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México

Vitória ou derrota para López Obrador?

Claudia Sheinbaum, nova presidente do México, pode se tornar uma figura como Lenín Moreno, que traiu Rafael Correa em prol dos interesses do imperialismo

No último domingo (2), Claudia Sheinbaum foi eleita presidente do México. Física e ex-prefeita da Cidade do México, Sheinbaum venceu o pleito com uma votação entre 58% e 60% dos votos válidos. Essa é, entretanto, uma projeção feita pelo Instituto Nacional Eleitoral (INE) quando cerca de 29% das urnas haviam sido apuradas.

No último boletim divulgado pelo INE até o fechamento desta edição, com 74% dos votos apurados, Sheinbaum aparecia com mais de 58,4% dos votos válidos, contra 28,5% da opositora.

“A diferença para a Presidência da República é de mais de 30 pontos e, mesmo considerando a menor projeção, conquistamos a maioria qualificada na Câmara dos Deputados e muito provavelmente no Senado”, afirmou a presidente recém-eleita logo após o anúncio do INE.

Como Sheinbaum disse, sua votação foi tão grande que ficou entre 30 a 34 pontos percentuais acima da segunda colocada, Xóchitl Gálvez. Esta, inclusive, reconheceu sua derrota pouco tempo depois, afirmando: “reconheci o resultado porque amo o México e sei que, se o seu governo se sair bem, nosso país se sairá bem”.

Claudia Sheinbaum é do Movimento de Regeneração Nacional (Morena), o mesmo partido do atual presidente do México, López Obrador. O atual chefe do Executivo mexicano também parabenizou Sheinbaum:

“Com todo meu carinho parabenizo Claudia Sheinbaum, que venceu esta corrida por uma larga margem, vai ser [não somente] a primeira mulher presidente do México em 200 anos […], mas também a presidente possivelmente com o maior número de votos obtidos em toda a História do nosso país”, disse Obrador, encerrando seu mandato iniciado em 2018 – no México, o presidente eleito passa seis anos no poder.

Os dados divulgados pelo INE também indicam que o Morena deve ficar com o governo de sete dos nove estados disputados nas eleições do último domingo. As projeções também indicam que o partido de Obrador e Sheinbaum pode alcançar 80 cadeiras no Senado e mais de 350 na Câmera, incluindo os parlamentares da coligação.

Rui Costa Pimenta, presidente nacional do Partido da Causa Operária (PCO), afirmou que as eleições mexicanas dão “a impressão de que temos um esquema Lenín Moreno” no México. Presidente do Equador entre 2017 e 2021, Moreno foi eleito como um aliado de seu antecessor, Rafael Correa. Entretanto, ao tomar posse, mostrou que era um agente a serviço do imperialismo, chegando a prender Rafael Correa.

Entretanto, Pimenta, que comentou sobre o caso na última edição do programa Análise Internacional, explica que é uma situação diferente no sentido de que é menos radical. “Lenin Moreno teve que dar uma espécie de golpe de Estado, não foi simplesmente mudar de política, foi colocar o partido na ilegalidade, prender o Rafael Correa, prender o vice dele…”, argumenta.

“Não vejo que vá acontecer esse tipo de coisa. Mas, me parece que esse talvez seja o melhor caso da esquerda que o imperialismo vai aplaudir, algo que fracassou no caso do Boric, no Chile”, disse Pimenta.

O histórico de Sheinbaum na política mostra justamente uma figura contraditória. Entre 2000–2006, foi secretária de Meio Ambiente do Estado da Cidade do México; entre 2015–2017, delegada de Tlalpan (um município da Cidade do México); e entre 2018–2023, foi governadora da Cidade do México.

Ao longo de sua carreira, Sheinbaum investiu boa parte de seu tempo atuando “em prol do meio ambiente”, defendendo uma política de tipo “sustentável”. Em Talalpan, por exemplo, promoveu a “segurança e o desenvolvimento urbano sustentável”. Depois, enquanto governadora da capital mexicana, também focou em “mobilidade urbana, sustentabilidade, segurança pública e igualdade de gênero”.

A política “ambientalista” é, como muitos exemplos já mostraram, uma política promovida pelo imperialismo para fazer avançar os seus interesses à revelia do desenvolvimento nacional. A vida de Sheinbaum, inclusive, é uma demonstração disso:

A nova presidente do México fez parte do Grupo Intergovernamental de Especialistas em Mudanças Climáticas, grupo este que ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 2007, uma demonstração de que o imperialismo aprova e incentiva sua política. Ela também aconselhou a preparação do Plano de Ação Climática de Honduras, sob a direção do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), foi consultora da ONU para Energia e Desenvolvimento Sustentável e coordenou a primeira Estratégia Local de Ação Climática da Cidade do México.

Em relação à segurança pública, algo que foi foco de Sheinbaum quando ocupou outros cargos, como mencionado acima, ela possui uma política também direitista. Defende, por exemplo, a militarização da segurança pública e o fortalecimento da Guarda Nacional, criada por López Obrador para “combater o narcotráfico”.

