Uma sessão da Tribuna Livre da Câmara Municipal de Curitiba, realizada na última quarta-feira (2), terminou em tumulto durante o debate sobre a resolução 258/2024 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONADA), que trata do atendimento a vítimas de violência sexual. A presença da vice-presidente do conselho, a psicóloga Marina de Pol Poniwas, inflamou vereadores direitistas e manifestantes do movimento Pró-Vida, que lotaram as galerias com faixas contra o aborto. A proposta, que prevê acesso ao aborto legal para meninas menores de 14 anos em casos de estupro, mesmo sem consentimento dos pais, foi alvo de duras críticas e interrupções, refletindo a polarização do tema.
O debate começou com ataques diretos à convidada. Dos 12 vereadores que discursaram, nenhum defendeu a resolução. O vereador Bruno Secco (PMB) abriu a sessão afirmando que não toleraria “abortista falando groselha” na Casa. Eder Borges (PL) chamou de “vergonha” a presença de Marina, enquanto Guilherme Kilter (Novo) associou o texto a rituais de sacrifício infantil, citando o deus Moloch. A vereadora Delegada Tathiana Guzella (União) questionou a exclusão dos pais nas decisões, e o vereador Da Costa (União) declarou: “a esquerda tem surpreendido até o próprio Satanás. Logo estaremos recebendo [na Tribuna Livre] integrantes do PCC e homens para defender o feminicídio”, sob aplausos e vaias da plateia.
Marina Poniwas rebateu as acusações, esclarecendo que a resolução não muda leis existentes, mas organiza o atendimento às vítimas, respeitando direitos já previstos. “A gravidez em crianças é sempre considerada de alto risco, por fatores biológicos e sociais. Elas têm maior probabilidade de morrer e sofrer consequências de saúde mental”, disse ela, destacando que, em alguns casos, os agressores são os próprios responsáveis legais, justificando a autonomia da vítima. “A resolução representa uma cultura da proteção integral”, completou, negando que incentive a morte, e cobrou foco no combate aos abusadores.
A reação da esquerda foi limitada na sessão, mas fora dela, movimentos feministas criticaram a hostilidade. Segundo o coletivo Mulheres em Luta, presente no local, os vereadores direitistas usaram discurso religioso para desinformar. A sessão, prorrogada por falta de tempo, foi encerrada pelo presidente Tico Kuzma (PSD), que anunciou nova Tribuna Livre com o padre Silvio Roberto, da Casa Pró-Vida. Dados do IBGE mostram que, em 2022, 79% das vítimas de estupro no Brasil eram menores de 18 anos, evidenciando a gravidade do problema.
A extrema direita segue em franca campanha para restringir os direitos democráticos das mulheres. O episódio na Câmara de Curitiba expõe uma ofensiva contra a população feminina, usando a religião e a desinformação para atacar leis que protegem vítimas de violência sexual.