Em uma cena simbólica que expressa as transformações profundas em curso no Marrocos e na região, a bandeira da Palestina — que durante décadas tremulou em manifestações e praças marroquinas como símbolo de dignidade e compromisso moral — hoje está sendo arrancada das mãos. Não apenas fisicamente, mas também no plano simbólico e espiritual.
Desde que assinou os acordos de normalização com o regime de “Israel”, o regime marroquino tem acelerado sua aproximação com o sionismo sob o pretexto da “cooperação” e dos “interesses estratégicos”. Mas, por trás dessa linguagem diplomática, esconde-se um perigoso processo de normalização cultural, que visa reformular a consciência coletiva e enfraquecer os símbolos históricos de solidariedade com a Palestina.
O que antes era uma posição nacional unificadora passou a ser tratado como um mero “assunto externo”. A causa palestina — que sempre foi o termômetro da consciência ética e política do povo marroquino — agora é frequentemente relegada a um tema marginal.
Mais grave ainda é ver essa transformação penetrar nas instituições do Estado e da sociedade — desde os programas escolares até a imprensa e o discurso público — onde as expressões de solidariedade à Palestina enfrentam crescentes restrições, censura e desconfiança. A bandeira palestina, antes erguida com orgulho, hoje é vista, em certos contextos, com receio.
Mas a história mostra que os povos não se dobram facilmente. A consciência coletiva, mesmo sufocada, ressurge. A questão palestina não é um conflito político distante: é um espelho da dignidade e da memória histórica dos povos oprimidos.
Arrancar a bandeira da Palestina das mãos de um manifestante é, simbolicamente, calar uma das vozes livres do povo marroquino — um povo que sempre enxergou na Palestina uma extensão natural de sua própria identidade e luta.
A normalização com “Israel” não é apenas um acordo diplomático: é um projeto de reengenharia ideológica do mundo árabe, que busca impor a aceitação da dominação imperialista e silenciar qualquer oposição à injustiça. Enfrentá-la exige mais do que palavras de ordem: exige consciência crítica, resistência cultural e luta política em todos os terrenos — inclusive no campo da comunicação.





