O editorial da Folha de São Paulo desta sexta-feira (25) traz como título Morticínio em Gaza precisa ser interrompido. Como se vê logo de cara, a Folha evita o termo “genocídio”, e ainda pergunta no primeiro parágrafo: “Israel comete genocídio na Faixa de Gaza ou afirmar isso é apenas uma manifestação de antissemitismo?”.
Apesar de parecer ter subido o tom contra o Estado sionista, o veículo de imprensa escolhe com cuidado as palavras, como no olho do texto, que diz que “Israel tem cometido crimes de guerra em larga escala, com violação de direitos humanos e limitação do acesso a alimentos” – [grifo nosso].
O que seria uma limitação? Uma dieta alimentar, por exemplo. Em vez de se comer 2 mil calorias em uma refeição, diminui-se para mil e duzentas, eis uma limitação, mas não é isso que está acontecendo em Gaza. As pessoas estão morrendo de fome por privação de alimentos, não recebem calorias suficientes para manterem o corpo funcionando.
A coisa é ainda pior. Segundo a emissora catarense Al Jazeera, desde o final de maio, mais de 1.000 palestinos também foram mortos enquanto tentavam obter alimentos da chamada Fundação Humanitária de Gaza (GHF). Essa organização diabólica, apoiada por “Israel” e pelos Estados Unidos, não só concentra um grande número de palestinos famintos em um único local para facilitar o extermínio pelo exército israelense, como também promove a visão de “Israel” de expulsar à força a população palestina sobrevivente.
Cinismo
A Folha alega que “sobre o primeiro ponto [genocídio], trava-se um intenso debate acadêmico que já vai vazando para as páginas de jornais no mundo todo. Os dois lados têm seus argumentos”. Seria com se um grupo de acadêmicos se reunisse em volta de uma pessoa morta e tentassem decidir se aquilo é um cadáver ou um defunto. Enquanto não chegam a um acordo, para todos os fins, a pessoa não pode ser considerada morta.
“Israel” bombardeia e inutiliza praticamente todos os hospitais, ambulâncias, mata médicos, enfermeiros, impede a entrada de medicamentos (crianças foram amputadas a seco), impede a entrada de água. Porém, enquanto os acadêmicos não chegarem a uma conclusão, não se pode chamar o genocídio de genocídio. É muito cinismo.
Segundo o jornal, “para caracterizar penalmente um crime como genocídio, é necessário demonstrar que quem o perpetra tinha a intenção de ‘destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico racial ou religioso’. E nunca é fácil provar um dolo assim tão específico, daí a baixa resolutividade das discussões”. Esse editorial da Folha, muito mais do que cínico, é uma confissão de apoio ao genocídio, pois protege os genocidas atrás de minúcias técnicas.
Reação mundial
Por algum motivo difícil de identificar, a Folha pensa que “é interessante notar [que surpresa!] que é crescente, embora ainda pequeno, o número de pesquisadores do Holocausto judeus que se inclina a classificar as ações de Israel em Gaza como genocidas. Um bom exemplo é o de Omer Bartov (Universidade Brown), que escreveu um artigo* para o The New York Times com grande repercussão”.
Recentemente, veio ao Brasil, para participar de uma sessão na Câmara dos Deputados, Yisroel Weiss, um rabino norte-americano, que disse com todas as letras que “Israel” comete genocídio e que esse Estado precisa acabar. Sua voz está longe de ser isolada, e as denúncias não são de agora.
A repressão brutal das “democracias”, como Estados Unidos, Alemanha, França, Reino Unido, dentre muitas, para calar as manifestações contra o genocídio em Gaza, provam que esses governos sabem exatamente o que ocorre contra o povo palestino, e por essa razão tentam calar as pessoas pela força, uma vez que são cúmplices e financiadores do massacre.
O problema que a Folha tenta esconder é que a repressão não tem parado as manifestações, e o repúdio contra o Estado Genocida de “Israel” continua crescendo e colocando esses governos “democráticos” em uma situação perigosa.
Outro fator, tão importante quanto, é a crise que a resistência do povo palestino tem causado nas forças armadas sionistas, que estão se decompondo. Todos os dias soldados são mortos ou feridos gravemente em Gaza pela mão do Eixo da Resistência, que luta bravamente, ainda que em condições muito desiguais.
