Neste ano, todas as universidades federais do País têm a chamada Comissão de “Heteroidentificação”, conforme um relatório do MEC divulgado na imprensa burguesa. Os estudantes e ingressantes negros de todas as 69 universidades federais terão sua condição enquanto negro julgada por terceiros a partir de critérios esdrúxulos e totalmente arbitrários.
As Comissões de “Heteroidentificação” foram criadas para, em teoria, impedir a fraude de estudantes brancos que estariam burlando o sistema de cotas para entrar na universidade. Entretanto, o que assistimos no cenário político-educacional brasileiro a partir da criação destas comissões foram expulsões e cancelamento de matrículas de alunos negros nas universidades, com destaque para o caso recente dos alunos de direito e medicina da USP – cursos tipicamente burgueses – que tiveram suas matrículas negadas pela universidade, pois não foram considerados negros o suficiente pela comissão.
Apesar das “boas intenções”, a esquerda identitária está destruindo o sistema de cotas. Gritando aos sete ventos contra a injustiça, os identitários estão fazendo o trabalho sujo da direita. O critério utilizado em toda a sociedade brasileira e considerado justo por todo sujeito democrático é o método do IBGE: a autodeclaração. Por que então este critério é inválido nas instituições federais de ensino superior?
Este critério não é mais válido, pois não se trata de ampliar o acesso a um ensino superior gratuito para a população oprimida. Trata-se de restringir o acesso dos trabalhadores à universidade. Em 2020 a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) desclassificou mais de 50% dos aprovados na universidade através do regime de cotas. Será mesmo que nenhum destes alunos são pretos ou pardos? Será mesmo que mais de mil estudantes tentaram fraudar sistema de cotas? Ou será que a comissão impediu deliberadamente a entrada de estudantes negros na universidade? O tribunal racial montado na UFPE, assim como nas outras 68 universidades federais, utilizou-se do caráter altamente miscigenado da sociedade brasileira para impedir que a classe trabalhadora, sendo esta maioria preta e parda, ingresse na universidade.
Em um país onde a maioria da população é negra e que passou por um processo de miscigenação tão intenso quanto o Brasil, é ilógico utilizar de um critério fenotípico para definir se alguém é ou não negro. Na declaração do DCE da USP, por exemplo, não há nenhum indício de quais seriam estes tais critérios, sendo todos subjetivos, obscuros e – em última instância – autoritários.
Quando uma pessoa se autodeclara negra é porque ela se reconhece e se entende parte deste grupo oprimido. Indo muito além do que uma banca formada por professores, servidores e alunos “selecionados” entende a partir de um olhar. O fenótipo é apenas um aspecto dos negros, tendo os aspectos socioeconômicos como intrínsecos a sua situação de exploração.
A realidade é que a burguesia utiliza o desmonte do ensino público, a restrição do seu acesso e a privatização do sistema de ensino como forma da reprodução do capital. Mantendo os jovens da classe trabalhadora longe da educação de qualidade, este assim permanece e continua um operário submetido à mais brutal exploração. Impedir o negro de entrar ou permanecer na universidade é a forma de manter o operário e seus filhos como explorados para a burguesia.
Apesar das cotas atenuarem a desigualdade social nas universidades, elas não são a solução. Agora com estas comissões de “heteroidentificação” seu papel está sendo cada vez mais reduzido. A única maneira de se lutar pelo acesso à universidade é lutar não por mais cotas, mas pelo fim do vestibular. É preciso que o movimento estudantil lute pela ampliação de vagas, pela ampliação das instituições, pelo livre acesso à universidade por todo a população!