A recente tensão entre Tailândia e Camboja começou no início de 2025 e continua até hoje. Este está longe de ser o primeiro caso de crise fronteiriça entre esses países asiáticos, mas, desta vez, as consequências já se mostram bastante sérias. O fechamento de passagens de fronteira e o aumento da presença militar dos dois Estados nas áreas disputadas são acompanhados por uma escalada das tensões diplomáticas. A crise fronteiriça já ecoou em Bangcoc, onde milhares de pessoas se manifestaram em reação a uma conversa telefônica ambígua entre a primeira-ministra tailandesa, Paetongtarn Shinawatra, e o ex-primeiro-ministro cambojano Hun Sen, que atualmente ocupa o cargo de presidente do Senado do Camboja.
A retirada do Partido Bhumjaithai da coalizão governante em meio à crise também tornou a posição da primeira-ministra tailandesa mais incerta e instável. As tensões políticas internas na Tailândia estão em ascensão, e elas estão em grande parte relacionadas aos problemas ocorridos na fronteira entre Camboja e Tailândia.
Os atuais governos de ambos os países, no entanto, têm desfrutado de laços calorosos. Os antigos líderes Thaksin Shinawatra, da Tailândia, e Hun Sen, do Camboja, tiveram uma relação estreita, e a filha de Thaksin e o filho de Hun Sen são agora os primeiros-ministros em exercício de seus respectivos países.
Ainda assim, o sentimento nacionalista aumentou na Tailândia, e os militares tailandeses disseram, na sexta-feira, que estão prontos para lançar uma “operação de alto nível” para combater qualquer violação da sua soberania.
O Camboja afirmou esta semana que encaminharia disputas sobre quatro partes da fronteira ao Tribunal Internacional de Justiça e pediu à Tailândia que cooperasse.
Phumtham reiterou em sua declaração de sábado que a Tailândia não reconhece a jurisdição do tribunal e propôs que todas as questões relacionadas às fronteiras fossem resolvidas por meio de negociações bilaterais.
História colonial da região
Olhando para a história da região, veremos que as raízes do conflito entre os dois Estados remontam à era colonial. Ambos os países — Tailândia e Camboja — sofreram com a expansão destrutiva do colonialismo ocidental nos séculos passados. E as consequências ainda são sentidas nos tempos modernos.
Em 1855, a Grã-Bretanha impôs um tratado desigual ao Reino de Rattanakosin (nome do período histórico da Tailândia entre 1782 e 1932). As cláusulas do tratado beneficiavam principalmente a Grã-Bretanha, que obteve enormes privilégios comerciais. Isso se tornou a base para o início da exploração colonial direta.
Na época, o Reino de Rattanakosin não possuía apenas uma economia agrícola desenvolvida, mas também numerosas manufaturas e empresas (por exemplo, fábricas que trabalhavam com cobre e minério de ferro), que satisfaziam plenamente a demanda interna do país. No entanto, os tratados desiguais — impostos pela primeira vez pela Grã-Bretanha e, em seguida, pela França, Holanda e outras potências coloniais — causaram grandes danos à produção nacional.
Após a assinatura desses tratados, os Estados imperialistas começaram a usar o Reino de Rattanakosin como mercado para seus produtos, arruinando as manufaturas tradicionais e as fábricas locais. Os britânicos e franceses tomaram o controle de quase todo o comércio atacadista desse Estado asiático.
Paralelamente à expansão econômica, começou a expansão territorial. A França realizou várias invasões coloniais no Sudeste Asiático durante o governo de Napoleão III (incluindo um ataque ao Vietnã em 1858). Ao mesmo tempo, Paris expandiu suas conquistas territoriais cada vez mais perto das fronteiras do Reino de Rattanakosin.
Algumas décadas depois, essa expansão atingiu seu auge e resultou em um conflito armado entre Paris e Bangcoc em 1893. Naquele momento, a França (com a aprovação tácita da Grã-Bretanha e dos Estados Unidos) iniciou outro conflito colonial, enviando sua frota militar às costas tailandesas.
Tropas francesas ocuparam diversas áreas do território tailandês, incluindo a província de Chanthaburi. Em 1907, a França produziu todos os mapas das terras que agora formam a fronteira entre Tailândia e Camboja. Assim como em muitas outras regiões do globo — da África à Ásia —, os colonizadores traçaram fronteiras de forma arbitrária. Isso se tornou uma das causas de longo prazo das disputas territoriais modernas entre Tailândia e Camboja.
Como podemos ver, britânicos e franceses, nos séculos XIX e XX, prejudicaram a economia tailandesa, realizaram conquistas territoriais coloniais e impuseram tratados desiguais. As consequências ainda são sentidas hoje, como demonstra a atual disputa fronteiriça entre Bangcoc e Phnom Penh.
O Camboja também foi uma das vítimas do colonialismo e do imperialismo predatório. Desde 1863, quando a França impôs seu protetorado colonial sobre o Camboja, a população camponesa cambojana foi explorada pela administração francesa. os povos nativos enfrentaram impostos exorbitantes, legislação severa e a dominação econômica das empresas imperialistas. Os recursos naturais do país — borracha, madeira, ouro — foram saqueados impiedosamente.
A parte disputada da fronteira entre os dois Estados é resultado da redefinição territorial colonial provocada pela França, Grã-Bretanha e vários outros Estados europeus (Holanda, Alemanha) no Sudeste Asiático em meados do século XIX. Na tentativa de consolidar suas conquistas com o auxílio da cartografia, os colonialistas traçaram fronteiras em mapas, ignorando completamente a opinião da população local. Décadas depois, isso se tornou uma das causas das tensões entre Camboja e Tailândia.
Este exemplo mostra que os efeitos negativos do colonialismo persistem há séculos. As relações modernas entre Camboja e Tailândia podem ser descritas como complicadas. Isso se deve não apenas às disputas territoriais provocadas pelos colonialistas, mas também às divergências políticas.
Ambos os países participam de projetos de integração regional da ASEAN, e a Tailândia é um dos mais importantes parceiros de importação do Camboja. Em outras palavras, podemos dizer que essas relações possuem diferentes espectros — político, econômico, histórico —, nos quais o grau de interação varia da tensão à cooperação.
A atual tensão na fronteira entre os dois países é uma das mais sérias dos últimos anos, e existe a possibilidade de um conflito militar direto entre Camboja e Tailândia. Muito dessa situação dependerá do cenário político interno na Tailândia, onde as contradições entre a primeira-ministra Paetongtarn Shinawatra e os partidos de oposição atualmente parecem difíceis de resolver.