Em relação à Palestina, Sheinbaum possui uma política similar à política adotada oficialmente pelo México. Em um vídeo divulgado pelo jornal mexicano Milenio, a presidente recém-eleita se limita a condenar a violência de maneira genérica, não denunciando as atrocidades que estão sendo cometidas por “Israel” na Faixa de Gaza:

“Ao mesmo tempo, estou de acordo que cesse a violência, que se reconheçam os dois Estados e que se busque uma maneira de pacificar esta região do mundo”, afirma no vídeo.

Já no que diz respeito à economia, Sheinbaum já destacou que pretende manter a política de López Obrador, a chamada “austeridade republicana”. Similar ao que conhecemos, no Brasil, como “austeridade fiscal”, essa política tem como objetivos declarados reduzir os gastos públicos, combater a corrupção e enxugar a máquina pública. Ao mesmo tempo, a presidente mexicana também defende o aumento dos gastos sociais e dos investimentos públicos para combater a pobreza.

Contribuindo para o caráter contraditório de seu governo, a imprensa imperialista mais comemorou do que reprovou sua eleição, mas com ressalvas. O jornal britânico The Economist, um dos principais representantes do imperialismo, afirmou que “não está nada claro se ela tem a vontade ou a capacidade de se libertar das políticas ou da influência pessoal do seu antecessor populista, Andrés Manuel López Obrador”.

“A luta que se aproxima influenciará o destino dos 126 milhões de habitantes do México, mas também terá enormes implicações para a migração, o crime e o comércio nos Estados Unidos, o seu gigante vizinho do norte”, afirma a publicação no artigo Claudia Sheinbaum has won Mexicos’s presidency in a landslide (Claudia Sheinbaum ganhou a presidência do México de lavada).

A The Economist também destaca o que considera ser qualidades em seu histórico político:

“A primeira mulher, e judia, presidente do país difere fortemente do seu antecessor em alguns aspectos, apesar de pertencerem ao mesmo partido, o Morena. Cientista climática com doutorado em engenharia ambiental, ela adotou uma abordagem tecnocrática do crime quando foi prefeita da Cidade do México e trabalhou com o setor privado. López Obrador, pelo contrário, governou por capricho e bombástica, repreendendo os empresários e cedendo a interesses instalados. O resultado foi ruim para o México.”

Em outro artigo, intitulado Mexico’s next president can reset relations with the United States (Próximo presidente do México pode redefinir relações com os Estados Unidos), o jornal critica, mais uma vez, o governo de Obrador, chamando-o de “um estadista, determinado a destruir as obras de seus antecessores”. Além disso, destaca a importância que o próximo presidente mexicano terá para a relação entre o país latino-americano e os Estados Unidos. Essa preocupação, ao lado da diferença do tratamento que Obrador recebe da imprensa imperialista quando comparado ao que Sheinbaum recebe, indica que o imperialismo está otimista.

“Os mexicanos decidirão quem herdará esta bagunça quando elegerem um novo presidente em 2 de junho. É provável que escolham a protegida de López Obrador, Claudia Sheinbaum, que pertence ao Morena, o partido no poder. Sua rival, Xóchitl Gálvez, que representa uma coalizão de partidos mais antigos, está cerca de 20 pontos atrás. A forma como o vencedor governará será importante não apenas para os mexicanos que sofrem com a violência e a desigualdade, mas também para o resto do mundo. O México tornou-se um ator crucial na mudança da ordem global. O número de migrantes que viajam através do México para os Estados Unidos aumentou e a migração ilegal pode ser atualmente a maior questão política no país mais poderoso do mundo. O Ocidente espera que o México o ajude a dissociar-se da China, especialmente para a fabricação de componentes eletrônicos importantes e de tecnologias verdes. O próximo presidente do México terá grande influência em ambos os aspectos” [grifo nosso].

O Financial Times, outro importante jornal imperialista, também fala sobre Sheinbaum de uma maneira mais precavida, destacando a preocupação que a proximidade da presidenta eleita com López Obrador gera. Algo que indica que o imperialismo tentará pressioná-la para que rompa completamente com a política de seu antecessor.

“Protegida de López Obrador e antiga presidente da Câmara da Cidade do México, ela [Claudia Sheinbaum] continuaria a expandir os programas de assistência social, aumentaria  ainda mais o salário mínimo e manteria o papel mais importante do Estado na economia. A formação de Sheinbaum como cientista climática levou alguns a prever que ela ofereceria uma combinação atraente de continuidade, além de uma pitada de modernização tecnocrática. 

No entanto, Sheinbaum está empenhada na política do seu mentor de controle das forças armadas sobre o policiamento federal e partes essenciais da economia, como aeroportos, portos, alfândegas e uma companhia aérea. Ela está entusiasmada com a sua proposta de que os eleitores elejam diretamente os juízes do Supremo Tribunal, outros juízes seniores e membros do conselho da autoridade eleitoral independente, dizendo que isso aumentaria a democracia.

Isto alarma especialistas independentes, que acreditam que a proposta colocaria instituições importantes sob controlo político e ameaçaria o futuro da jovem democracia do México, que surgiu apenas em 2000, após 71 anos de governo de partido único.”

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