Há uma verdadeira epidemia de suicídios nas tropas sionistas, e soldados e oficiais estão se rebelando e se recusando a lutar na Faixa de Gaza. Nesta semana, enormes protestos eclodiram em “Israel” pedindo o fim do conflito.
Ninguém deve se deixar enganar pelo editorial da Folha, a preocupação desse veículo do imperialismo não é com os palestinos, mas com os israelenses. A burguesia quer barrar Netaniahu antes que ele coloque tudo a perder.
A carta do ‘antissemitismo’
O sétimo parágrafo do editorial é especialmente importante para se ver como a grande imprensa manipula a realidade. O trecho diz o seguinte: “no que diz respeito ao antissemitismo, cumpre observar que o fenômeno é real. E uma das formas pelas quais ele se materializa é em cobrar de Israel comportamentos que não se exigem de outras nações. Algumas campanhas militares dos Estados Unidos no Vietnã, no Afeganistão e no Iraque produziram altas taxas de civis mortos, mas foram raras as vozes que falaram em um suposto genocídio”.
O fato de o antissemitismo ser um “fenômeno real”, posto no texto, desculpa por antecipação os crimes dos sionistas, uma vez que são motivados e justificados por uma suposta “autodefesa”.
Segundo a lógica da Folha, se uma pessoa não fala em genocídio quando os Estados Unidos mataram 10% da população coreana na Guerra da Coreia; e usa o termo quando os sionistas fazem o mesmo em Gaza, o faz porque é antissemita. E, que diferença faz diante de crimes tão monstruosos?
O truque da Folha consiste em dizer que “é óbvio, por outro lado, que a existência de antissemitismo não pode servir de pretexto para blindar Israel de críticas procedentes, que são muitas”. Mas a semente já foi plantada na mente de seus leitores, que precisam, forçosamente, considerar a questão levantada no sétimo parágrafo.
O uso das palavras
Ainda sem admitir aquilo que a realidade mostra, a Folha diz que “se o genocídio é um delito difícil de provar [embora esteja na cara], crimes de guerra e contra a humanidade, que independem de dolo específico, são consideravelmente mais simples, e Israel os tem cometido em larga escala, com violação generalizada de direitos humanos, destruição de infraestrutura civil, deslocamentos forçados, limitação [na verdade bloqueio] do acesso da população a alimentos e medicamentos essenciais”.
Em seguida, o texto traz que “mesmo considerando que o atual ciclo de violência foi desencadeado pelos ataques terroristas do Hamas, que ainda fez reféns, não se pode aceitar que um Estado em pleno século 21 utilize a fome como arma de guerra” – [grifo nosso].
A Folha, tão cautelosa em falar “genocídio”, não tem nenhum pudor em chamar o Hamas de terrorista. Por acaso o direito internacional, e “acadêmicos”, não dizem que todo povo tem o direito de se utilizar de quaisquer meios para se defender de forças de ocupação? Quem luta contra forças colonialistas é terrorista? Alguém pode ainda ter dúvida de que esse porta-voz do imperialismo está do lado dos genocidas?
A verdadeira preocupação
Como foi dito acima, a Folha/imperialismo está preocupada com os agressores. Diz que os crimes dos israelenses “não apenas viola leis internacionais e preceitos morais básicos como também vai contra os interesses de longo prazo de Israel” –[grifo nosso].
“Israel” é o braço armado do imperialismo no Oriente Médio, é uma máquina de matar e de coersão que vão tentar preservar a todo custo. Por isso a crítica a Netaniahu. no final do editorial, que diz que “o governo israelense deveria buscar parceiros para negociar, mas parece mais empenhado em sabotar definitivamente qualquer chance de entendimento”.
Vitória da Resistência
O imperialismo quer o cessar-fogo em Gaza, e isso é uma derrota que precisa esconder a todo custo. Mas as consequências são inevitáveis, vai acelerar a decomposição do governo sionista e ao mesmo tempo estimular os povos oprimidos da região.
Os acontecimentos mostram o acerto da decisão da Resistência em enfrentar seus agressores com armas nas mãos, essa é a única maneira possível de vencer e de se fazer uma revolução, pois é disso que se trata: uma revolução.




