No último sábado (6), este Diário deu início a uma série de artigos em que passou a expor a real natureza do Projeto de Lei nº 2.630/2020, conhecido popularmente como PL das “Fake News”, a fim de desmascará-lo como algo profundamente antidemocrático, que faz parte da ofensiva das burguesias imperialista e brasileira contra o direito à liberdade de expressão do nosso povo.
Aquela primeira matéria expôs que a burguesia, através do PL das “Fake News”, tenta instituir a censura nas redes sociais, fazendo com que as plataformas tomem diversas medidas, dentre elas obrigarem os usuários a respeitar o “Estado Democrático de Direito” e a “dignidade da pessoa humana”. Da mesma forma, determina o respeito à Lei nº 14.197/2021, que nada mais que uma versão aprimorada da Lei de Segurança Nacional, tendo sido aprovada durante o mandato de Jair Bolsonaro. Em suma, já de início, ficou claro que o PL nº 2.630/2020 é uma proposta que estabelece uma série de crimes políticos, pavimentando o caminho para tornar ilegal e censurar o jornalismo político a internet.
Não bastando, no capítulo II do projeto de lei, que abrange os artigos 8º a 10, normas são criadas para dar mais poder às chamadas big techs (Google, Meta dentre outras), para que exerçam uma profunda vigilância e controle sobre os usuários, controle este que estaria submetido ao Estado brasileiro, o qual, por sua vez, está subjugado ao imperialismo.
Tudo isto para fazer aumentar a censura nas redes sociais.
Pois bem, do que trata o capítulo II? Da Responsabilização dos Provedores (isto é, das empresas por trás das redes e aplicativos de mensagens e busca).
O capítulo inicia-se pela Seção I – Da responsabilização civil
O que é responsabilização civil? Significa indenização em dinheiro, seja danos materiais e morais, seja multa. Algo que é feito através de ações judiciais. Vejamos o que diz o artigo 6º:
Art. 6º Os provedores podem ser responsabilizados civilmente, de forma solidária:
Já de início, um problema extremamente grave! As redes serão responsabilizadas de forma solidária. Mas o que isto quer dizer? Isto significa que se o usuário violar a lei, a rede também violou. Vamos deixar o exemplo mais concreto: suponhamos que um usuário é acusado de publicar algo que viole o “Estado Democrático de Direito” ou a “dignidade da pessoa humana”. Se um juiz considerar o usuário culpado disto, e condená-lo a pagar alguma multa ou indenização, e esse usuário não tiver condições de pagar (ou não for encontrado), a empresa que cuida da rede social (ou do aplicativo de mensagem ou de busca) é que terá que pagar. Pois é responsável solidária. Isto forçará a empresa a censurar o usuário previamente. Inclusive em casos em que não caberia a censura determinada pelo PL das “Fake News”.
Censuraria simplesmente para não correr o risco de uma chuva de multas e indenizações.
Prossigamos para os incisos:
Art. 6º Os provedores podem ser responsabilizados civilmente, de forma solidária:
[…]
II – por danos decorrentes de conteúdos gerados por terceiros quando houver descumprimento das obrigações de dever de cuidado, na duração do protocolo de segurança de que trata a Seção IV.
O inciso II confirma expressamente o que foi feita acima. “Os provedores […] responsabilizados […] por danos […] gerados por terceiros”. Traduzindo do juridiquês para o português, as empresas que são donas das redes podem ser multadas devido a conteúdos que os usuários postaram. O que irá forçá-las à censura. Se, atualmente, tais empresas já exercem cada vez mais uma censura e vigilância sobre seus usuários, com o Projeto de Lei nº 2.630/2020 qualquer publicação que realmente critique possa prejudicar o “sistema”, isto é, os interesses da burguesia brasileira e do imperialismo será censurada.
No final do art. 6º falou-se de um “protocolo de segurança de que trata a seção IV”. Referida seção abrande os artigos 12 a 15. E o que eles dizem? Basicamente, são normas que permitem um estado de censura e vigilância, de forma generalizada e relâmpago, casa haja “a iminência de riscos descritos no art. 7º, ou a negligência ou insuficiência da ação do provedor”. E esse estado de censura e vigilância teria a duração de até 30 (trinta) dias, sem excluir outras medidas ditatoriais:
“Seção IV – Das obrigações quando houver risco iminente de danos
Art. 12. Quando configurada a iminência de riscos descritos no art. 7º, ou a negligência ou insuficiência da ação do provedor, poderá ser instaurado, na forma da regulamentação e por decisão fundamentada, protocolo de segurança pelo prazo de até 30 (trinta) dias, sem prejuízo de outras medidas legais cabíveis, procedimento de natureza administrativa cujas etapas e objetivos deverão ser objeto de regulamentação.”
Bom, temos que ir por partes. Diz-se que o protocolo de segurança, ou seja, o estado relâmpago de censura e vigilância, terá como requisitos: “riscos descritos no art. 7º, ou a negligência ou insuficiência da ação do provedor”.
