As movimentações de Donald Trump sempre geraram comoção dentro da esquerda pequeno-burguesa brasileira, recentemente teve destaque sua sua iniciativa contra a censura do Rumble no Brasil, que havia sido determinada por Alexandre de Moraes.
Xandão, como é conhecido, fechou sabe-se lá quantos perfis de rede social em razão de interesses políticos. Também multou e bloqueou empresas de redes sociais e até mesmo impediu sua atuação no Brasil. O X (antigo Twitter) amargou um bom período na geladeira e agora foi a vez do Rumble, que, tal como em outras ocasiões, está sob pena de multas impostas por Alexandre de Moraes, e está proibida no país.
Em outras oportunidades, por não acatar as decisões de Moraes, o Rumble se retirou do Brasil. Em 2023 a empresa alegou que a decisão de Moraes de determinar remoção de conteúdos constituía “censura” e, por isso, decidiu sair do Brasil.
A última gota foi quando da volta do Rumble ao Brasil, Moraes Moraes determinou que a plataforma bloqueasse a conta de Allan dos Santos, uma das primeiras vítimas da censura de Moraes sob o pretexto da “defesa da democracia”. Como a empresa não cumpriu a ordem, Moraes baniu a rede social do Brasil.
A esquerda pequeno-burguesa fez festa e a direita norte-americana trumpista, acionou judicialmente Alexandre de Moraes alegando que “o respeito à soberania é uma via de mão dupla com todos os parceiros dos EUA, incluindo o Brasil. Bloquear o acesso à informação e impor multas a empresas sediadas nos EUA por se recusarem a censurar indivíduos que lá vivem é incompatível com os valores democráticos, incluindo a liberdade de expressão”.
Por aqui, Oliveiros Marques, sociólogo, redator do Brasil 247, disse sobre a situação “essa gente usa do farisaico discurso da ‘liberdade de expressão’ para defender ações extremistas e recorrer à força e ao poder do Estado norte-americano para impor sua visão de mundo e proteger interesses econômicos espúrios, disfarçados por trás das ações de empresas sediadas nos Estados Unidos”.
Existe uma confusão sobre o que está acontecendo. Ela se resume ao fato de que muita gente da esquerda encara a questão como “democracia x fascimo”. No caso, Biden/Xandão x Trump. Esta forma de analisar a política resulta em desastre, como pode ser visto.
O governo dos Estados Unidos é, naturalmente, imperialista, pois os EUA são um país imperialista. Qualquer governo, seja do partido democrata, seja do partido republicano, será imperialista e tende a manter, no geral, a política do imperialismo para o mundo.
Ocorre, porém, que o enfrentamento entre Donald Trump e Alexandre de Moraes, embora possa enganar na aparência, é o enfrentamento entre o imperialismo clássico (“Xandão”) e um setor dissidente do imperialismo (Donald Trump), que está tentando reverter a política tradicional de censura do imperialismo, uma vez que ela ameaça os seus próprios interesses e sua base eleitoral.
Por isso Oliveiros apresenta essa argumentação com ares de revelação inédita: “é justo que, no mesmo contexto em que o governo norte-americano ataca diretamente o Brasil, empresas como General Motors, GE Celma (unidade de aviação da General Electric), Ford e outras corporações daquele país sigam recebendo incentivos fiscais aqui, alguns ultrapassando a cifra de R$ 1 bilhão? A GM, por exemplo, já foi beneficiada com bilhões em incentivos estaduais e federais, enquanto a GE Celma tem isenções robustas no setor aeroespacial. A Ford, que fechou fábricas no Brasil alegando dificuldades, ainda teve acesso a incentivos fiscais milionários antes de sair. Acredito que não”.
O relatado pelo articulista do Brasil 247 é uma rotina do imperialismo norte-americano no Brasil e no mundo. E, na realidade, não tem a ver com a discussão que está colocada, que é, efetivamente, a liberdade de expressão.
Alexandre de Moraes e os censuradores modernos acabaram com a liberdade de expressão sob os mais variados pretextos. E o caso Trump deu outro pretexto para o fim da liberdade de expressão, ou seja, a suposta defesa da soberania brasileira. Que se junta à suposta defesa do estado democrático de direito, suposta defesa das eleições, suposta defesa da honra etc.
Se a liberdade de expressão não é irrestrita, ou seja, possui limitações, ela de fato não existe. O que existe é o direito de falar somente o que irá agradar o poder constituído e suas instituições. Dito de outra forma, o que existe é a censura.
E o raciocínio vale para todas as demais liberdades constitucionais, para todos os direitos democráticos previstos na Constituição. Se a liberdade de expressão não é irrestrita, nenhum direito democrático é. Em último caso, não existem direitos, existe o Estado e seu Poder Judiciário, que é quem vai determinar como e se um direito pode ser exercido.
É fundamental que qualquer pessoa fale o que bem entender sobre o que bem entender. Só assim é possível esclarecer as questões em debate. A liberdade de expressão, nesse sentido, é um direito do próprio povo como um todo, que pode ler e ouvir opiniões, posições, ideias sobre um assunto e tomar uma decisão.
Na realidade, a soberania alegada por Alexandre de Moraes é uma farsa vergonhosa, especialmente diante do domínio do capital internacional sobre a economia brasileira. Pagar quase todo o PIB nacional para bancos e banqueiros, que é, de fato, um ataque contra a soberania brasileira, não é colocado em xeque por super-Xandão e seus lacaios. Já a liberdade de expressão…