Em artigo intitulado O mal reina sobre o mundo?, publicado pelo Brasil 247, o jornalista Luis Pellegrini apresenta suas impressões sobre a política internacional após o primeiro mês do governo do republicano Donald Trump. Em tom dramático, assim Pellegrini inicia seu artigo:
“Perplexidade? Não, a palavra é estupor, talvez com uma ponta amarga de asco. Foram os sentimentos que afloraram quando, na última terça-feira, ouvi – e sobretudo vi – o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ao lado do amigo israelense Benjamim Netanyahu, propor, sorrindo como beato de igreja, que os EUA assumam o controle da Faixa de Gaza.”
De fato, é asquerosa a ideia de que o imperialismo norte-americano, o maior ladrão da história da humanidade, roube a terra dos palestinos que lutam a mais de um século para mantê-la livre dos sionistas. O erro de Pellegrini, no entanto, está em concluir que os ataques aos povos seja uma particularidade da política trumpista, e não do imperialismo de conjunto.
Logo de início, já chama a atenção que Pellegrini, antes de apresentar a sua teoria sobre “o combate do mal”, apresente a seguinte declaração para reforçar o seu espanto com a política trumpista:
“A proposta, classificada pelo mundo como delirante, foi imediata e amplamente condenada pela comunidade internacional, incluindo nações árabes, países europeus, a ONU e membros do próprio Partido Republicano. Críticos argumentam que a ideia viola o direito internacional e pode agravar ainda mais a situação na região. No Brasil, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou as políticas expansionistas de Trump, afirmando que ele “não foi eleito para governar o mundo” e discordando da proposta sobre a Faixa de Gaza”.
Ora, mas a “perplexidade” da Organização das Nações Unidas (ONU) e da chamada comunidade internacional não significa absolutamente nada. Metade da história da ONU se resume a meia dúzia de declarações lamentando o sofrimento dos povos enquanto seus líderes se mantêm de braços cruzados. A outra metade da história se resume ao apoio explícito aos ataques contra os povos. O mesmo pode ser dito da tal comunidade internacional. O mesmo pode ser dito – infelizmente – do governo brasileiro, que não moveu uma palha para fazer diminuir o sofrimento do povo palestino e que, em alguns momentos, chegou a se solidarizar com os monstros sionistas.
Falar em reação da comunidade internacional, portanto, não serve de critério para nada. Serve apenas para reforçar a política hipócrita e criminosa do imperialismo: a de que o mundo deveria lamentar, e não agir, diante dos ataques contra os povos.
O autor, então, segue seu texto afirmando que:
“Sem dúvida, ter um desatinado e por muitos considerado doido no comando da maior potência econômica e militar do globo deve ser motivo de muita preocupação. De líderes como esse, capazes de comparecer em entrevista coletiva diante de dezenas de representantes da mídia internacional para afirmar – reiteradamente – que vai invadir e tomar um inteiro território e dele expulsar seus moradores e legítimos proprietários, pode-se esperar tudo e muito mais. Trump parece ser, no momento a própria encarnação do mal. (…) O mal não reina sobre o mundo. Nem o bem. O que existe desde sempre, se examinarmos a história da humanidade, é um eterno combate entre o bem e o mal.”
As ideias, aqui, se completam. Pellegrini usa como referência a ONU porque, para ele, o único “mal” que haveria no planeta Terra hoje seria Donald Trump. Ele seria “o mal” que deveria ser combatido.
É inacreditável como alguém seja capaz de chegar a essa conclusão logo após o genocídio praticado por “Israel” na Faixa de Gaza durante 15 meses. O pior massacre testemunhado pela humanidade, responsável por exterminar, segundo números oficiais, 2% de toda a população de um território, não foi orquestrado por Trump. Pelo contrário: logo após eleito, o presidente norte-americano pressionou para que houvesse o cessar-fogo.
Os quatro anos de governo do democrata Joe Biden foram um dos períodos mais sangrentos de toda a história. Foi a época em que foram assassinadas lideranças como Iahia Sinuar, Ismail Hanié e Hassan Nasseralá. Foi a época em que a população da Ucrânia foi transformada em bucha de canhão em uma guerra para tentar desgastar a Rússia. Foi a época de golpes de Estado em todos os continentes.
Se o autor quer reduzir a política mundial na luta entre “o bem e o mal”, não é possível reduzi-la à luta entre Trump e a humanidade. Ou, como diz Pellegrini, à luta entre “o bem” e “líderes de vocação autocrata”, o “autoritarismo”, o “messianismo” e a “mitomania”. O maior mal à toda a humanidade é o imperialismo, é a ditadura mundial dos monopólios que, para manter a sua dominação cada vez mais contestada, é capaz de qualquer monstruosidade.
Trump, como político burguês de um país imperialista, é apenas mais explícito naquilo que defende. É mais agressivo nas palavras. Mas o verdadeiro “mal” não está nas palavras de Trump, está na política de conjunto do imperialismo, que é capaz de produzir presidentes que exterminem uma população inteira sorrindo e falando que o fazem em nome da “democracia” e da “mulher negra”.