Na última quinta (29), o trabalhador acordou com a notícia da prisão de MC Poze do Rodo, um dos nomes mais populares do funk carioca. A cena foi digna de filme: agentes armados bateram à porta do artista no Recreio dos Bandeirantes, cumprindo mandado de prisão temporária, sob a acusação de apologia ao crime.
Para a polícia, Poze era mais do que um cantor — seria uma espécie de “embaixador” do Comando Vermelho, levando multidões para bailes em áreas dominadas pela facção, com letras que falariam de armas e drogas. Naturalmente, a imprensa burguesa não perdeu tempo, produzindo manchetes sensacionalistas, detalhes sobre passagens anteriores do MC e o velho discurso de “romantização do crime” dominaram o noticiário.
A defesa do funkeiro, por sua vez, alegou perseguição, criminalização da cultura da favela e a ausência completa de provas concretas. A prisão de Poze não é uma exceção, mas mais um capítulo de uma longa novela brasileira. Desde o fim da ditadura, a liberdade artística sempre foi vigiada de perto – principalmente quando a arte incomoda, denuncia ou vem da classe trabalhadora.
Em 1997, foi a vez do Planet Hemp sentir o peso da repressão. A banda, liderada por Marcelo D2 e BNegão, foi presa em Brasília logo após um show.
O motivo oficial foi apologia à maconha, segundo a polícia, que já estava de olho nos músicos. Mesmo antes das redes sociais, a operação foi um espetáculo: gravações escondidas, shows cancelados e cinco dias de cadeia. A imprensa burguesa tratou o caso como escândalo, reproduzindo o discurso moralista das autoridades, mas a reação contou com protestos, apoio de outros artistas e resultou no aumento nas vendas dos discos.
Outro caso foi Rita Lee, ícone do rock brasileiro, que também não escapou da repressão. Em 2012, durante um show em Aracaju, ela foi detida por “desacato” depois de defender o público e criticar a truculência policial.
A imprensa, como de praxe, optou pelo sensacionalismo: manchetes sobre a “rainha da polêmica” e pouco espaço para discutir o abuso de autoridade, mantendo as cadelas de farda da burguesia intocadas. Não foi a primeira vez: ainda na ditadura militar, em 1976, Rita foi presa grávida, acusada de porte de drogas.
Na época, jornais sob censura pintaram a cena como exemplar contra os “subversivos”. Rita sempre negou a acusação e denunciou a armação policial. Além do funk e MPB, o rap também foi alvo. Em 2012, Emicida foi detido em Belo Horizonte após cantar “Dedo na Ferida”, música que critica a violência policial. O motivo oficial, tal qual Rita Lee, foi desacato.
O público reagiu na hora, protestando contra a prisão e levantando o dedo do meio para os policiais em um ato praticamente universal. A imprensa destacou a polêmica, mas as redes sociais explodiram em solidariedade ao rapper. Artistas e políticos denunciaram a censura e eventualmente até racismo, enquanto a direita aplaudiu a ação policial, mas em escala extremamente reduzida.
As artes visuais também não escaparam. Em 2017, Maikon K foi preso em Brasília durante uma encenação com nudez artística, autorizada pelo Museu Nacional da República. A PM invadiu o espaço, interrompeu a apresentação e levou o artista para a delegacia, acusando-o de ato obsceno.
O caso ganhou destaque na imprensa, que tratou o episódio como parte da “guerra cultural” que tomava conta do país logo após o golpe de 2016. Artistas, instituições e o público reagiram com protestos e campanhas em defesa da liberdade artística. Anos depois, a Justiça reconheceu o abuso e condenou o Estado a indenizar Maikon K.
A prisão de MC Poze do Rodo, porém, acontece em um momento de maior ofensiva contra os direitos democráticos e constitucionais do povo brasileiro. Por isso mesmo, representa um recrudescimento da cruzada contra a liberdade de expressão e a liberdade artística no País, o que deve ser energicamente combatido pelas organizações de esquerda e de defesa dos interesses populares.




