O portal Esquerda Diário, do Movimento Revolucionário de Trabalhadores (MRT), publicou no último dia 19 uma matéria informando os bombardeios israelenses contra o Irã, ocorridos na noite do último dia 18 (“Israel ataca alvos no Irã, Síria e Iraque”), destacando que “o Exército israelense bombardeou vários alvos no Irã, Síria e Iraque”, acrescentando que “por sua vez, a agência de notícias iraniana Fars informou que foram ouvidas explosões em um aeroporto na cidade de Isfahan, embora as causas fossem desconhecidas “. É, no entanto, o que a matéria não diz, o que mais chama atenção, uma vez que o artigo dá a impressão de que “Israel” retaliou o país, quando o Estado sionista não fez mais do que um jogo de cena para enganar incautos, o que é em si uma ótima propaganda para os sionistas.
Na imprensa israelense, “limitado” (“limited”, em inglês), “moderado” (“mild”) e “fraco” (“lame”, no mesmo idioma), por exemplo, foram as palavras mais lidas no sionista The Israel Times. A principal matéria na capa do sítio do órgão sionista, Iranian air base reportedly attacked in ‘limited’ Israeli reprisal strike, até informa que “explosões foram ouvidas perto da cidade iraniana de Isfahan no início da sexta-feira, quando Israel supostamente lançou um ataque de represália muito aguardado por um ataque iraniano a Israel dias antes, desafiando a pressão internacional para que se retirasse”, mas acrescenta depois: “a TV estatal iraniana disse que, pouco depois da meia-noite, ‘três drones foram observados no céu sobre Isfahan. O sistema de defesa aérea entrou em ação e destruiu esses drones no céu’.”
Nada em relação a essa afirmação foi desmentido, indicando que o todo-poderoso exército israelense respondeu um ataque com cerca de 300 artefatos, entre drones, mísseis balísticos e mísseis de cruzeiro com “três drones” abatidos pela defesa iraniana. The Times of Israel continua repercutindo a ofensiva de brincadeira de “Israel” informando que “o ministro da Segurança Nacional, Itamar Ben Gvir, foi alvo de severas críticas e acusações de prejudicar a estratégia de Israel contra o Irã, após sugerir que Jerusalém [considerada pela extrema-direita sionista a capital de “Israel”] estava por trás das explosões que abalaram uma base iraniana na sexta-feira.” (“‘Lame!’: Ben Gvir slammed for hinting Israel behind overnight strike in Iran”, 19/4/20024).
Por fim, a entusiasmada matéria de análise With mild reported strike, Israel aims to bolster coalition to tackle Iran nuke threat (David Horovitz, 19/4/2024), após muitas considerações, o leitor é brindado com uma pérola do malabarismo: “após dias de prolongadas discussões no gabinete de guerra, visitas de líderes estrangeiros pedindo cautela e inúmeras consultas aos Estados Unidos, parece que a resposta israelense relatada foi muito mais simbólica [grifo nosso] do que prejudicial”. “Muito mais simbólica” é uma forma marota de dizer que a resposta israelense esteve mais próxima do famoso meme “acabou Jéssica?”, do que uma retaliação que um país com alguma força militar faria.
Mesmo o analista/torcedor, no entanto, não se atreve a publicar uma matéria tão propagandista de “Israel” quanto a Esquerda Diário, que ao escamotear o fundamental, que a “resposta” israelense foi digna de risos, atuou como um propagandista do “tigre de papel” sionista. Uma matéria verdadeiramente honesta colocaria em questão a discrepância entre 300 artefatos amplamente documentados (caso do Irã) e três, dos quais nada se sabe, exceto o que diz a máquina de propaganda sionista e um aliado brasileiro, encontrado não nas fileiras do bolsonarismo, mas na imprensa do MRT.
O órgão iraniano em inglês Tehran Times, por sua vez, reproduziu informe da Guarda Revolucionária Islâmica, chamando de “grande mentira” e “guerra psicológia” as alegações sionistas. “O Corpo de Guardas da Revolução Islâmica descartou na quinta-feira como uma ‘grande mentira’ que a construção da instalação nuclear israelense de Dimona tenha sofrido danos na legítima defesa do Irã contra Israel em 13 de abril, chamando-a de ‘guerra psicológica’ destinada a enganar a opinião pública.” (“Iran says claims of damage to Dimona nuclear facility is a psychological warfare”, 19/4/2024). Se a Guarda Revolucionária chamou de “guerra psicológica” o “ataque” sionista, outros aprofundaram-se na ironia, como o porta-voz do Centro Nacional do Ciberespaço do Irã, Hossein Dalirian, que em seu perfil oficial no X, declarou: “a imprensa norte-americana sonhou que Israel atacou o Irã”.
Finalmente, o canal no Telegram do Corpo Cibernético dos Guardiães Guarda Revolucionária informou, também no dia 19, a repercussão da “retaliação” israelense contra o país, expressa no canal de TV isralense Keshet 12, que relatou: “Os países árabes estão desanimados com a resposta de Israel ao Irã, e a ideia de formar uma aliança sunita-israelense contra o Irã acabou para sempre. Esses países buscarão melhorar suas relações com o Irã após o fracasso de seu objetivo em Tel Aviv.”
O primeiro-ministro de “Israel”, Benjamin Netaniahu, havia advertido na quarta-feira (17) que seu país responderia ao ataque iraniano do sábado, mas que o gabinete de guerra israelense ainda estava debatendo ‘quando e como’ fazê-lo.
Há um princípio do jornalismo e da justiça, que implica em ouvir os lados distintos de um dado conflito antes de tirar uma posição. É perceptível, pelo teor da matéria do Esquerda Diário, que em nenhum momento as posições de ninguém além do imperialismo, foram consultadas, um indicativo de como o MRT se orienta para a luta política.
Obviamente, a organização brasileira poderia argumentar que o Irã, sendo parte no conflito, teria um determinado comportamento, ainda que ironizar e ridicularizar seja um tanto extremo. Posto em perspectiva com a reação da imprensa sionista, no entanto, não poderia haver dúvidas de que o suposto ataque feito por “Israel”, como disse o porta-voz Dalirian, só ocorreu nos sonhos de quem defende o Estado sionista. E do Esquerda Diário, que publicou então uma matéria mais pró-“Israel” até do que a extrema direita sionista.