Polêmica

Apropriar-se do avanço tecnológico é dever dos comunistas

Perfil nas redes sociais apontou suposta "contradição" entre apoiar o fim do capitalismo e a apropriação do desenvolvimento produzido pela humanidade

Chegou à nossa redação um texto publicado nas redes sociais, de autoria de um perfil chamado Claudia Wild, afirma haver uma “contradição” na campanha de solidariedade à Natália Pimenta, filha de Rui Costa Pimenta, presidente do Partido da Causa Operária (PCO). Natália enfrenta uma leucemia rara e agressiva, necessitando de um medicamento de ponta — o Revumenib — aprovado nos EUA e fabricado pela Syndax Pharmaceuticals.

O autor do texto, embora se solidarize com a situação, questiona como militantes historicamente anti-imperialistas, anticapitalistas e críticos veementes dos Estados Unidos e de suas instituições podem recorrer a um tratamento desenvolvido pelo que eles chamariam de “capitalismo opressor”. O texto destaca, com razão, que essa farmacêutica é financiada pela “nata do imperialismo americano”, citando fundos como Vanguard, Goldman Sachs e BlackRock. Ela, então, pergunta: “Então, quer dizer que, para isso, o capitalismo presta?”

Essa interpretação, no entanto, incorre em um erro fundamental: confunde o produto do desenvolvimento tecnológico da humanidade com a estrutura de exploração que o apropria. Longe de ser uma contradição, a busca por esse medicamento é a demonstração mais clara da necessidade de superar o sistema que transforma a vida em mercadoria.

O argumento de que o medicamento prova o valor do capitalismo se baseia na premissa não dita de que o capitalismo é o único sistema capaz de gerar progresso científico.

O fato é que todo modelo de sistema econômico eventualmente foi um fator de progresso. O progresso não é um monopólio do capitalismo; ele é um motor da história humana. A civilização grega floresceu com grandes pensadores graças à divisão do trabalho baseada na escravidão. Os avanços agrícolas e a preservação do conhecimento na Idade Média ocorreram sob o feudalismo.

O capitalismo, por sua vez, foi um revolucionário impulsionador do desenvolvimento das forças produtivas. A necessidade de acumular capital e expandir mercados gerou saltos tecnológicos sem precedentes. Nenhum marxista nega que o capitalismo foi historicamente progressista em relação aos sistemas anteriores. O Revumenib, nesse sentido, é um resultado do conhecimento acumulado e do investimento em pesquisa, que o capitalismo soube — e soube muito bem — organizar em sua fase ascendente.

Onde reside a crítica, então? Na decadência do sistema.

A teoria marxista, especialmente através de Lênin, define o imperialismo como a fase superior do capitalismo, marcada pela concentração monopolista e pela fusão do capital industrial com o capital bancário. É a fase em que o sistema atinge seu ápice e, ao mesmo tempo, suas contradições se agudizam a ponto de transformá-lo em um entrave ao progresso.

O capitalismo, ao colocar a pesquisa sob o jugo da patente e do lucro privado, restringe o acesso, atrasa a distribuição e, em muitos casos, impede que curas mais eficientes sejam desenvolvidas se elas forem menos lucrativas do que tratamentos contínuos. A tecnicidade burocrática que negou a liminar via SUS é a materialização dessa contradição: o avanço existe, mas o direito à saúde é barrado pela propriedade privada e pelo parasitismo do capital financeiro.

A “contradição” não está em usar o Revumenib; está em um sistema que produz o Revumenib e, ao mesmo tempo, nega-o a quem precisa.

O texto inicial faz questão de nomear os acionistas da Syndax Pharmaceuticals: “Vanguard Group… Goldman Sachs… e BlackRock, instituições frequentemente demonizadas por Rui Costa Pimenta em suas críticas anti-imperialistas”.

Essa é uma citação importante, pois ela permite separar o produto de seu proprietário.

O Produto (O Revumenib): é um avanço científico. Ele é o resultado do trabalho coletivo de cientistas, técnicos e pesquisadores, pagos (isto é, explorados) pela empresa. Esse avanço pertence, por direito, à humanidade.

O Proprietário (BlackRock, etc.): São as instituições financeiras que detêm o controle acionário, ou seja, são os donos do meio de produção (a farmacêutica) e do resultado desse trabalho (o remédio). Eles não participaram da pesquisa; eles apenas capitalizaram sobre ela.

Quando se critica o imperialismo e a BlackRock, se critica a concentração de propriedade que transforma o remédio em um ativo financeiro (listado na NASDAQ – SNDX, como bem citado) e o coloca fora do alcance das massas, mesmo em casos de vida ou morte.

O uso do Revumenib por Natália, e a luta para obtê-lo, não é uma homenagem à BlackRock; é um ato de apropriação do avanço da humanidade contra a tentativa da BlackRock de privatizá-lo. No socialismo, o Revumenib seria produzido em massa e distribuído gratuitamente e universalmente, sem depender de petições judiciais de 100 páginas, liminares negadas ou campanhas de arrecadação.

Por fim, o texto original levanta a “ironia” de que pode haver um pesquisador judeu envolvido na descoberta, na tentativa de ligar a crítica ao imperialismo americano e o apoio ao Hamas (o que o autor caracteriza como “ódio a Israel e apoio ao Hamas”) a uma suposta aversão religiosa.

O conhecimento científico não tem passaporte nem religião. O que importa é que os estudos e ensaios são públicos e foram considerados eficientes pra doença. O que se busca é a eficácia, não a identidade do cientista.

Além disso, a autora confunde antissionismo com antissemitismo. O sionismo é um projeto político, um movimento de colonização e ocupação que estabeleceu um Estado segregacionista. A crítica a esse projeto não se confunde com preconceito contra o povo judeu. A história do próprio marxismo está ligada a figuras de origem judaica, como Marx e Trótski. O PCO, por sua vez, já demonstrou aliança com rabinos antissionistas (como o Rabino Yisroel Weiss) em atos públicos e debates.

A sugestão de ironia pela possível origem religiosa do pesquisador é uma tentativa de desviar o foco da crítica política para o campo da injúria, algo que refutamos veementemente. A luta contra o imperialismo e o apoio ao Hamas como força de resistência nacional palestina são posições políticas sobre conflitos mundiais, e nada têm a ver com a aceitação ou rejeição de um medicamento vital.

A verdadeira coerência de Rui Costa Pimenta e Natália Pimenta não estaria em rejeitar o remédio em nome de um purismo ideológico, mas em lutar pela vida dentro do sistema capitalista, usando seus avanços, enquanto se trabalha por uma revolução socialista que universalize esses avanços e retire para sempre a saúde e a ciência da esfera do lucro da BlackRock.

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