Polêmica

As guerras são feitas pelo imperialismo, não por bravatas

Atribuir o começo e fim de guerras às características pessoais de políticos é um erro de falta de compreensão do imperialismo

A vitória de Donald Trump nos Estados Unidos deixou boa parte da esquerda sem saber como avaliar a questão, mas com uma sensação de derrota gigantesca, embora alguns colunistas até ousem avaliar que Trump e os Estados Unidos, na realidade, não são tão poderosos assim.

É o caso de Eugênio Aragão, ex-ministro da justiça durante o governo Dilma, que afirmou, em texto recente publicado no Brasil 247, que “medidas escandalosas do presidente norte-americano não aumentaram a autoridade dos EUA”.

“Neste início do governo Trump […] As dezenas de medidas decretadas pelo presidente estadunidense, muitas escandalosas, causaram temor de tempos difíceis por vir, mas não aumentaram a autoridade dos Estados Unidos da América do Norte. Pelo contrário. Causaram repúdio global e ajudaram a afundar ainda mais a já controvertida reputação geopolítica daquele país.”

Aqui o colunista apresenta, desde já, um erro de avaliação política. As medidas adotadas por um presidente devem ser consideradas diante do país que preside, e, no caso de Trump, é a maior potência imperialista de todo o mundo. Por mais que parte delas sejam bravatas, o fato é que Trump e os EUA possuem, de fato, autoridade e poder.

“A grosseria com que Trump tratou a Federação Russa, ao ditar-lhe um ultimato para terminar a guerra que foi provocada por seu antecessor Biden e sua turma de neoliberais, mostrou apenas profundo desconhecimento da natureza humana. Trump sabe que a guerra da Ucrânia foi causada pela ganância do anterior presidente, cuja família lucrou muito desde o golpe de Maidan em 2014.”

As guerras patrocinadas pelo imperialismo necessitam de uma avaliação de classe, marxista. A avaliação pessoal, de que Biden, no caso da Ucrânia, provocou uma guerra por conta de sua natureza humana, é uma avaliação que não serve para entender o que está acontecendo, e nem por qual motivo uma guerra começa ou termina. Tudo ficaria a cargo da natureza humana dos conflitantes, o que é um absurdo.

Justiça seja feita, em seguida, Aragão se propõe a fazer uma análise mais realista do caso ucraniano: “a ideia sempre foi encurralar a Rússia para enfraquecer sua capacidade de reação e sua economia. De olho nas riquezas da antiga União Soviética, seus solos férteis e seus minerais abundantes, os Estados Unidos da América do Norte e seus sócios minoritários europeus foram provocando propositadamente ambiente de tensão regional, tanto com uso de guerra assimétrica, quanto com a clara ameaça à segurança nacional russa por meio da expansão da OTAN em direção a leste”.

Ainda sobre a Ucrânia, afirma Aragão que “Trump precisa se dar conta dessa realidade e só assim terá condições para intermediar o fim ao conflito. Ultimatos e ameaças podem provocar temores, mas nunca será base para sua autoridade”.

Obviamente que o que Donald Trump fala ou deixa de falar não determina o poder dos EUA. A análise sobre a importância dos EUA no momento atual é uma análise que precisa levar em consideração o problema do imperialismo, que é, por sinal, o que explica a vitória do Hamas na Palestina.

Mas não só. O interesse de Trump na questão da Ucrânia, no fim da guerra por meio de um acordo, é relativamente simples: trata-se de uma política para agradar uma base popular considerável do trumpismo que enxerga com maus olhos o gasto de fortunas em uma guerra quando os nacionais, pessoas e empresários, passam sufoco na atual crise capitalista. 

Não faz sentido enviar bilhões de dólares para uma guerra no exterior quando os EUA passam por um momento de turbulência econômica e social. É isso que explica, também, as medidas contra a imigração. 

Muito do que diz Trump é bravata e frases de efeito para agradar sua base social e eleitoral. O caso ucraniano é um desses casos. As ameaças feitas contra a Rússia escondem, na verdade, a necessidade de estancar o conflito que já tem como resultado a derrota dos nazistas de Zelenski. 

As análises pessoais, tais quais as feitas em relação a Jair Bolsonaro, não explicam o problema da direita, e, por consequência, não mostram o caminho para sua derrota. Pelo contrário, tendem a fortalecer esse setor político que só cresce no mundo inteiro, apesar da perseguição judicial.

Mesmo sobre o golpe contra Dilma Rousseff, o ex-ministro do PT já havia apresentado uma análise confusa e pessoal da questão:

“Eduardo Cunha só acatou o pedido de impeachment para se vingar do PT […] Se tivesse havido o reconhecimento do modo de atuação do presidente da Câmara [pelo STF], não estaríamos aonde estamos.”

Ou seja, Eduardo Cunha quis vingança, e o STF bem que poderia ter salvado Dilma. O golpe, nesse sentido, foi resultado de um sentimento pessoal de determinada figura. E não uma operação orquestrada pelos países mais poderosos do mundo contra um governo de tipo nacionalista burguês.

Eis um dos maiores problemas para enfrentar a direita e a extrema direita: compreender o imperialismo.

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