Primeiramente, os riscos do art. 7º (que estão listados em seu parágrafo segundo):
“Art. 7º […]
2º A avaliação abrangerá especificamente em cada um dos serviços dos provedores e considerará os riscos sistêmicos, tendo em conta a sua gravidade e probabilidade de ocorrência, e incluirá, no mínimo, a análise dos seguintes riscos:
I – a difusão de conteúdos ilícitos no âmbito dos serviços de acordo com o caput do art. 11;
II – à garantia e promoção do direito à liberdade de expressão, de informação e de imprensa e ao pluralismo dos meios de comunicação social;
III – relativos à violência contra a mulher, ao racismo, à proteção da saúde pública, a crianças e adolescentes, idosos, e aqueles com consequências negativas graves para o bem-estar físico e mental da pessoa;
IV – ao Estado democrático de direito e à higidez do processo eleitoral; e
V – os efeitos de discriminação ilegal ou abusiva em decorrência do uso de dados pessoais sensíveis ou de impactos desproporcionais em razão de características pessoais.”
Destaque deve ser dado para os incisos III e IV. O inciso III é uma demonstração do identitarismo servindo ao imperialismo para censurar o povo brasileiro. A natureza genérica do dispositivo permitirá calar qualquer crítica que seja feita a política que o imperialismo utiliza para cooptar as mulheres e negros, para impedir que se formem reais movimentos de luta pela libertação de referidos grupos oprimidos.
Além disto, o inciso III aproveita para os casos de violência ocorrido contra crianças e adolescentes no ano de 2023 para, eventualmente, cercear qualquer opinião sobre o assunto, sob a justificativa de que uma opinião divergente da estabelecida pela imprensa burguesa seria um incentivo à violência. O mesmo vale para os idosos.
E o que dizer de “consequências negativas graves para o bem-estar físico e mental da pessoa”? Ora, publicações que gerem consequências negativas para o bem-estar mental da pessoa não poderão ser publicadas, então absolutamente nada poderá ser publicado nada internet. Tudo poderá ser censurado. Afinal, é possível afirmar com certeza que toda publicação gera algum efeito negativo sobre a saúde mental de alguma pessoa, em algum lugar do mundo.
Este é o inciso III.
Agora analisemos o IV, já citado acima.
Como se vê acima, o PL das “Fake News” considera um risco falar sobre o “Estado Democrático de Direito” e a “higidez do processo eleitoral”.
Colocando em outras palavras, se, nas redes sociais, alguma organização política ou indivíduo isolado resolver criticar o “Estado Democrático de Direito” (por exemplo, criticando o Supremo Tribunal Federal e o Poder Judiciário de conjunto) ou então a “rigidez do processo eleitoral (por exemplo, questionando se as eleições ocorreram de formas legítimas, sem fraude, se é necessário que as urnas imprimam o voto, etc.), será alvo de censura.
E, como o PL das “Fake News” tem que observar a Lei nº 14.197/2021, ele poderá muito bem ser processado por um dos crimes previstos nela, quais sejam: “Abolição Violenta do Estado Democrático de Direito”, “Golpe de Estado”, “Interrupção do Processo Eleitoral”, ou “Violência Política”.
Pois é. Caso estes “riscos” estejam presentes, será instaurado o “protocolo de segurança”.
Falemos, agora, sobre “a negligência ou insuficiência da ação do provedor”. Relembrando, o protocolo de segurança, isto é, o estado relâmpago de censura e vigilância será instaurado também nesses casos. Novamente, através do PL das “Fake News”, o Estado burguês brasileiro, e o imperialismo, irão forçar as redes a censurarem previamente seus usuários. Será criada uma ditadura total na internet.
Alguém poderia falar sobre o inciso II, dizendo que a liberdade de expressão estaria protegida. Mas isto é falso. Quando um juiz for decidir, em processo real, ele dirá que a liberdade de expressão tem limites. Como vem ocorrendo.
Para finalizar, eis o art. 9º:
“Art. 9º Os provedores deverão conceder, na forma da regulamentação e em prazo razoável, mediante requerimento e sempre que solicitado, acesso aos dados que contribuam para a detecção, identificação e compreensão dos riscos sistêmicos gerados pelos provedores […]”
Não bastasse toda a situação ditatorial já exposta, que será instituída com a aprovação do PL das “Fake New”, através do qual os monopólios serão forçados a censurarem os usuários mais do que já censuram, o artigo acima determina expressamente que deverão fornecer os dados dos usuários sempre que solicitado. Fornecer para quem? Ora, para o Supremo Tribunal Federal, juízes, para a polícia, o exército, a ABIN. Para todo o aparato de repressão.
Em suma, trata-se do aprofundamento de uma ditadura se instaurando do Brasil. E a aprovação do PL das “Fake News” será um ponto de virada nessa situação.