impopular e antidemocrática. Quanto mais o ministro seguir com essa política, mais será difícil unificar o País sob ataque.





