No artigo STF rejeita poder moderador dos militares, publicado pelo Brasil 247, Altamiro Borges comemora o fato de que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, em sessão recente, que a Constituição Federal não prevê a possibilidade de uma intervenção das Forças Armadas no regime político. Borges chamou a decisão de “um importante avanço democrático” e afirmou que se tratou de “uma derrota do nefasto ‘partido militar’, tão acostumado a golpes contra a democracia”.
A sessão em questão tratava da interpretação do artigo 142 da Constituição Federal, que diz:
“As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.”
Trata-se de um artigo que jamais poderia existir, que foi contrabandeado para a Constituição Federal. Afinal, ele estabelece que as Forças Armadas poderiam intervir no regime – coisa que nem a Constituição anterior ao golpe de 1964 previa. No entanto, como é um artigo que entra em contradição com outros princípios constitucionais – afinal, a depender da interpretação, um poder poderia utilizar as Forças Armadas para suprimir o outro –, ele passou a ser discutido no STF, a fim de resolver as ambiguidades.
O julgamento do STF, no entanto, nada tem de “avanço democrático”. Foi, acima de tudo, mais uma obra da politicagem da Corte, que tomou a decisão em meio aos 60 anos do golpe militar. Foi uma forma de, diante da data sombria, o Tribunal se declarar inimigo da ditadura, ainda que tenha permanecido integralmente preservado pelos militares.
Mas não é apenas esse o problema. Dizer que uma intervenção das Forças Armadas é ilegal é o tipo de decisão judicial que não tem validade nenhuma. Afinal, se os militares intervierem e tomarem o poder, quem os irá prender pela intervenção? É uma decisão ridícula e que só serve, no final das contas, para apresentar o STF como “democrático”. A decisão, contudo, não irá frear nenhum militar de dar um golpe de Estado.
A natureza do golpe militar é justamente o uso da força. É determinado pelo monopólio das armas por parte da Marinha, do Exército e da Aeronáutica. Armas que, por sua vez, são capazes de atropelar qualquer caneta de um ministro do STF.
Mas há algo na decisão que não é meramente simbólico. Que é, inclusive, justamente o que fez com que o artigo fosse criado: a possibilidade de convocar as Forças Armadas para intervir no regime, sem, necessariamente, atuar contra um poder institucional. É o caso, por exemplo, das Operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLOs), que vêm sendo utilizadas e que visam acostumar a população com a presença dos militares nas ruas. Sobre isso, o relator Luiz Fux foi bem claro em sua posição:
“O emprego das Forças Armadas para a ‘garantia da lei e da ordem’ presta-se ao excepcional enfrentamento de grave e concreta violação à segurança pública interna, em caráter subsidiário, após o esgotamento dos mecanismos ordinários e preferenciais de preservação da ordem pública.”
Isto é, a favor da existência das GLOs, que é aquilo para que serve o artigo 142 – como vimos, para um golpe militar, ele é absolutamente desnecessário. Longe de ser uma “derrota para o partido militar”, a decisão do STF apenas consolidou um dos principais instrumentos dos militares hoje para avançar no regime político.