Antes da criação do Estado de “Israel” um importante setor dos judeus da Europa se organizou contra o sionismo e fundou o partido Agudat Israel. Sua existência seria um incomodo tão grande para o movimento sionista que uma de suas principais lideranças chegou a ser assassinado o poeta Jacob Israël de Haan. O partido foi tomado pelos sionistas na década de 1930 e existe até hoje, mas seu período inicial é crucial para mostrar como o sionismo é um movimento de oposição ao judaísmo.
Em uma conferência em Kattowitz na Polônia em maio de 1912 foi fundado o movimento Agudt Israel. Posteriormente, ramificações do movimento foram estabelecidas na maioria dos países da Europa Ocidental e Oriental, bem como nos Estados Unidos e na Palestina dominada pelos ingleses. Após o fim da primeira guerra mundial rabinos hassídicos na Polônia e líderes de yeshivas na Lituânia foram a base que fez crescer o movimento. Aquela região afinal era onde se concentrava a maior população de judeus no mundo.
Um dos motivos do crescimento desse movimento era a falta organização dos judeus religiosos diante de grupos sionistas e socialistas cada vez mais fortes, sendo a esquerda muito mais dominante entre a base do que os sionistas, que tinham cada vez mais apoio do imperialismo. Esse setor religioso percebia grandes fraquezas nas tituições tradicionais, como o rabinato, que se mostraram inadequadas para enfrentar os desafios do crescente processo de secularização, da migração em massa para grandes cidades e para o exterior, além do abandono dos estilos de vida tradicionais e da educação religiosa. Ou seja, era de fato os judeus religiosos que lutavam contra o enfraquecimento das religões de forma geral.
Os 300 delegados na conferência de Kattowitz enfrentaram a tarefa complexa de superar diferenças entre as comunidades tradicionais da Alemanha, Rússia, Polônia, Lituânia, Hungria e outros lugares. O objetivo ao formar a Agudat Yisroel era criar uma identidade ortodoxa abrangente e “ecumênica” que pudesse ser compartilhada por todas essas comunidades, representada por uma única organização. Prevaleceu uma visão de conciliação, permitindo que comunidades individuais tomassem suas próprias decisões em níveis locais e regionais. Embora alguns passos tenham sido dados para estabelecer uma organização maior, incluindo planos para criar um corpo mundial da AgudaI Israel chamado “Kenesiyah Gedolah” (Grande Assembleia), o início da Primeira Guerra Mundial tornou impossível a realização de tal conferência em agosto de 1914. Consequentemente, a primeira assembleia internacional só ocorreu em 1923.
Esse movimento se chocava com o sionismo não apenas na Palestina mas também na Europa. Isso porque sua propaganda contra o sionismo era uma questão central e assim atuavam como uma força contra a imigração, que enfraquecia o projeto sionista. Na Polônia o movimento teve seu maior crescimento.
Políticos da Agudat intervieram junto a autoridades governamentais para remover obstáculos burocráticos à educação tradicional. As filiais polonesas conseguiram que o governo reconhecesse a legitimidade das escolas da Agudat. As redes escolares afiliadas à Agudat eram os maiores grupos dentro dos sistemas escolares privados judaicos. Entre essas escolas estavam as escolas femininas Beys Yankev, fundadas por Sarah Schenirer em 1917.
Em “Israel”, o Agudat Israel foi estabelecida como um ramo desse movimento, com o objetivo de se opor à comunidade judaica sionista organizada, o “Novo Yishuv”, em contraste com o religioso “Velho Yishuv”, ou seja, judeus que viviam na Palestina antes do movimento sionsita. Um de seus mais influentes porta-vozes contra a formação de um Estado judeu, o poeta holandês Jacob Israël de Haan, foi assassinado pela Haganá, a milícia fascista sionista, em 1924. Isso foi apenas um dos aspectos da perseguição que o partido sofreu pelo sionismo e os britânicos.
À medida que o movimento sionista crescia na Palestina, certos membros do Agudat Israel começaram a capitular, amenizaram suas objeções e decidiram cooperar com os elementos sionistas. Os ortodoxos, afinal, dependiam de outros para financiar seu estilo de vida dedicado exclusivamente ao estudo. No entanto, nem todos os ultraortodoxos concordaram com essa decisão, e alguns começaram a se manifestar contra o sionismo. O setor antisionista era liderado pelo rabino Yosef Haim Sonnenfeld e passou a ser chamado de Edah Haredit (“Comunidade que teme”). Gradualmente, uma racha se formou dentro da ultraortodoxia, e ela se dividiu entre dois irmãos, Moshe e Amram Blau.
Em 1938,em meio a enorme mobilização dos palestinos no processo revolucionário que começou em 1936, Blau eo rabino Aharon Katzenellenbogen, separou o grupo do Edah Haredit e reivindicou o manto de Neturei Karta (do aramaico Naṭore Qarta, “Guardiões da Cidade”). Em suma, os membros do Neturei Karta se consideravam, os verdadeiros guardiões da cidade de Jerusalém e sua oposição ao sionismo não era mais o modelo passivo de seus irmãos ideológicos, mas ativo e franco.
Mas ao mesmo tempo que esse movimento se desenvolvia na Palestina o seu maior parceiro na Europa acabou com o início da Segunda Guerra Mundial. Tanto Hitler quanto Stalin, ao tomarem os territórios da Polônia e dos países bálticos acabaram com a organização do Agudat Israel. O movimento dos judeus antissionistas, no entanto, nunca deixou de existir. O Naturei Karta está nas ruas até hoje e inclusive mandou representações para o ato do G20 em defesa da Palestina no Rio de Janeiro em novembro de 2024.